O senador eleito Flávio Dino (PSB-MA) afirmou, em entrevista publicada nesta quinta-feira (01/12) em O Globo, que a divisão do Ministério da Justiça e da Segurança Pública – que fez parte de uma das promessas de campanha do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) – em dois não deve acontecer. Nome contado para assumir a Pasta, Dino, que foi juiz federal antes de se tornar governador do Maranhão (2019/2022), explicou que a “tese majoritária” dentro da equipe de transição é manter o formato atual. Dino informou ainda que, a partir de janeiro de 2023, quando Lula assumir a Presidência, a Polícia Federal poderá instaurar Inquéritos Policiais para apurar a conduta de grupos de bolsonaristas que realizam atos antidemocráticos, principalmente, na porta de quartéis do Exército, em várias regiões do Brasil, num total desrespeito ao Estado Democrático de Direito.
O Ministério da Segurança Pública foi criado em fevereiro de 2018, por meio de Medida Provisória, pelo então presidente Michel Temer (MDB). Seu primeiro comandante foi Raul Jungmann, que era o ministro da Defesa. O novo Ministério, que foi incorporado ao Ministério da Justiça no governo de Jair Bolsonaro, tinha como missão “coordenar e promover a integração da segurança pública em todo o território nacional em cooperação com os demais entes federativos”. A Pasta era responsável, por exemplo, pela Polícia Federal e pela Polícia Rodoviária Federal, atualmente sob o comando do Ministério da Justiça, que na era Bolsonaro voltaram para o comando da Justiça.
No decorrer dos últimos três anos, porém, depois da saída do ex-juiz federal do comando do Ministério da Justiça, Bolsonaro se insinuou em recriar o Ministério da Segurança Pública para agradar a sua base bolsonarista, formada por policiais militares, federais e civis. Mas encerra o mandato sem conseguir realizar a “média” com seu principal público: os operadores da segurança.
Durante a campanha eleitoral, em que foi eleito para o terceiro mandato para Presidente da República, Lula, como forma de também agradar os policiais e demais seguimentos do meio, sinalizou que iria recriar o Ministério da Segurança, mas agora esbarra no próprio Flávio Dino, que é contra a recriação da Pasta. Dino, no entanto, disse ao O Globo que
caberá a Lula dar a palavra final:
“Eu já tenho uma posição conhecida, fruto da experiência de juiz, de que a integração é melhor. Se você coloca dois ministros, fica mais difícil, torna mais trabalhosa a efetivação de ações”, explicou ex-governador do Maranhão, que coordena o grupo de Justiça e Segurança Pública na transição de governo.
Para que Lula possa ‘bater o martelo’, disse Dino, a equipe preparou dois relatórios diferentes — um que considera a estrutura atual e outro com a separação. A proposta de criar uma Pasta específica para a Segurança Pública foi um aceno que Lula fez durante a campanha às forças policiais
O tema, porém, de acordo com O Globo, rachou a equipe de transição. Diferentemente de Flávio Dino, integrantes do grupo como o advogado Marco Aurélio de Carvalho defenderam publicamente a divisão das Pastas com o argumento de que seria uma forma de dar mais atenção a cada assunto, informa O Globo.
Nos bastidores, contudo, aliados de Lula avaliam que a divisão acabaria por desidratar o ministro da Justiça, pois tiraria a Polícia Federal do seu guarda-chuva. O indicado para o posto é considerado um importante interlocutor com o Poder Judiciário. Ao manter o status de “superministério” da Justiça e Segurança Pública, a ideia é repetir o modelo de gestão adotado nos primeiros mandatos de Lula, quando a Pasta foi comandada por nomes como Marcio Thomaz Bastos e Tarso Genro.
“Não se faz política de segurança pública sem a presença do Judiciário e do Ministério Público”, afirmou Dino ao O Globo. Segundo o jornal, mesmo sem ter sido anunciado oficialmente, Flávio Dino tem cumprido uma agenda de ministro, inclusive com interlocução no Supremo Tribunal Federal (STF). Foi ele, por exemplo, o escalado por Lula para falar com a imprensa logo após a primeira visita do presidente eleito aos ministros da Corte, no início do mês.
Flávio Dino disse ao O Globo que uma das missões que recebeu de Lula foi a de “despolitizar” e “pacificar” as forças de segurança. “Quem está em cima tem que mostrar esta atitude de despartidarizar. Eu sempre digo nas reuniões: ‘Não nos interessa em quem vocês votaram e em que vocês vão votar. O importante é construir uma pauta de trabalho conjunta em que todos colaborem”, disse ele, descrevendo os encontros com os chefes das forças de segurança. “Com isso, conseguimos distensionar.”
De acordo com o Globo, Flávio Dino informou que assim que o novo governo assumir, a Polícia Federal poderá ser acionada para investigar grupos de bolsonaristas que realizam atos antidemocráticos pelo País, nos quais contestam, sem provas, o resultado das eleições. Segundo Dino, crimes contra o Estado Democrático de Direito são de competência federal.
“Tem que separar o joio do trigo e conseguir moderar todo mundo. Como faz isso? Traz todos para a sua agenda, e o extremismo você trata com lei. A democracia tem o dever de se defender daqueles que querem destruí-la. E se depender de mim, isso está bem assentado”, afirmou ele, lembrando que há um subgrupo na equipe de transição voltado apenas a estudar ações para coibir crimes contra o Estado Democrático de Direito.
Outro assunto que chama a atenção na equipe de transição do governo Lula é como enfrentar os problemas provocados pela política armamentista deixada pelo presidente Jair Bolsonaro. Na terça-feira (29/11), em entrevista ao Blog do Elimar Côrtes, o governador reeleito do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB), disse que está trabalhando para que Lula dê “passos atrás aos diversos atos que foram anunciados e estabelecidos pelo presidente Bolsonaro com relação em facilitar o acesso às armas para pessoas que muitas vezes não têm treinamento e capacidade de uso, proporcionando um ambiente de risco para essas próprias pessoas.”
Casagrande fez o desabafo cinco dias depois do ataque terrorista praticado por um adolescente de 16 anos de idade a duas escolas em Aracruz, em que três professoras e uma estudante foram assassinadas a tiros e outras 13 pessoas ficaram feridas. No entanto, segundo fontes ouvidas em Brasília, surgiu na equipe transição uma corrente que entende que não dá para fazer ‘revogaço’ de decretos e que o fim da flexibilização terá que ser feito aos poucos.
Porém, para outro seguimento da equipe, existe uma “complexidade da engenharia legal” quanto a acabar com os decretos de Bolsonaro, “mas se não existir o ‘revogaço’ e o governo (Lula) não recriar o Ministério da Segurança Pública as promessas de campanha de Lula terão sido jogadas no lixo e o início da via da política realística sinaliza mais do mesmo, só que sem o ranço bolsonarista”.