Na última quarta-feira (19/10), o Tribuna Online publicou uma entrevista com a dona-de-casa Izabella Renata Andrade da Costa, de 28 anos, em que ela denunciou, pela primeira vez, um suposto esquema de ‘rachadinha’ no gabinete do então deputado federal Carlos Manato, entre 2016 e 2017. Na mesma entrevista, a jovem revela também como foi arquitetado o movimento do aquartelamento dos policiais militares do Espírito Santo, durante 22 dias de fevereiro de 2017, período em que, pela ausência de policiamento nas ruas e pelo caos instalado, pelo menos 219 pessoas foram assassinadas no Estado. Foi o chamado ‘Fevereiro Sangrento’, em que o comércio foi saqueado, ônibus incendiados e cidadãos de bem reféns dentro de casa.
Manato, que hoje disputa o cargo de governador no segundo turno, também é acusado de ser “uma das lideranças da ‘greve’ dos policiais militares naquele ano de 2017. As revelações de Izabella mostram, agora, que tudo foi arquitetado com um propósito: desestabilizar o então governador Paulo Hartung e dar visibilidade a profissionais ligados à segurança pública e o próprio Manato a disputar vagas nos Legislativos – Estadual e Federal – e ao governo do Estado. Paradoxalmente, hoje, parte do grupo político de Hartung está na campanha de Manato.
Ainda na mesma reportagem do Tribuna Online, Manato se defendeu das acusações de Izabella. Informa, inclusive, que um Inquérito Policial instaurado pela Polícia Federal para investigar suposto esquema de rachadinha, peculato e uso de funcionários fantasma em seu gabinete, na Câmara Federal, já havia sido arquivado pela Justiça Federal do Distrito Federal e Territórios.
Dois dias depois de conceder a entrevista ao Tribuna Online, Izabella aceitou gravar um vídeo para a campanha do governador Renato Casagrande (PSB), candidato à reeleição, e exibido no horário reservado às propagandas eleitorais. No sábado (22/10), ouvida pelo Blog do Elimar Côrtes, Izabella ratificou o teor da entrevista e do depoimento dado à campanha eleitoral e explicou por que levou cinco anos para denunciar a omissão do candidato Carlos Manato em relação às agressões que ela sofria por parte de Walter Matias, assessor e coordenador da campanha de Manato, e o esquema de ‘rachadinha’ no gabinete de Manato:
“Você acha que eu ia denunciar como? Para ele me agredir de novo? Me ameaçar de morte novamente? Eu tinha medo mesmo de morrer. Continuo com medo. Depois da entrevista que dei à A Tribuna, recebi centenas de telefonemas e mensagens de pessoas preocupadas com a minha integridade e perguntando se eu não tenho medo. É óbvio que tenho medo, mas eu não falei mentira. Tudo que eu disse é verdade”, frisou Izabella, que completou:
“Estou denunciado agora para evitar que ele (Manato) seja governador do Estado. Se ele fez tudo de ruim como deputado, imagina como governados?”, questiona Izabella, que emendou: “Eu sabia de muitas coisas erradas quando estava casada com o Matias. Eu tinha que me sujeitar aos caprichos dele, por que eu era constantemente espancada”.
Izabella é uma das mulheres que responderam na Justiça pela acusação de associação criminosa e por atentado contra a segurança ou funcionamento de serviços públicos durante o aquartelamento dos PMs. Ela, no entanto, foi absolvida em julgamento de primeira instância junto com outras mulheres: Flávia Roberta Arvellos de Aguiar, Clayde Berger de Oliveira, Larissa Assumção da Silva, Jocilene Moreira Andrade, Bruna dos Santos Brioschi, Gilmara Silveira Rodrigues Vazzoler, Laís Soares Fernandes, Bianca da Cruz e Silva, Raquel Fernandes Soares Nunes e Tamires Severina da Silva.
Na mesma Ação Penal nº 0019927-85.2017.8.08.0024, a juíza Gisele Souza de Oliveira, da 4ª Vara Criminal de Vitória, condenou três mulheres: Ângela Souza Santos, Cláudia Gonçalves Bispo e Débora Caroline Will. Ângela e Cláudia foram condenadas a três anos de prisão, enquanto Débora pegou um ano e seis meses. As três terão o direito de cumprir a pena alternativa, mas aguardam decisão do julgamento do recursos no Tribunal de Justiça.
O processo relativo ao mesmo episódio no âmbito da Justiça Comum foram desmembrados. Na outra Ação Penal número 0016850-68.2017.8.08.0024, o deputado estadual Capitão Assumção (PL) foi condenado a cinco anos e seis meses de prisão, em regime semiaberto.
A Justiça também condenou um dos assessores parlamentares de Assumção, o ex-soldado Walter Matias Lopes (na época, marido de Izabella), e os policiais militares Aurélio Robson Fonseca da Silva, Marco Aurélio Gonçalves Batista, Nero Walker da Silva Soares e José Ricardo de Oliveira Silva. E absolveu, na mesma ação penal, o tenente-coronel Carlos Alberto Foresti e os militares Leonardo Fernandes Nascimento, João Marcos Malta de Aguiar e Maxson Luiz da Conceição.
Walter Matias foi condenado a quatro anos e três meses de prisão; Aurélio Robson foi condenado a três anos e quatro meses, pena idêntica dada a Marco Aurélio. Os soldados Nero Walker e José Ricardo foram condenados a um ano e seis meses. Para os demais condenados, a juíza Gisele Souza de Oliveira decidiu substituir “a pena privativa de liberdade por dois restritivas de direito, pelo mesmo período da pena substituída, saber: a) prestação de serviços à comunidade, em local a ser definido pelo Juízo da Execução Penal; b) prestação pecuniária, consistente no pagamento de 3 (três) salários mínimos a entidade pública ou privada com destinação social”.
Abaixo, a íntegra da entrevista concedida por Izabella ao Tribuna Online:
A Tribuna – Quanto tempo você teria trabalhado para Manato?
Izabella Renata Andrade da Costa – Eu fui lotada no gabinete do Manato, mas eu de fato nunca trabalhei. Não sei onde fica o escritório, nem o endereço. Para falar a verdade, apesar de estar atuando, no papel, entre os anos de 2016 e 2017, nunca exerci nenhuma função, nem presencial nem remota, absolutamente nada. Era funcionária fantasma mesmo, nunca trabalhei um dia.
E como entrou nesse esquema?
A forma que eu cheguei ao cargo foi por meio do meu ex-marido, que é ligado ao Manato até hoje, o ex-soldado Matias.
Nessa época, apesar de estar lotada no gabinete dele, eu fiquei em casa, cuidando do meu filho.
Quanto recebia?
Não sei precisar o valor, pois ia direto para o meu ex-marido. Ele recebia e devolvia uma parte. O dinheiro não chegava às minhas mãos.
O seu ex-marido, na época, também participava?
Ele não era servidor. Só eu que era lotada lá no gabinete. Lembro apenas de ter assinado papéis, algumas folhas. Mas ele sempre atuou diretamente com Manato.
Você sabia que participava de um esquema que não era legal?
Sabia o que era rachadinha, já tinha ouvido falar. Mas o Matias comentava que não era só ele que fazia isso. Era algo que todo mundo fazia, algo normal.
O ex-soldado Matias foi acusado de participação na Greve da PM, em 2017. Você também participou de forma ativa?
Eu participei e vivi tudo aquilo de perto, fui para a frente de batalhões por causa do meu ex-marido. Eu fazia o que me diziam para fazer. A verdade é que Manato estava a frente de tudo sempre.
Da greve da PM?
Sim. Matias era quem aparecia, mas Manato era quem estava por trás o tempo todo. Ele era responsável pela parte de apoio logístico às mulheres. Ele pagava pela alimentação delas, os lanches que chegavam. Na época, foi falado que a alimentação vinha de doação de populares e de uma associação, mas sempre foi ele. A estratégia, na época, era muito clara e a mesma que usa hoje: instalar o caos na população para depois ele aparecer como salvador. Muitos acreditaram naquela época.
E você também foi presa na época?
Sim. Fiquei cinco dias presa. Meu filho tinha acabado de completar 1 ano de idade. Passei cinco dias presa por causa do envolvimento que eu tinha com meu ex-marido e respondo até hoje na Justiça porque teria atrapalhado as investigações. Já fui inocentada em um julgamento, mas houve recurso.
Nessa época da greve, você ainda era uma funcionária do gabinete do Manato?
Sim. Em fevereiro de 2017, fui exonerada do cargo que nunca exerci após eu ter sido citada nas investigações por envolvimento com a greve. Foi uma forma de ele tirar o corpo dele fora, como se falasse “eu não tenho nada a ver com isso e o problema é dela”.
E por que resolveu denunciar apenas agora?
Porque estou vendo o que está acontecendo de novo. Ele está usando a mesma tática da época da greve. Falando que a população está em perigo, que o governo é ineficaz na segurança para crescer. Me coloco no lugar das pessoas, acreditando que ele é uma pessoa, quando na verdade é completamente diferente. Vi de perto como essa imagem dele não condiz com a verdade.