O juiz Ronaldo João Roth, do Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo, derrubou a Resolução SSP-40, de 24 de março de 2015, ao acolher pedido da Associação de Oficiais Militares do Estado de São Paulo em Defesa da Polícia Militar (Defenda PM) e conceder habeas corpus coletivo a todos os oficiais da Polícia Militar no exercício de Polícia Judiciária Militar.
A decisão foi tomada no dia 8 de julho de 2020. Dois dias depois, a Associação dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo (ADPESP) ingressou com três ações judiciais contra a decisão do magistrado de primeiro grau do Tribunal de Justiça Militar, “tendentes a usurpar atribuições legais da Polícia Civil”.
A Resolução, baixada pelo agora ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, quando era secretário da Segurança Pública de São Paulo, obrigava a PM a preservar o local do crime em que há morte decorrente de intervenção policial e aguardar a chegada do delegado de Polícia Civil que chefiará a investigação.
A Defenda PM postulou “a concessão da Ordem, para que todas as autoridades de Polícia Judiciária Militar da PM paulista se abstenham de instaurar procedimentos de Polícia Judiciária Militar em desfavor da coletividade formada pelos Oficiais Militares Estaduais por descumprirem o Despacho nº CorregPM-003/310/2020, de 03 de junho de 2020, e Resolução SSP 40, de 24 de março de 2015, por ocasião da adoção das medidas preliminares dispostas nos artigos 8º, “a” e “g”, 10 e, notadamente, 12, “b” (apreender os instrumentos e todos os objetos que tenham relação com o fato), em qualquer registro de procedimentos de polícia judiciária militar, com destaque, especificamente, nos registros de morte, de civil ou militar, decorrente de intervenção policial militar, estando ou não o agente em serviço, quando estas Autoridades de Polícia Judiciária Militar apreendem as armas dos policiais militares indiciados ou envolvidos”.
Na argumentação, o advogado da Defenda PM, Azor Lopes da Silva Júnior, afirma que “o Secretário de Segurança Pública não tem nenhuma competência legal no âmbito da Polícia Judiciária Militar, vez que nenhum ato dessa atividade está sob o seu crivo legal, pois à luz da legislação federal, tanto no Decreto-lei 1002 de 1969, Código de Processo Penal e no Decreto-Lei nº 667, de 1969, Lei de Organização das Polícias Militares, a sua atribuição é de coordenação das atividades de polícia ostensiva”.
Prosseguindo, o advogado diz entender “que a resolução é um ato alienígena ao Direito Penal e Processual Militar em matéria já julgada pelo Plenário do Tribunal de Justiça Militar, portanto coisa julgada, em total afronta a decisão jurisdicional que a declarou inconstitucional por unanimidade”.
Na decisão, o Ronaldo João Roth faz três perguntas:
“Se é inafastável a assertiva de que cabe à Polícia Militar realizar a apuração do crime de homicídio doloso contra civil, quando praticado por policial militar em serviço ou agindo em razão da função… como se admitir que, no caso concreto, seja possível a aplicação da referida Resolução SSP 40/15?”;
“Como se admitir que o Oficial PM que age nas atribuições de Polícia Judiciária Militar…descumpra a determinação legal de apreender armas, objetos e instrumentos relacionados do crime… se tal imposição legal faz parte do complexo de diligências para apuração do fato delituoso?”;
“Como se admitir que uma Resolução, que é um ato administrativo, possa modificar o mandamento legal do Código de Processo Penal Militar (CPPM)?”.
Respondendo aos próprios questionamentos, Roth afirmou que, no Estado de Direito, é inaplicável a referida Resolução SSP 40/15 por ser ela inconstitucional e ilegal. Cumpri-la implicaria em prática de crime funcional por parte dos Oficiais PM “que têm o dever de realizar, impositivamente, as atribuições legais impostas pelo Código de Processo Penal Militar (CPPM)”.
De acordo com o magistrado, “admitir que a Resolução SSP 40/15, que é um ato administrativo, se sobreponha às normas legais, torna-se não só um ato ilegal, mas também levaria os Oficiais PM à prática de ato manifestamente criminoso, prevaricando (art. 319 do CPM), ou descumprindo Lei, Regulamento, ou Instrução (art. 324 do CPM), nos termos do art. 38, § 2º, do Código Penal Militar (obediência hierárquica)”.
Ao finalizar, o juiz Ronaldo João Roth concedeu a ordem (reconhecendo a inconstitucionalidade e ilegalidade da Resolução SSP 40/15) expedindo o salvo conduto aos oficiais da Polícia da Policia Militar de São Paulo, de maneira coletiva e materializada num único documento para que possam realizar as atribuições legais impostas pelo Código de Processo Penal Militar, sem ameaça de responsabilidade criminal e disciplinar, decorrentes dos efeitos concretos da Resolução SSP 40/15.
ADPESP propõe três medidas judiciais contra decisão de juiz do TJM
A Associação dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo (ADPESP) ingressou, na última sexta-feira (10/07), com três ações judiciais contra a decisão de um juiz de primeiro grau do Tribunal de Justiça Militar, “tendentes a usurpar atribuições legais da Polícia Civil”.
Com o objetivo de preservar o bom andamento da Segurança Pública no Estado de São Paulo e a harmonia entre os órgãos da Segurança, a ADPESP impetrou, junto ao Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo, Mandado de Segurança e um incidente de Conflito de Competência, questionando a decisão do magistrado. A ADPESP também ajuizou uma Reclamação Regimental no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, visando preservar a competência constitucional da Corte Paulista.
Para a ADPESP, em consonância com amplo entendimento jurisprudencial acerca da matéria, a competência para realizar atos de Polícia Judiciária, entre eles a apreensão de objetos de corpo de delito e armamento, está constitucionalmente reservada à Polícia Civil, sob a presidência de um Delegado de Polícia, como se pode verificar pela leitura do artigo 144, § 4º da Constituição Federal.
“A ocorrência que resulte na morte de civis por agentes militares constitui um crime comum e não militar, sendo inclusive competente para o julgamento o Tribunal do Júri, motivo pelo qual a Resolução SSP 40, de 24 de março de 2015 foi editada, delimitando as competências de cada um dos órgãos de Segurança Pública”, diz o presidente da ADPESP, Gustavo Mesquita Galvão Bueno.
A ADPESP esclarece ainda que a decisão, justamente por ter sido realizada por juiz militar, não pode alcançar as competências e atribuições dos Delegados da Polícia Civil.
“Não bastasse esta obviedade, é de se ressaltar que a decisão foi proferida por juiz de primeiro grau, absolutamente incompetente para conhecer do caso, sendo totalmente nula sua decisão, já que O controle abstrato de constitucionalidade de ato normativo emanado por Secretário de Estado somente pode ser realizado pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo”, frisa a entidade.
“A ADPESP jamais deixará de combater atos, quer seja de natureza política, quer seja de natureza judicial, que tencionem turbar as prerrogativas histórico-constitucional dos Delegados de Polícia. Não se trata de uma defesa rasa de espaços de poder. Em verdade, estamos a lutar pela preservação intacta, através do ferramental que o legislador originário nos reservou, dos direitos e garantias da maior autoridade entre nós – o cidadão”, enfatiza Gustavo Mesquita Galvão Bueno, presidente da ADPESP.
Decisão da Justiça Militar põe em risco a sociedade e investigações da Polícia Civil, diz Raquel Gallinati
Em artigo publicado no Blog do jornalista Fausto Macedo, em o Estadão, a presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo, Raquel Kobashi Gallinati Lombardi, afirma que a decisão do Tribunal de Justiça Militar de São Paulo, que concedeu ordem de Habeas Corpus, reconhecendo a inconstitucionalidade e ilegalidade da Resolução SSP nº 40/2015, “é totalmente improcedente e infundada”.
Segundo ela, a decisão contraria o ordenamento jurídico vigente, “já que não cabe ao TJM analisar atos normativos que não tenham sido emanados de órgãos militares”.
“Não é cabível, por exemplo, que o militar que pratica tortura contra um civil seja julgado pela ‘sua’ Justiça Militar. Acrescente-se, ainda, que o § 4º, do artigo 125, da Constituição Federal, estabelece que compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares dos Estados, nos crimes militares definidos em lei, e as ações judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência do júri quando a vítima for civil”, diz Raquel Gallinati.
Para a dirigente de classe, “isto significa que a Polícia Militar e Justiça Penal Militar poderão, respectivamente, apurar e julgar apenas os denominados crimes puramente militares, ou seja, aqueles que estão definidos somente no Código Penal Militar”.
E conclui: “Tergiversar sobre o tema indica parcialidade, o que afronta a própria Constituição. O cidadão que sofre a violência praticada por militar merece ser acolhido por uma instituição de Estado e uma autoridade imparcial, quais sejam, as Polícias Civis e Delegado de Polícia”.
(Com informações dos Portais da Defenda PM e da ADESP)