O debate promovido pela Rede Vitória, na noite de quinta-feira (20/10), entre os dois candidatos ao governo do Espírito Santo mostrou que alguns temas são tratados com desdém pelo candidato do PL, o ex-deputado federal Carlos Manato. Instigado pelo governador Renato Casagrande (PSB), candidato à reeleição, sobre violência contra às mulheres, Manato admitiu ter cometido o crime de omissão em relação a um de seus coordenadores de campanha, o ex-policial militar Walter Matias Lopes, que já foi condenado nas iras da Lei Maria da Penha e responde ainda a outras ações penais pela acusação de agredir uma de suas ex-esposas, Izabella Renata Andrade Costa.
De acordo com artigo do advogado Victor Emídio, publicado no Portal JusBrasil – ele tem atuação especializada em processos Criminais e de Execução Penal e é professor, escritor e criador de conteúdo jurídico –, é cabível a responsabilização criminal das pessoas que se omitem em relação à violência doméstica e familiar. Izabella também atuiou no gabinete do então deputado federal Carlos Manato. No entanto, em entrevista ao Tribuna Online nesta semana, ela denunciou ter sido “funcionária fantasma” e que nunca recebeu salário, que ia para a conta de seu ex-marido Walter Mathias.
Conforme o Blog do Elimar Côrtes informou em primeira mão, Walter Matias foi condenado no processo 0000369-54.2022.8.08.0024 a um ano, seis meses e cinco dias de detenção com base na Lei Maria da Penha. A sentença condenatória em desfavor de Matias, que trabalhou também assessor parlamentar do deputado estadual reeleito Capitão Assumção (PL), foi proferida no dia 28 de março de 2022, pela juíza Brunella Faustini Baglioli, da 1ª Vara Especializada em Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher de Vitória.
Na mesma decisão, a magistrada concedeu ao réu a liberdade provisória. Matias estava preso desde janeiro deste ano, depois de agredir o namorado de sua ex-esposa Izabella, com uma garrafada na cabeça, na Ilha de Santa Maria, em Vitória. Walter Matias foi condenado pela acusação de praticar os seguintes delitos: crime de descumprimento de medidas protetivas, lesões e ameaças.
Em outra ação penal, a de número 0001120-41.2022.8.08.0024, Matias e Izabella tiveram audiência na 1ª Vara Especializada em Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher no dia 10 deste mês de outubro. Matias foi interrogado como réu, neste processo que ainda não foi julgado. Já no procedimento nº 0014276-33.2021.8.08.0024, que trata de Medidas Protetivas de Urgência (Lei Maria da Penha), a juíza Brunella Faustini Baglioli deu a seguinte decisão:
“Acolho a promoção ministerial de fl.223 e verso. Determino ao Requerido (Walter Matias) o comparecimento OBRIGATÓRIO a todos os encontros promovidos pelo PROJETO HOMEM QUE É HOMEM, realizado pela Polícia Civil no Auditório da Chefatura da Polícia Civil, situado à Av. Nossa Senhora da Penha, n° 2290, Santa Luíza, Vitória/ES, a iniciar-se no DIA 13.10.2022, às 16:00 horas, ficando desde já cientificado de que a lista de presença será encaminhada à Promotoria Criminal desta Vara Especializada, para as providências pertinentes.”
O assunto da agressão praticada por Matias voltou à tona na pergunta que o governador Renato Casagrande fez a Manato no debate da Rede Vitória: “Quais são as suas propostas para essa área (violência doméstica)?” Manato respondeu: “Aumentar as Delegacias das Mulheres, criar mais botões do pânico, criar políticas públicas para mulheres, fazer trabalho de conscientização. (…) Vamos conseguir proteger essas mulheres. Temos carinho muito grande por elas. Vamos fazer uma política muito mais interessante e diminuir o feminicídio”.
O governador completou e provocou a confissão de Manato: “Nós já fazemos boa parte disso hoje. É importante neste momento continuar conhecendo quem está disputando a eleição. Você teve a capacidade, na greve da polícia (Militar), de usar mulheres e crianças para ficarem em frente aos batalhões de polícia. O seu assessor, que hoje ainda anda com você, Walter Matias, é um agressor de mulheres. Você conviveu com a senhora Izabella, ex-esposa do Walter, e já a viu machucada e nunca tomou providências. Como deputado federal você viu a Izabella machucada e não tomou providência. Seria o mínimo levá-la à Delegacia de Mulheres”.
Em seguida, a resposta de Carlos Manato demonstra que ele, quando ainda era deputado federal, se omitiu diante das agressões sofridas por Izabella: “Walter Matias bateu na mulher e foi preso. Foi condenado, ficou vários dias preso, teve que cumprir pena. Eu não tenho nada com isso. A relação dele com a mulher dele é problema dele, não é meu. Com quem ele trabalha, não é problema meu. É totalmente falácia, falando manso. Tem que esclarecer as coisas. O índice de feminicídio do Estado é um dos maiores. Isso é incompetência”.
Em uma postagem feita em seu Instagram, na manhã desta sexta-feira (21/10), Renato Casagrande comentou sobre o fato de Manato ter se omitido diante um crime grave: “Lamentável. Um homem que vê uma mulher agredida e não faz nada??? Mais grave ainda: um homem que é parlamentar, teoricamente, aquele que zela pela lei, lava as mãos e escolhe a omissão. Como pode propor políticas públicas que protejam as mulheres se, quando pôde proteger uma mulher, escolheu a negligência? Mais ainda: escolheu trabalhar com Walter Matias, até hoje, que viola direitos fundamentais das mulheres. E ainda diz que não tem nada a ver com isso! Este, definitivamente, não é o Estado que as mulheres capixabas merecem. O problema da violência contra as mulheres é de TODOS NÓS. O Espírito Santo que queremos é o que ampara, acolhe e está do lado da mulher que sofre, e NÃO o que fica do lado do agressor, que debocha, minimiza o sofrimento”, pontuou o governador.
O advogado Victor Emídio encerra seu artigo, intitulado ‘E se eu não meter a colher em briga de marido e mulher? Cometo crime?’, no JusBrasil, com a seguinte conclusão: “A título de conclusão, ressalvadas eventuais peculiaridades de cada caso concreto, é perfeitamente possível a responsabilização pela omissão daquele que “não mete a sua colher em briga de marido e mulher”, ou mesmo se omite diante das demais hipóteses de violência doméstica e familiar que a Lei nº 11.340/2006 traz em seu bojo.”
“A título de exemplo, convém citar os recorrentes casos de violência doméstica e familiar que ocorrem no âmbito de condomínios, conjuntos residenciais, ou mesmo na rua, em que inúmeras pessoas preferem filmar a cena ao invés de prestar a devida assistência à figura da vítima. Nesses casos, se inexistente o dever jurídico de agir, é perfeitamente possível a responsabilização penal a título de omissão de socorro (art. 135 do CP).”
Curiosamente, o candidato Carlos Manato, quando participa de entrevistas nas TVs, encerra sua fala abordando a importância das mulheres se precaverem contra o câncer de mama, como sem efetivamente, ele se preocupa muito com as mulheres: “Quero falar de Outubro Rosa. Vamos fazer o autoexame da mama, é prevenção. Procure seu médico, o ginecologista, um mastologista. Faz mamografia. Eu mesmo vou implementar dezenas de mamografias. O exame bem feito dá um diagnóstico precoce. Eu peço a vocês, vamos divulgar o Outubro Rosa…”