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O Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo (TRE-ES) concluiu, na tarde de terça-feira (09/12), o julgamento do recurso criminal contra o deputado federal Gilvan da Federal (PL) e manteve integralmente a condenação por violência política de gênero contra a deputada estadual Camila Valadão (Psol). Com o resultado, o parlamentar se torna inelegível por oito anos, com base na Lei da Ficha Limpa, e o segundo político no Brasil a perder o direito por causa do crime de violência política de gênero, tipificado pela Lei 14.192/2021. Desta forma, Gilvan não poderá disputar a reeleição à Câmara Federal em 2026.

O julgamento foi retomado após a devolução de pedido de vista do desembargador Adriano Sant’Anna Pedra, que acompanhou o voto da relatora, desembargadora Janete Vargas Simões. A Corte reconheceu que o deputado praticou violência política de gênero ao atacar e intimidar Camila Valadão durante sessões da Câmara Municipal de Vitória, em 2021, período em que ambos exerciam o mandato de vereador.

“A violência política de gênero enfraquece a democracia. O que aconteceu na Câmara de Vitória em 2021 não foram ‘brigas’ ou ‘desavenças políticas’. O episódio em questão tem nome: violência política de gênero, tipificada pela legislação brasileira. É disso que se trata! A condenação que ele [Gilvan] recebeu chega tarde. Foram dois anos sendo ameaçada, desqualificada, interrompida e xingada no exercício do meu trabalho, para o qual fui legitimamente eleita”, comentou a deputada Camila.

No voto, a desembargador Janete Vargas Simões – que é a futura presidente do Tribunal de Justiça do Estado – destacou que ficou demonstrado nos autos que o parlamentar humilhou a então vereadora ao ordenar que ela “calasse a boca”, entre outras condutas registradas em vídeos e depoimentos. Segundo Janete Simões, houve menosprezo e discriminação em razão da condição de mulher, com potencial para dificultar o exercício do mandato eletivo.

Ao acompanhar o entendimento da relatora, o desembargador Adriano Pedra afirmou que as ações de Gilvan da Federal ultrapassaram os limites da crítica política e configuraram constrangimento direcionado à parlamentar. Ele ressaltou que as expressões e a postura adotadas assumiram caráter de supressão da fala e tentativa de neutralizar a atuação da então vereadora:

“As condutas praticadas pelo réu ultrapassaram o limite da crítica política, adentrando o espaço do constrangimento direcionado à então vereadora, em razão da sua condição de mulher. As expressões dirigidas a parlamentar, especialmente a ordem para que “calasse a boca”, repetida em ambiente legislativo e acompanhada de postura intimidatória, assumem o caráter de supressão da fala e de tentativa de neutralizar sua atuação política”, declarou.

Os episódios julgados ganharam repercussão nacional em novembro e dezembro de 2021. Gilvan desferiu ataques diretos à então vereadora Camila Valadão, usando expressões como “satanista”, “assassina de bebê”, “assassina de criança” e repetindo por diversas vezes que ela deveria “calar a boca”, durante sessões da Câmara de Vitória, enquanto exercia sua função parlamentar.

Em um dos ataques, após uma sessão sobre o Dia da Consciência Negra, Gilvan chegou a desinfetar a tribuna onde Camila havia discursado minutos antes. Vídeos das sessões circularam amplamente nas redes sociais.

Em março de 2024, o juiz eleitoral Leonardo Alvarenga da Fonseca condenou Gilvan a um ano, 4 meses e 15 dias de prisão em regime aberto e o pagamento de multa de R$ 10 mil à vítima, em primeira instância. À época, o magistrado afirmou que o deputado federal se aproveitou da condição de mulher de Camila para intimidá-la, subjugar e impedir o exercício pleno do mandato.

Mesmo que recorra ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a inelegibilidade já está válida a partir da decisão colegiada: “A condenação do atual deputado federal é necessária e justa. Ela sinaliza para o Brasil que espaços parlamentares não são mantos protetores para a violência. Imunidade parlamentar não pode servir de autorização para agredir mulheres, como infelizmente ainda acontece por todo o país. A democracia tem uma dívida com as mulheres ao permitir que homens assim sigam violentando, impunemente. A Lei 14.192/2021, que tipifica a violência política de gênero e estabelece mecanismos de prevenção, repressão e combate a esse crime, existe há 4 anos”, destaca Camila Valadão.

Histórico de ataques

O deputado federal Gilvan da Federal já foi agente de outros atos violentos. Em 2022, a 10ª Vara Criminal de Vitória recebeu denúncia contra o parlamentar por transfobia, após ataques à ativista transexual Deborah Sabará. Em 2024, teve condenação na Justiça por calúnia e difamação contra a secretária de Estado das Mulheres, Jacqueline Moraes, quando ela era vice-governadora. Além disso, o deputado também responde por ação relacionada a ataques motivados por racismo religioso, caso ainda em tramitação.

Em cenário nacional, Gilvan Federal recebeu suspensão de três meses pelo  Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados por chamar a deputada federal Gleisi Hoffmann de “prostituta”. Além de episódios em que desejou a morte da ministra Marina Silva e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.