A Justiça do Estado do Espírito Santo acaba de condenar dois policiais militares pela acusação de ligação com quadrilha de traficantes do Morro São Benedito, em Vitória. Wemerson Barcelos Pinto e Márcio Roberto Ricardo, condenado s 12 anos de prisão em regime inicial fechado, também foram afastados de suas atividades por decisão judicial e ainda tiveram decretada a perda da função pública quando a sentença transitar em julgado.
Esta é a primeira condenação de militares desde que a Polícia Militar capixaba passou a ocupar o Complexo do Bairro da Penha, por causa da guerra do tráfico. O complexo é formado pelos Bairros da Penha, Itararé, Bonfim e São Benedito. A ação que desarticulou o grupo do qual os dois policiais são acusados de fazer parte se deu em maio de 2012, dois meses depois que a PM ocupou o Complexo do Bairro da Penha por ordem do governador Renato Casagrande.
Além dos dois militares, o juiz Ronaldo Domingues Almeida, da 7ª Vara Criminal de Vitória, condenou outros nove integrantes do grupo, inclusive o líder do tráfico da região, João de Andrade. São eles Cláudio Roberto de Almeida, Alessandra Souza, Márcia da Vitória, Wesley Barcelos Pinto, Vilmar Jesus da Silva, Paulo Wanderson Loureiro Alcântara, Ivan Machado Glicério e Anderson de Andrade Bento.
A quadrilha foi desarticulada por meio de investigação da Corregedoria Geral da Polícia Militar, Diretoria de Inteligência da PM e do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO). Os agentes e promotores de Justiça que participaram das investigações realizaram diversas interceptações de linhas telefônicas mediante autorização judicial, cujas conversas relevantes encontram-se registras nas mídias e degravações inclusas nos autos.
Na sentença, assinada no dia 26 deste mês, o juiz Ronaldo Domingues Almeida, informa que “depreende-se que a partir das notícias sobre a disputa entre grupos criminosos dos bairros São Benedito e Bairro da Penha, originou-se uma operação investigativa intitulada “Operação Perfídia”, em esforço conjunto com a Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social, da Diretoria de Inteligência, da Corregedoria da Polícia Militar e do Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado (GAECO) do Ministério Público Estadual, com o fim de apurar denúncias sobre uma suposta quadrilha que estaria praticando atividades ilícitas no Bairro São Benedito, Vitória/ES, contando, inclusive, com a participação de Policiais Militares.”
O magistrado prossegue: “Além disso, outra operação foi instaurada para apurar esquema de venda de drogas no Bairro da Penha, intitulada “Operação Asfixia”, também contribuiu com as investigações, revelando que em virtude da disputa pelo comando do tráfico na região do Bairro da Penha, alguns criminosos foram obrigados a abandonar suas pontos de venda (“bocas de fumo”) e se instalar no Bairro de São Benedito, associando-se a outros traficantes. A partir dos trabalhos de monitoramento telefônico, verificaram-se fortes indícios de que haveria um grupo na região de São Benedito voltado para a prática de diversas atividades criminosas, dentre as quais se destacavam tráfico de entorpecentes, comércio ilegal de armas e munições e partir das informações colhidas, a autoridade policial tomou conhecimento da viagem que foi realizada pelos acusados Cláudio Roberto e Márcia com destino a São Paulo, que culminou na prisão em flagrante de ambos quando de lá retornaram, pois teriam ido para fora do Espírito Santo trazer armas e drogas, com registro de que Márcia, em razão da idade e da própria condição física, foi a responsável pelo transporte da droga e dos demais apetrechos, isto é, seria uma pessoa do bairro e que assumiu a condição de “mula”, pois passaria despercebida pela autoridade policial e somente foi presa por conta da escuta.”
“Assim, apesar de Cláudio Roberto negar em Juízo o envolvimento com tráfico de ilícito de entorpecentes, bem como não admitir que entre ele e Márcia havia relação voltada para esse fim, a partir da instrução probatória conjugada com as interceptações telefônicas, é possível perceber a integração entre ambos, inclusive, com os demais réus deste processo. A propósito, consoante se registrará abaixo de forma mais percuciente, não se pode olvidar que ambos confessaram a prática dos crimes perante a autoridade policial e Márcia em Juízo apenas e tão somente negou o vínculo com Cláudio, mas admitiu que recebeu dinheiro para ir até São Paulo e trazer drogas e armas”, completou Ronaldo Domingues Almeida.
No que se refere aos policiais Márcio Roberto e Wemerson Barcelos,
“muito embora não se esteja decretando a prisão preventiva deles, pois a
situação deles é relativamente diversa daqueles aos quais se aplica a
medida cautelar extrema, não se pode admitir como sendo razoável que
agentes públicos condenados por crimes desta natureza continuem
exercendo suas funções, sobretudo no âmbito da Segurança Pública”, diz
trecho da sentença do juiz Ronaldo Almeida, que prossegue:
“De outra
sorte, nos termos do Art. 319, VI do CPP são medidas cautelares diversas
da prisão, dentre outras a suspensão do exercício de função pública ou
de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo
receio de sua utilização para a prática de infrações penais pelo que ao
invés de decretar a prisão destes dois réus, aplica-se a medida cautelar
de imediato afastamento de suas respectivas funções, inclusive com
recolhimento de eventual arma acautelada da Corporação, pois seria
temerário que agentes públicos com vínculos com a criminalidade desta
natureza e já condenados, ainda que sem trânsito em julgado, permaneçam
fardados e exercendo suas atividade de forma regular. A propósito, o
afastamento se presta, inclusive para preservar a imagem da Polícia como
Instituição e para preservar, sobretudo, a dignidade e incolumidade dos
demais militares, que saem as ruas dispostos a apenas e tão somente
servir o cidadão, postura que certamente assume a maioria absoluta da
tropa.”
O magistrado concluiu: “Por derradeiro, após o trânsito
em julgado, decreta-se aos acusados Márcio Roberto Ricardo e Wemerson
Barcelos a pena de perda do cargo de policial militar, pois conforme
consulta anexa, estes ainda integram aos quadros da Polícia Militar, em
vista de manifesta incompatibilidade do exercício desse mister com as
condutas ilícitas que restaram verificadas, pois é evidente que a
permanência dos réus na carreira militar, certamente destitui toda a
credibilidade da Instituição porque é inerente às funções do policial
militar coibir o tráfico de drogas, sendo inadmissível a manutenção de
traficantes nos quadros da polícia, face a possibilidade de reincidência
ou mesmo facilitação do tráfico.”
O que diz o juiz Ronaldo Domingues Almeida na sentença:
WEMERSON BARCELOS PINTO:
Crime previsto no artigo 33 caput da Lei 11.343/06 (Tráfico de drogas):
O acusado agiu com elevado grau de culpabilidade, uma vez que na condição de Policial Militar, violou dever inerente a suas funções, pois ao invés de garantir a incolumidade e a segurança dos moradores de São Benedito, militando contra o tráfico de drogas, se comportava de modo reverso, em prol da traficância, prevalecendo-se de função pública para conferir suporte aos líderes do grupo, ou seja, além da censurabilidade mediana do crime, pode se atribuir a ele culpabilidade extremada, principalmente porque possuía conhecimento da ilicitude de sua conduta, tendo por dever legal a repressão ao crime e não sua prática. Não há registro de antecedentes criminais em sua vida pregressa. Sua conduta social é irregular, pois valendo-se do cargo de Policial Militar praticou delito de tráfico de drogas, colocando em xeque a credibilidade de toda a Instituição, a quem incumbe a repressão de crimes e a garantia da segurança dos cidadãos, de modo a causar sentimento de repulsa a toda sociedade. Sua personalidade tem se inclinado para delinquência, pois embora exerça atividade laborativa, está se arriscando no mundo do crime. Os motivos do crime, em especial, o lucro fácil com a venda de drogas, são reprováveis. As circunstâncias em que o crime ocorreu lhes são contrárias, pois extrai-se dos autos que o acusado aproveitava de seu cargo para repassar informações privilegiadas para os líderes do grupo, contribuindo de forma ativa para o tráfico de drogas. As consequências do crime são graves, pois o tráfico de drogas causa sérios e irreversíveis problemas à saúde pública, além disso degrada por completo seio familiar, gera violência e alimenta a prática de outros tipos de crime, tais como roubos, furtos, homicídios. A vítima deste crime é toda a sociedade, razão pela qual não há que se falar em participação desta no evento. Assim, em razão das circunstâncias judiciais estabeleço como necessária e suficiente a pena base de 07 (sete) anos de reclusão.
Não há circunstância atenuante e nem agravante. Em relação à causa de diminuição de pena prevista no § 4º do artigo 33 da Lei nº 11.343/06, não há como reconhecê-la em favor do réu, pois o crime foi praticado em associação e organização criminosa, a qual fazia parte. Inexistem causas de aumento de pena, muito embora se pudesse falar em algumas das circunstâncias previstas no art. 40 da Norma de Regência.
Considerando as circunstâncias judiciais aferidas acima, bem como a situação econômica do acusado, fixo a pena de multa em 1300 (mil e trezentos) dias-multa, cada um no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data dos fatos narrados na denúncia.
Assim, fixo a pena em 07 (sete) anos de reclusão e 1300 (mil e trezentos) dias-multa, cada um no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data dos fatos narrados na denúncia.
Crime previsto no artigo 35 da Lei 11.343/06 (Associação ao tráfico): Fixo a pena em 04 (quatro) anos de reclusão e 100 (cem) dias-multa, cada um no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data dos fatos narrados na denúncia.
Crime previsto no artigo 288 do CP (Formação de quadrilha): Um ano de reclusão definitiva.
Em vista do disposto no artigo 69 do Código Penal unifico as penas em 12 (doze) anos de reclusão e 1400 (mil e quatrocentos) dias multa, cada um no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente a época do crime.
Em vista das circunstâncias judiciais, das penas aplicadas e da hediondez do crime de tráfico, fixo o regime fechado para o início do cumprimento da pena privativa de liberdade, nos termos do artigo 33, § 2º alínea “a” do Código Penal, devendo o Juízo da execução decidir sobre eventual direito a progressão, inclusive, unificar as penas impostas.
A pena de multa deverá ser paga na forma dos arts. 49 e 50, ambos do Código Penal.
MÁRCIO ROBERTO RICARDO:
Crime previsto no artigo 33 caput da Lei 11.343/06:
O acusado agiu com elevado grau de culpabilidade, uma vez que na condição de Policial Militar, violou dever inerente a suas funções, pois ao invés de garantir a incolumidade e a segurança dos moradores de São Benedito, militando contra o tráfico de drogas, este se comportava de modo reverso, em prol da traficância, prevalecendo-se de função pública para conferir suporte aos líderes do grupo, ou seja, além da censurabilidade mediana do crime, pode se atribuir a ele culpabilidade extremada, principalmente porque possuía conhecimento da ilicitude de sua conduta, tendo por dever legal a repressão ao crime e não sua prática. Não há registro de antecedentes criminais em sua vida pregressa. Sua conduta social é irregular, pois valendo-se do cargo de Policial Militar praticou delito de tráfico de drogas, colocando em xeque a credibilidade de toda a Instituição, a quem incumbe a repressão de crimes e a garantia da segurança dos cidadãos, de modo a causar sentimento de repulsa a toda sociedade. Sua personalidade tem se inclinado para delinquência, pois embora exerça atividade laborativa, está se arriscando no mundo do crime. Os motivos do crime, em especial, o lucro fácil com a venda de drogas, são reprováveis. As circunstâncias em que o crime ocorreu lhes são contrárias, pois extrai-se dos autos que o acusado aproveitava de seu cargo para repassar informações privilegiadas para os líderes do grupo, contribuindo de forma ativa para o tráfico de drogas. As consequências do crime são graves, pois o tráfico de drogas causa sérios e irreversíveis problemas à saúde pública, além disso degrada por completo seio familiar, gera violência e alimenta a prática de outros tipos de crime, tais como roubos, furtos, homicídios. A vítima deste crime é toda a sociedade, razão pela qual não há que se falar em participação desta no evento. Assim, em razão das circunstâncias judiciais estabeleço como necessária e suficiente a pena base de 07 (sete) anos de reclusão.
Não há circunstância atenuante e nem agravante. Em relação à causa de diminuição de pena prevista no § 4º do artigo 33 da Lei nº 11.343/06, não há como reconhecê-la em favor do réu, pois o crime foi praticado em associação e organização criminosa, a qual fazia parte. Inexistem causas de aumento de pena, muito embora se pudesse falar em algumas das circunstâncias previstas no art. 40 da Norma de Regência.
Considerando as circunstâncias judiciais aferidas acima, bem como a situação econômica do acusado, fixo a pena de multa em 1300 (mil e trezentos) dias-multa, cada um no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data dos fatos narrados na denúncia. Assim, fixo a pena em 07 (sete) anos de reclusão e 1300 (mil e trezentos) dias-multa, cada um no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data dos fatos narrados na denúncia.
Crime previsto no artigo 35 da Lei 11.343/06: Fixo a pena em 04 (quatro) anos de reclusão e 100 (cem) dias-multa, cada um no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente na data dos fatos narrados na denúncia.
Crime previsto no artigo 288 do CP: Um ano de reclusão definitiva.
Em vista do disposto no artigo 69 do Código Penal unifico as penas em 12 (doze) anos de reclusão e 1400 (mil e quatrocentos) dias multa, cada um no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente a época do crime.
CLÁUDIO ROBERTO DE ALMEIDA: 24 anos de reclusão e 2600 (dois mil e seiscentos) dias multa, cada um no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente a época do crime.
MÁRCIA DA VITÓRIA: 13 anos e seis meses de reclusão e 2100 (dois mil e cem) dias-multa, cada um no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente a época do crime.
ALESSANDRA SOUZA: Nove anos e seis meses de reclusão e 1200 (mil e duzentos) dias multa, cada um no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente a época do crime.
VILMAR JESUS DA SILVA: 24 anos de reclusão e 2600 (dois mil e seiscentos) dias multa, cada um no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente a época do crime.
ANDERSON DE ANDRADE BENTO: 20 anos de reclusão e 2500 (dois mil e quinhentos) dias multa, cada um no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente a época do crime.
IVAN MACHADO GLICÉRIO: 20 anos de reclusão e 2500 (dois mil quinhentos) dias multa, cada um no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente a época do crime.
JOÃO DE ANDRADE: 20 anos de reclusão e 2500 (dois mil e quinhentos) dias multa, cada um no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente a época do crime.
WESLEY BARCELOS PINTO: Nove anos de reclusão e 1200 (mil e duzentos) dias-multa, cada um no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente a época do crime.
PAULO WANDERSON: 24 anos de reclusão e 2600 (dois mil e setecentos) dias multa, cada um no valor de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente a época do crime.
Fonte: Sentença do processo de número 019031-18.2012.8.08.0024