O assassinato de um homem identificado como Eduardo Chaves Camilo, de 32 anos, ocorrido na madrugada do dia 16 deste mês no Bar do Gordinho – uma casa de shows localizada no bairro Mário Cyprestes, no Tancredão, Região de Santo Antônio, em Vitória –, demonstra falhas de um aspirante à oficial da Polícia Militar e da imprensa capixaba. Desde os primeiros minutos do crime, que teve ainda outras três pessoas baleadas, a imprensa, com base em um Boletim de Ocorrência afoito, imprudente e infeliz, vinha acusando injustamente policiais militares de terem praticado o homicídio. Faltou à imprensa buscar melhor as informações e apurar com quem realmente tinha o controle das investigações. Uma semana após o corrido, no entanto, o comando da Polícia Civil negou veementemente que PMs tenham sido autores do crime, que foi cometido pela guerra do tráfico na Capital.
Tragicamente, na madrugada seguinte – 17 de abril de 2023 –, o soldado PM Lucas Torrezani de Oliveira matou seu vizinho de condomínio, o músico Guilherme Rocha, de 37 anos, em Jardim Camburi, em Vitória. Lucas bebia cerveja com um amigo numa área do edifício, ouvindo música em som alto em plena madrugada, o que revoltou Guilherme e outros moradores que não conseguiam dormir. Guilherme desceu de seu apartamento para reclamar, mas foi agredido com uma coronhada e depois assassinado ao tentar reagir. Levou um tiro de pistola à queima roupa. O soldado Lucas está preso.
A partir dos dois episódios – no Bar do Gordinho e em Jardim Camburi – os meios de comunicação do Estado passaram a produzir reportagens e editoriais criticando a Polícia Militar e dando informações sobre outros eventos envolvendo policiais.
“Esses últimos dias foram muito constrangedores para todos nós militares. Saíamos às rua para trabalhar tendo vergonha de encarar as pessoas. Foi como se todos fôssemos assassinos, pois tomamos muita pancada. Apanhamos até por algo que não foi cometida por colegas policiais”, disse um sargento.
Depois de uma semana de investigação, revendo imagens do circuito interno e externo do Bar do Gordinho e realizando diversas diligências, o chefe da Divisão Especializada de Homicídios e Proteção à Pessoa da Capital, delegado Marcelo Cavalcanti, afirmou, em coletiva de imprensa na segunda-feira (24/04), que o criminoso não é policial. “Entendo que foi feita uma ocorrência que sugeria a participação de militares. A investigação aponta que não houve participação. Após analisarmos imagens e outros elementos, podemos afirmar cabalmente que o fato no foi praticado por policiais militares”, assegurou o delegado.
Sem citar nomes, Marcelo Cavalcanti se referiu ao Boletim de Ocorrência confeccionado pelo aspirante a oficial Toso, que acabou de sair da Academia de Polícia Militar do Estado, depois de três anos no Curso de Formação de Oficiais, após ser aprovado em concurso público. Ele era o CPU responsável pelo policiamento em Vitória entre a noite do dia 15 e madrugada do dia 16 de abril deste ano e esteve no Bar do Gordinho para realizar os primeiros atendimentos. E lá o aspirante Toso deu uma de investigador, conforme o relatório que produziu.
O BO diz que aos 16 dias de Abril de 2023, a guarnição RP 4747, composta pelos militar Cb Daniele Sd Xavier foram acionados para averiguação de um suposto homicídio ocorrido no Bar do Gordinho, localizado na Av. Dário Lourenço de Souza, bairro Mario Cipreste, Vitória/ES. Ao chegar no local, foi constado, de fato, o homicídio do natural Eduardo Chaves Camilo.
Ao tomar ciência do fato, a guarnição do CPU 4750, composta pelo Asp Of Toso e Sd Felipe, “chegaram” ao local. Imediatamente, este CPU (Toso) providenciou o isolamento do local do crime e prosseguiu ao interior do estabelecimento com intuito de acessar as câmeras para identificação do suspeito e possível cerco.
Ao chegar à central de monitoramento, foi feito o contato com a senhora Aline Silva Xavier, que se apresentou como chefe da segurança. Ao serem analisadas as imagens das câmeras atrás dos banheiros químicos, constatou-se que, à 1h30min os disparos foram executados por um indivíduo que vestia camisa marrom-clara ou bege, bermuda de cor branca e chinelo, este que chegou ao local dos disparos e se retirou com outro indivíduo de camisa preta e bermuda clara, denotando que, possivelmente estariam juntos.
Em seguida, este CPU (aspirante Toso) conseguiu acesso ao livro de cautelas que, de acordo com Aline, seria o livro de registro das armas de fogo dos agentes de segurança pública que adentram no recinto, sendo anotados o nome do portador do armamento, a data e horário de entrada e saída, o numeral do armamento, o seu calibre, seu RG (Registro Geral) e função conforme instituição.
Nesse momento, prossegue o BO, “o Asp Of Toso solicitou à senhora Aline para verificar o registro de imagens conforme os horários de entrada dos indivíduos que estavam registrados no livro, na procura dos suspeitos que possuíam roupas semelhantes àquelas do autor dos disparos e de seu possível acompanhante. Portanto, às 00 horas e 41 minutos foi possível observar um indivíduo com as características físicas, sobretudo de vestimenta, como camisa marrom-clara ou bege, bermuda de cor branca e chinelo, condizentes com as observadas no autor dos disparos.”
Ainda de acordo com o relatório do aspirante Toso, “conforme o livro de cautelas, este (indivíduo suspeito) seria o horário de entrada do soldado F…, o que pode denotar o seu envolvimento como autor dos disparos.” De igual modo, acrescenta o aspirante, “observa-se, no livro, que o horário de entrada e saída de outro indivíduo, soldado E…, que adentrou ao recinto, conforme o referido livro às 00 horas e 42 minutos, portanto, 01 (um minuto) após o Sd F…Em relação ao horário de saída, observa que ambos se retiram do recinto, conforme registro, ao mesmo tempo, às 01 horas e 41 minutos, apesar de não se encontrar registro de imagens sobre a saída de ambos.”
E tem mais: “Posteriormente, a senhora Aline afirmou a este CPU que um de seus seguranças informou que reconheceu o indivíduo de camisa preta das imagens como o Sd E…, informando que este, conforme o segurança, o pediu para registrar o seu horário de saída como 20 minutos antes, solicitação que não foi obedecida e o registro teria sido feito no horário adequado.”
Prossegue o Boletim de Ocorrência: “Enquanto este CPU apurava as imagens do circuito eletrônico, a Cb Daniele informou que um dos investigadores da viatura da PC 2281 afirmou que os estojos recolhidos seriam de calibre 9mm, o que pode corroborar com a tese do envolvimento dos militares, apesar de, no livro de registro, o Inspetor Penitenciário G.P.J. também possuir este mesmo calibre.”
E conclui, informando que a vítima fatal foi encaminhada para o “Instituto Médico Legal (IML) de Vitória pela viatura PC 0033. Ademais, cumpre observar que houve uma vítima parcial chamada Maria Luiza Rosa de Oliveira, esta que foi encaminhada para atendimento no Hospital Estadual de Urgência e Emergência (HEUE) pela viatura SAMU 22, após ter recebido um disparo na perna direita. Informo que as imagens do livro de registro de cautelas e do circuito eletrônico encontram-se anexadas a esta ocorrência. Informo que as imagens do livro de registro de cautelas e do circuito eletrônico encontram-se anexadas a esta ocorrência.”
O assassinato dentro do Bar do Gordinho e a execução do músico Guilherme, em Jardim Camburi, ganharam notoriedade e geraram a propagação de algumas críticas e até charges pelas redes sociais, além de fake News com o intuito de difamar e caluniar a Polícia Militar e sua tropa. O presidente da Associação de Cabos e Soldados da PM e do Corpo de Bombeiros, cabo PM o Espírito Santo (ACS/ES), Jackson Eugênio Silote, afirmou que vai se reunir com o Departamento Jurídico da entidade e com os dois policiais que tiveram seus nomes expostos no Boletim de Ocorrência do aspirante Toso para saber que medidas poderão ser tomadas. Segundo Cabo Eugênio, outros episódios em que policiais são vítimas de calúnia, difamação e injúria, também serão analisados para posterior judicialização dos casos.
Sobre a conclusão taxativa da Polícia Civil de que o assassinato no Bar do Gordinho não tem participação de policiais, Cabos Eugênio afirmou que a ACS vai entrar com ação judicial até contra o autor do Boletim de Ocorrência que sugere que dois PMs teriam praticado o homicídios. O BO foi confeccionado pelo aspirante Toso:
“Foi divulgado pela Polícia Civil, na manhã de hoje (24 de abril), que os Policiais Militares que estavam sendo, INJUSTAMENTE, suspeitos de crime de homicídio no Gordinho Sambão, em Vitória, são INOCENTES! Durante os últimos dias, várias fake news a respeito do caso foram divulgadas, inclusive charges que tentavam difamar o trabalho da polícia militar capixaba. REPUDIAMOS qualquer ação como essa e vamos continuar cobrando, juntamente com nosso departamento jurídico, de todos aqueles que participaram da divulgação dessa inverdade – desde o responsável por redigir a ocorrência, até quem divulgou as falsas notícias. Vamos continuar defendendo e lutando por nossos heróis de farda e a nossa instituição!”, pontuou Eugênio nas redes sociais.
A diretora Social e Relações Públicas da ACS, soldada PM Lorena Nascimento dos Santos, também postou em suas redes sociais um vídeo em que pede à população mais empatia para com os policiais militares. A soldada Nascimento afirma estar solidárias com os familiares de vítimas de assassinato: “Eu me compadeço com a tristeza das famílias. Porém, peço a todos mais empatia com nossos policiais, que são verdadeiros heróis e heroínas”, afirmou a diretora Nascimento.
Nota do Editor
Este site está deixando de publicar o nome dos dois policiais militares citados no Boletim de Ocorrência confeccionado pelo aspirante a oficial Toso porque, conforme investigação da Polícia Civil, eles, de fato, nada têm a ver com o assassinato ocorrido no Bardo do Gordinho.
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