“Agora todo mundo se acha no direito de ter uma arma. Arma é para a polícia. Se uma pessoa quer sair pelas ruas armada, que vá fazer um tratamento psicológico.” Foi dessa forma que o governador Renato Casagrande (PSB) comentou na manhã desta segunda-feira (22/04) a tragédia ocorrida no sábado (20/04) à noite, em Mata da Praia, bairro nobre de Vitória, em que o advogado Luís Hormindo França Costa, de 33 anos, matou a tiros o empresário Manoel de Oliveira Pepino, 73 anos. Os dois discutiram e trocaram tiros por causa do cachorro de Manoel, que estava solto na rua, em frente à casa do empresário. O advogado também estava passeando com seu cão. Para Casagrande, a tragédia “evidencia a cultura insana e da violência presente na sociedade” brasileira. O governador também voltou a criticar a “facilidade de acesso às armas” no País, por culpa da política armamentista implantada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), a partir de 2019, quando governou o Brasil.
A manifestação de Casagrande foi feita durante evento ocorrido no Palácio Anchieta, que marcou o lançamento do Anuário da Indústria do Petróleo e Gás Natural no Espírito Santo. Indagado pelo Blog do Elimar Côrtes de que forma o Estado pode defender uma campanha em favor do desarmamento, o governador respondeu:
“Eu acho que a gente tem que se expressar. É bom que a gente possa se expressar, pois temos uma sociedade dividida. O maior problema não é ter a arma; o maior problema é o porte da arma. E isso virou mais um debate ideológico. Tem que tirar a ideologia desse debate e compreendermos que a facilidade da pessoa ter acesso a uma arma coloca em risco essa pessoa e outras pessoas que estão perto dela. Se às vezes você tem uma desavença pequena, banal, fútil, mas se você tiver armado você perde a cabeça. Todo mundo corre o risco de perder a cabeça. E se tiver uma arma perto e essa pessoa perder cabeça pode significar perda de vida de alguém. Então, por isso que a gente tem que se expressar sempre toda hora, todo momento, para que os pais, as mães, os responsáveis, as pessoas que estão na área de estão possam compreender a necessidade da gente ter muita restrição ao acesso à arma.”
De acordo com a Polícia Civil, o empresário Manoel (Foto) estava com a esposa e um cachorro, sem coleira, passeando por uma rua do bairro Mata da Praia. O advogado Luís também estava passeando com um cão, na coleira, quando questionou Manoel sobre o perigo do outro animal avançar em seu pet. Os dois começaram a discutir e, em um certo momento, o empresário entrou em casa para buscar a sua arma. Manoel voltou à rua e teria iniciado o tiroteio. O empresário acabou morto. O advogado ficou no local e esperou a chegada da Polícia Militar.
Luís foi conduzido à Delegacia Regional de Vitória, onde foi autuado em flagrante por homicídio e por praticar ato de abuso contra cão, previsto no artigo 32§ 1º-A da LEI 9.605/98. Ele foi encaminhado ao presídio. No domingo, o advogado Luís Hormindo teve a prisão em flagrante convertida em preventiva, conforme decisão do juiz Alcemir dos Santos Pimentel, na Audiência de Custódia. Para o magistrado, o ato do advogado foi de “extrema gravidade”, o que impede, neste momento, a sua liberdade.
Questionado na entrevista coletiva se a sua crítica se deve ao caso ocorrido em Mata da Praia, Renato Casagrande lembrou, sem citar nomes, que sempre vem se manifestando sobre a política de afrouxamento ao acesso às armas concedida pelo ex-presidente Bolsonaro e que foi alterada pelo presidente Luís Inácio Lula da Silva (PT):
“Eu tenho comentado isso frequentemente, porque muita gente, inclusive na guerra do tráfico, perde a vida por excesso de armas. E veja quanto enfrentamento tem a polícia com grupos criminosos, algo que não tínhamos tanto como estamos tendo agora, porque também os grupos criminosos estão tendo uma facilidade de ter acesso às armas. Qualquer pessoa podia adquirir uma arma e adquirir muitas munições. Essas pessoas podem estar levando essas armas para grupos criminosos. Por isso, é preciso que a gente faça o debate, algo que tenho feito permanentemente quando acontece um fato desse que o motivo foi fútil, banal e a gente chama muito mais atenção. E se tem uma coisa que a gente tem que aproveitar é chamar atenção numa hora dessas para que todos possam fazer o seu debate”.
O governador informou ainda que de 20% a 30% dos homicídios são cometidos por motivos banais. “Infelizmente, é uma pessoa que está num churrasco, bebeu muito, esfaqueia outra. Assim, que por uma razão, uma briga familiar, num encontro familiar. Em média são homicídios que acontecem por razões inexplicáveis, que são crimes de proximidade. E isso choca muito a sociedade porque ainda a gente vê que tem uma violência na alma das pessoas. A gente precisa é começar, efetivamente, a ter uma educação que cultive a paz.”
Ainda durante a solenidade de lançamento do Anuário da Indústria do Petróleo e Gás Natural no Espírito Santo, o governador Renato Casagrande comentou sobre o assassinato ao abordar o ambiente “insano” que vive o País:
“O Espírito Santo precisa continuar sendo referência em políticas públicas e do diálogo. A violência está presente em todos os lugares. Vejam o episódio de Mata da Praia, em que uma pessoa foi morta por motivo banal. Estamos acostumados a ver vidas perdidas na disputa do tráfico. Quando se perde uma vida por conta de uma discussão porque o cachorro está sem coleira, é muito triste também. Agora todo mundo se acha no direito de ter uma arma. A arma é para policiais; quem quer ter uma arma, que faça tratamento psicológico. Vejam que absurdo: uma pessoa sai de casa armada para passear com o cão. Outra vai para dentro de casa e sai armada para continuar a discussão. Que sociedade nós queremos?”, indagou Casagrande.
No domingo (21/04), o governador também já havia se manifestado redes sociais: “A troca de tiros em um bairro nobre de Vitória que resultou na morte de um dos envolvidos evidencia a cultura da violência presente na sociedade. Também é preciso registrar que a facilidade de acesso às armas torna desentendimentos entre as pessoas momentos de risco extremo. Combater a violência é dever do Estado, mas também de cada um de nós”, publicou Casagrande em seu perfil no X (ex-Twitter).