O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, na quarta-feira (03/11), que os municípios podem instituir serviço de prestação de assistência jurídica à população carente. A maioria dos ministros votou pela improcedência da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 279, em que foram questionadas leis do Município de Diadema (SP). Para a Corte, as normas são constitucionais, porque garantem maior acesso à Justiça.
A ADPF 279 foi ajuizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra dispositivos da Lei Municipal 735/1983, que criou a assistência judiciária de Diadema, e da Lei Complementar Municipal 106/1999, que dispõe sobre a estrutura e as atribuições da Secretaria Municipal de Assuntos Jurídicos.
Em sua manifestação na sessão, o vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques de Medeiros, sustentou que a existência de uma ‘Defensoria Municipal’ é incompatível com a Constituição Federal, mas a oferta de serviços de assistência jurídica às pessoas necessitadas não é monopólio da União e dos Estados. Segundo ele, permitir ao cidadão mais de uma via de acesso à Justiça potencializa o direito de defesa.
No mesmo sentido, o procurador de Diadema, Fernando Marques, defendeu que a Constituição Federal não atribui o monopólio do atendimento jurídico à Defensoria Pública, cujos serviços não conseguem fazer frente às demandas existentes. O representante da Associação dos Procuradores e Advogados do Município de Diadema, Pedro Tavares Maluf, ponderou que suprimir a assistência judiciária não vai fortalecer as defensorias, mas prejudicar as pessoas que se valem dos serviços prestados pelo município.
Enfraquecimento
Em nome da Associação Nacional das Defensoras e dos Defensores Públicos (Anadep), Ilton Norberto Robl Filho defendeu a importância do modelo constitucional que atribui às defensorias a prestação de assistência judiciária com dotação orçamentária própria. Representada por Bruno Arruda, a Defensoria Pública da União (DPU) manifestou preocupação com o serviço público em questão, que, a seu ver, enfraquece a instalação de defensorias públicas no interior do País.
A maioria do Plenário acompanhou o voto da relatora, ministra Cármen Lúcia, pela improcedência da ação. Apesar de entender a preocupação das defensorias públicas em relação ao tema, ela salientou que não houve desrespeito à autonomia da instituição, à necessidade de permanente aperfeiçoamento nem ao trabalho desempenhado pelos defensores públicos.
Os votos que seguiram a relatora destacaram que o Município de Diadema não criou uma defensoria local, apenas disponibilizou um serviço público de assistência jurídica complementar voltado aos interesses da população de baixa renda, minorando a vulnerabilidade social e econômica e incrementando o acesso à justiça.
Para Cármen Lúcia, o Município tem competência para ampliar a possibilidade da prestação de assistência judiciária aos que necessitarem. “Precisamos de um sentimento constitucional que possa aumentar a efetividade constitucional dos direitos fundamentais”, disse.
Ao observar que existem apenas 10 defensores públicos em Diadema, a ministra salientou que não ainda não viu, no País, uma Comarca com atendimento suficiente e sem fila. “Nenhuma deu conta da necessidade que se apresenta”, afirmou.
Ela ressaltou que a intenção da Constituição Federal é a de que toda pessoa necessitada tenha acesso ao serviço gratuito de assistência judiciária, que é socialmente adequado, necessário e razoável. Além disso, assinalou que os recursos utilizados são do próprio município.
Acompanharam a relatora a ministra Rosa Weber e os ministros Dias Toffoli, Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Luiz Fux, presidente do STF.
Ficou vencido o ministro Nunes Marques, para quem as leis questionados violam o pacto federativo e o modelo de assistência judiciária gratuita instituído pela Constituição da República, que, a seu ver, atribuiu apenas à União, aos estados e ao Distrito Federal a tarefa de instituir e manter defensorias públicas. Em seu entendimento, se for prestado pelo poder público, o serviço de assistência judiciária gratuita deve ser implementado por meio da defensoria, que não se insere no âmbito de competência municipal.
Na avaliação do especialista em Segurança Pública e coronel da Reserva Remunerada da Polícia Militar do Espírito Santo Júlio Cezar Costa, “a decisão proferida pelo STF confirma a tendência de participação dos Municípios brasileiros no ambiente do Sistema de Justiça Criminal, principal e indiretamente no campo da prevenção terciária”.
(Com informações também do Portal do STF)