Depois de ameaças e ataques do bilionário Elon Musk, dono da rede social X (antigo Twitter), o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que a conduta do empresário seja investigada em novo inquérito. Também incluiu Musk entre os investigados no inquérito já existente das milícias digitais. Moraes ordenou ainda que a rede X não desobedeça nenhuma ordem da Justiça brasileira. E estipulou multa de R$ 100 mil para cada perfil que ele reativar irregularmente. O ministro afirmou que viu indícios de obstrução de Justiça e incitação ao crime nas atitudes de Musk nos últimos dias.
No sábado (06/04), Musk atacou as decisões de Alexandre de Moraes nas investigações comandadas pelo ministro. O empresário ameaçou ainda reativar os perfis de usuários do X bloqueados pela Justiça. Moraes é relator de inquéritos como: o das milícias digitais: que investiga ações orquestradas nas redes para disseminar informações falsas e discurso de ódio, com o objetivo de minar as instituições e a democracia; o do 8 de janeiro: que investiga a tentativa de golpe no Brasil por apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro.
No curso dessas apurações, ao longo dos últimos anos, Alexandre de Moraes determinou que as redes sociais bloqueassem as contas de alguns investigados. De acordo com o ministro, eles usavam as plataformas para o cometimento das práticas irregulares que são investigadas. Dentre os investigados que têm contas bloqueadas nas redes sociais está o senador capixaba Marcos do Val (Podemos), que foi alvo de uma operação da Polícia Federal de busca e apreensão no dia 15 de junho de 2023, autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes.
Musk decidiu confrontar o ministro. No sábado, publicou em cima de uma postagem de Alexandre de Moraes no X a seguinte provocação: “Por que você está exigindo tanta censura no Brasil?” O bilionário também disse que Moraes “traiu descaradamente e repetidamente a Constituição e a população do Brasil”. O empresário ainda afirmou que publicará “em breve” na rede social tudo que é exigido por Moraes, dizendo que essas solicitações “violam a lei brasileira”. Musk também chamou Moraes de “o Darth Vader do Brasil, em referência ao personagem da saga Star Wars, ao comentar uma foto do ministro com a toga do Supremo.
Depois, ainda no sábado, Elon Musk ameaçou que a plataforma reativará as contas bloqueadas, em desrespeito à Justiça, mesmo que, segundo Musk, isso custe o fechamento da empresa no Brasil e prejudique o lucro. De origem sul-africana-canadense e naturalizado norte-americano, o bilionário escreveu ainda que Alexandre de Moraes de “renunciar ou sofrer um impeachment”.
Depois dos sucessivos ataques do empresário, saiu a decisão de Alexandre de Moraes, no meio da noite do domingo (07/04). Para o ministro, Musk cometeu as práticas irregulares de usar as redes sociais para espalhar desinformação e desestabilizar instituições do Estado Democrático de Direito: “Na presente hipótese, portanto, está caracterizada a utilização de mecanismos ilegais por parte do ‘X’; bem como a presença de fortes indícios de dolo do CEO da rede social ‘X’, Elon Musk, na instrumentalização criminosa anteriormente apontada e investigada em diversos inquéritos”, pontuou o ministro.
Em outro trecho da decisão, Moraes escreve, em letras maiúsculas: “AS REDES SOCIAIS NÃO SÃO TERRA SEM LEI! AS REDES SOCIAIS NÃO SÃO TERRA DE NINGUEM!”. Disse ainda que as plataformas devem seguir a Constituição, sob pena de responderem pelos seus atos. Para Moraes, o X e Musk afrontam a soberania do Brasil:
“A flagrante conduta de obstrução à Justiça brasileira, a incitação ao crime, a ameaça pública de desobediência as ordens judiciais e de futura ausência de cooperação da plataforma são fatos que desrespeitam a soberania do Brasil e reforçam à conexão da dolosa instrumentalização criminosas das atividades do ex-Twitter, atual X”, declarou o ministro.
As declarações de Musk geraram réplicas entre políticos e autoridades. O ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), Jorge Messias, disse que o Brasil precisa aprovar uma regulamentação das redes sociais para impedir que “bilionários com domicílio no exterior” ataquem o Estado Democrático de Direito.
“É urgente regulamentar as redes sociais. Não podemos conviver em uma sociedade em que bilionários com domicílio no exterior tenham controle de redes sociais e se coloquem em condições de violar o Estado de Direito, descumprindo ordens judiciais e ameaçando nossas autoridades. A Paz Social é inegociável”, escreveu Messias.
João Brant, secretário de Políticas Digitais da Secretaria de Comunicação da Presidência, também defendeu a regulação das redes. Afirmou ainda que Musk, ao escrever os ataques a Moraes, despreza a Justiça brasileira. “A atitude de Elon Musk evidencia seu desprezo pela justiça brasileira”. Responde politicamente ao buzz dos últimos dias requentando decisões antigas e aproveita para fazer agitação e propaganda de extrema direita. É claro que pode haver opiniões diferentes sobre as decisões do STF e do TSE, mas não é disso que se trata. Musk resolveu defender golpistas e escalar o tema por motivos políticos (possivelmente também comerciais)”, afirmou Brant.
O presidente do Tribunal de Contas da União, Bruno Dantas, afirmou que “liberdade de expressão é direito fundamental que jamais, em qualquer lugar do mundo, significou licenciosidade para transgredir a lei ou atacar instituições de um país”.
O ministro Paulo Pimenta, da Secretaria de Comunicação Social da Presidência, comentou a decisão de Moraes. Ele disse que Musk não vai intimidar o Brasil. “Não vamos ser intimidados. Nosso País é soberano e ninguém vai impor sua vontade autoritária e fazer valer a lógica de que o dinheiro faz o seu ‘modelo de negócios’ estar acima da Constituição Federal”, escreveu.
Contas bloqueadas
Alguns dos investigados pelo STF que tiveram os perfis bloqueados continuavam com o bloqueio até a última atualização desta reportagem: Luciano Hang, empresário; Allan dos Santos, blogueiro; Daniel Silveira, ex-deputado cassado; Monark, youtuber; Oswaldo Eustáquio, blogueiro; senador Marcos do Val.