O Senado aprovou na noite de terça-feira (07/11), em regime de urgência, o Projeto de Lei 3.045/2022, que cria a Lei Orgânica Nacional das Polícias Militares e dos Corpos de Bombeiros dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios e unifica as regras para as categorias. O projeto segue para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A articulação para a aprovação do projeto foi liderada pelo Palácio do Planalto e uniu senadores ligados aos partidos da esquerda e da direita. Teve como relator o senador capixaba Fabiano Contararo (PT), que é delegado de Polícia Civil aposentado. No dia 4 de setembro deste ano, a Câmara dos Deputados já havia aprovado a Lei Orgânica das Polícias Civis, o que foi confirmado, 20 dias depois, pelo Senado. As duas novas leis deverão se sancionadas pelo presidente Lula num mesmo dia, ainda agora em novembro.
De iniciativa da Presidência da República, o projeto mantém as corporações subordinadas aos governadores e determina que a organização das PMs e dos Corpos de Bombeiros deve ser fixada em lei estadual, observadas as normas gerais das Forças Armadas. O projeto traz 37 garantias para os ocupantes desses cargos, da ativa, da reserva remunerada ou reformados (aposentados).
Entre as garantia estão: uso privativo dos uniformes, insígnias e distintivos; porte de arma; assistência jurídica, quando acusados de prática de infração penal, civil ou administrativa decorrente do exercício da função ou em razão dela; seguro de vida e de acidentes quando vitimados no exercício da função ou em razão dela; e assistência médica, psicológica, odontológica e social para o militar e seus dependentes. Já os cônjuges ou dependentes terão direito à pensão do militar ativo, da reserva ou reformado correspondente ao posto ou patente que possuía, com valor proporcional ao tempo de serviço.
Freio na politização
A nova Lei Orgânica traz dispositivos que buscam limitar a politização das forças de segurança nos Estados e diminuir a violência. Proibidos de se filiarem a partidos políticos e sindicatos, policiais e bombeiros militares não poderão mais ir armados a eventos político-partidários, mesmo fora do horário de serviço. Esses profissionais também não poderão manifestar publicamente ou em suas redes sociais opiniões sobre política, usando a farda, a patente, graduação ou o símbolo da instituição. Também serão vedados o uso de imagens que identifiquem vínculo com a instituição militar.
Quanto ao militar veterano da reserva remunerada, vigora a Lei 7.524, de 1986, que permite a expressão livre de opinião sobre assunto político, ideológico, filosófico ou de interesse público. O projeto determina a reserva de pelo menos 20% das vagas dos concursos públicos para mulheres. Na área de saúde, elas poderão concorrer à totalidade das vagas, além da aplicação da cota.
A proposta que vai para sanção presidencial estabelece regras para o militar que quiser se candidatar a um cargo eletivo que variam de acordo com o tempo de carreira. Caso tenha menos de 10 anos de serviço, o policial será afastado do serviço ativo no dia seguinte ao registro de sua candidatura na Justiça Eleitoral. Já o militar com mais de 10 anos de serviço passa para a reserva remunerada apenas se eleito, no dia da sua diplomação, com remuneração proporcional ao tempo de serviço.
Bacharelado em direito
A lei aprovada pelo Congresso Nacional também exige que os policiais militares que assumirem funções de comando, chefia, direção e administração superior na instituição (chamados de “Quadro de Oficiais de Estado Maior”) tenham bacharelado em Direito. No caso dos bombeiros, também é exigida alguma graduação, mas os Estados podem definir outras áreas além do Direito. O texto prevê ainda que o cargo de inspetor-geral das Polícias Militares e dos Corpos de Bombeiros seja exercido por um oficial general da ativa, seguindo as mesmas regras do Exército Brasileiro. A proposta aprovada reserva, no mínimo, 20% as vagas nos concursos públicos para as candidatas do sexo feminino.
Na lei que cria a Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (Lei 13.675, de 2018), o projeto inclui como princípio dessa política o uso comedido e proporcional da força pelos agentes de segurança pública, conforme documentos internacionais de proteção aos direitos humanos de que o Brasil seja signatário.
O texto ressalva competências de outros órgãos e instituições municipais. Especifica, por exemplo, que a perícia do Corpo de Bombeiros será feita depois de o local de incêndio ser liberado pelo perito criminal, devendo fornecer subsídios para o sistema de segurança contra incêndio e verificar o cumprimento ou não das normas técnicas vigentes. As armas de fogo usadas por policiais militares e bombeiros militares devem ser cadastradas no Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (Sigma), bem como as armas particulares.
Senadores falam da importância da Lei Orgânica
Em plenário, o senador Fabiano Contarato disse que dialogou sobre o projeto com o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, e com o ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha: “Quero agradecer a paciência e a compreensão do Governo Federal. Tive uma reunião com o Flávio Dino, com o ministro Padilha, falando para tentar, para explicar a importância de nós aprovarmos essa lei geral da Polícia Militar e dos Bombeiros”, pontuou o senador capixaba.
Ao falar sobre seu parecer, Contarato também elogiou Capitão Augusto: “Rendo aqui minhas homenagens ao Capitão Augusto, uma pessoa aguerrida e que vem defendendo a instituição.” Inicialmente, a proposta retirava poder dos governadores sobre a escolha dos comandantes-gerais das PMs e dos Corpos de Bombeiros, ao tornar obrigatória a nomeação entre nomes de lista da categoria. Esse trecho, porém, foi suprimido ainda na Câmara por Capitão Augusto.
Para Fabiano Contarato, o projeto é conveniente e oportuno. Em seu relatório, o senador capixaba lembrou que os policiais militares são regidos até hoje pelo Decreto-Lei 667, de 1969, criado no período das ditadura militar, e “que contém disposições anacrônicas e até mesmo incompatíveis com a Constituição Federal”. Segundo o relator, o PL estabelece princípios, diretrizes, competências, direitos, deveres e vedações. Contarato acrescentou que o texto também traz amparo legal e segurança jurídica para a existência e a atuação das Polícias Militares e dos corpos de bombeiros.
O senador agradeceu o apoio dos colegas e do governo ao projeto e lamentou que muitas vezes a sociedade veja os profissionais da segurança pública como marginais. Para Contarato, o policial precisa ser visto como um garantidor e não como um violador de direitos. Ele disse que o projeto é uma homenagem aos policiais “guerreiros e heróis”. E acrescentou: “Esta é uma matéria de extrema importância. Esta lei está nascendo como uma lei que faz jus às nossas polícias e aos nossos bombeiros militares. Parabéns a todos os policiais militares do Brasil”, homenageou o senador.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD/MG), disse reconhecer o belo trabalho de policiais e bombeiros em prol da segurança nacional. Para o senador Ciro Nogueira (PP-PI), a matéria vem em hora “mais do que oportuna”. O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) destacou a presença de policiais e bombeiros que acompanhavam a votação da matéria nas galerias do Senado.
Na visão do senador Styvenson Valentim (Podemos-RN), o projeto é importante para o reconhecimento do valor dos policiais e dos bombeiros militares. Já Chico Rodrigues (PSB-RR) destacou o que chamou de conquistas do projeto. Efraim Filho (União-PB) elogiou a mobilização em torno da matéria e considerou o projeto como “uma bela vitória”.
O senador Esperidião Amin (PP-SC) reconheceu o mérito da proposta e elogiou o trabalho do colega capixaba Fabiano Contarato, como relator no Senado, e do Capitão Augusto (PL-SP), autor do relatório na Câmara dos Deputados. O senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR) disse que a Lei Orgânica é importante para os policiais e também para toda a sociedade brasileira. A senadora Zenaide Maia (PSD-RN) reconheceu a importância do projeto, mas cobrou mais orçamento para a segurança pública.
O líder do governo no Congresso Nacional, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), afirmou que a Lei Orgânica é um estatuto de direitos e deveres importante para a categoria. Segundo Randolfe, o governo apoia o projeto e tem buscado valorizar as polícias militares: “A valorização das polícias e dos bombeiros não se faz com bravatas, mas com gestos concretos”, argumentou Randolfe.
Na opinião do também senador capixaba Marcos do Val (Podemos), a importância das polícias militares vai além da segurança pública. A senadora Leila Barros (PDT-DF) apontou que o projeto é uma resposta muito positiva do Senado para os bombeiros e para os policiais. Os senadores Alan Rick (União-AC), Cid Gomes (PDT-CE), Beto Faro (PT-PA), Carlos Viana (Podemos-MG), Luís Carlos Heinze (PP-RS), Wilder Morais (PL-GO), Otto Alencar (PSD-BA), Jayme Campos (União-MT), Izalci Lucas (PSDB-DF), Jorge Kajuru (PSB-GO), Jussara Lima (PSD-PI), Margareth Buzetti (PSD-MT), Weverton (PDT-MA), Astronauta Marcos Pontes (PL-SP), Flávio Arns (PSB-PR) e Sergio Moro (União-PR) também manifestaram apoio ao projeto, como uma forma de reconhecer a importância das PMs e dos corpos de bombeiros.
“O texto é positivo para a categoria e mostra o respeito que o Senado tem pelas carreiras dos policiais e dos bombeiros militares. Temos a obrigação de fortalecer a segurança pública”, afirmou o ex-juiz federal e ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro.
Tramitação
O projeto foi proposto pelo Executivo no ano de 2001, ainda no governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), para criar a chamada lei orgânica nacional da categoria, prevista pela Constituição de 1988, mas até hoje inexistente. A matéria foi aprovada na Câmara dos Deputados no final do ano passado. No Senado, a matéria foi analisada na Comissão de Segurança Pública (CSP) e na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O relatório de Contarato foi aprovado na CCJ na semana passada e o projeto enviado ao Plenário em regime de urgência. A previsão inicial era que a matéria fosse votada no Plenário no mesmo dia, 31 de outubro. No entanto, lideranças pediram mais tempo para analisar possíveis ajustes no texto.