No dia 27 de agosto de 2011 o Estado viveu um final de semana que as autoridades da área de segurança pública preferem chamar de “atípico”. Dados oficiais da própria polícia capixaba apontam que das 12h25 do dia 27 – sábado – até as 22h28 do mesmo dia foram registrados oito assassinatos no Espírito Santo.
Já a meia-noite em ponto do dia 28 de agosto a polícia registrou outro homicídio, dando início à escalada de violência. Até as 6h41 do dia 28, foram registrados mais três homicídios. Ou seja, num espaço inferior a 24 horas, foram 12 assassinatos.
Ainda no dia 28 de agosto à tarde, o governo do Estado promoveu o 1º Seminário de Gestão Aplicada às Instituições de Segurança e de Justiça do Espírito Santo, que levou quase 2 mil profissionais – policiais militares (praças e oficiais) e civis (investigadores e delegados), em sua maioria – ao Centro de Convenções de Vitória, no bairro Santa Lúcia.
Foram convocados para ouvir palestras feitas pelo secretário de Estado da Segurança Pública e Defesa Social, Henrique Herkenhoff; pelo diretor geral da Escola Nacional de Magistratura e juiz do Tribunal de Justiça do Paraná, Roberto Portugal Bacellar; e pelo psiquiatra, psicoterapeuta, cientista e escritor Augusto Cury.
O governador Renato Casagrande também deu uma canja, destacando, para os ouvintes, que o Espírito Santo já viveu um momento histórico “em que as instituições capixabas estiveram desacreditadas, tomadas por grupos que não respeitaram a ética, os cidadãos e os recursos públicos”.
Casagrande falou mais: disse que o Espírito Santo ainda tem “um longo caminho” a percorrer para levar qualidade de vida, oportunidades e segurança a todos os capixabas.
O governador tem razão: temos mesmo um longo caminho a percorrer. Senão, vejamos. O seminário teve sua importância didática, não há dúvida. Afinal, “o evento propôs o aprimoramento técnico-profissional dos integrantes das organizações de segurança pública, com a discussão de novas ferramentas de gestão que otimizem o gerenciamento e a aplicação dos recursos públicos (sejam eles materiais, humanos, técnicos e/ou financeiros), para que o Estado seja capaz de oferecer, à população, serviços de segurança e justiça de melhor qualidade”.
Teve palestras interessantes, como a do secretário da Segurança Pública, Henrique Herkenhoff, que abordou o tema “Os Desperdiçadores de Tempo”.
Aí é que entra a ironia do destino: enquanto cerca de 2 mil profissionais – a maioria policiais civis e militares – lotavam o Centro de Convenções, os assassinatos iam acontecendo na Grande Vitória e no interior. A escalada da violência começou exatamente, conforme registra a polícia, às 12h25 do dia 27 de agosto, num sábado.
Uma hora e oito minutos depois, outro assassinato. Mais um homicídio foi registrado às 14h30. Às 17h20, mais um crime com vítima fatal. Outro assassinato às 19h22 do dia 28 de agosto. A escalada da violência, antes da meia noite, só terminou às 19h58, quando foi o registrado o último assassinato dentro do que a polícia considerou dia 27 de agosto de 2011.
Embora o governador Renato Casagrande esteja fazendo um grande esforço para tentar arrumar a segurança pública, fica claro que as justificativas do passado predominam na hora de se encontrar uma explicação para a explosão da violência.
Na terça-feira, dia 31 de agosto, foi o próprio Henrique Herkenhoff quem declarou para a imprensa que o final de semana tinha sido atípico. Repetiu o mesmo discurso de um de seus antecessores, o hoje deputado estadual Rodney Miranda. É o tipo do discurso que não justifica nada e que só atemoriza a sociedade.
Enquanto nas ruas os homicídios iam sendo praticados, mais de 2 mil profissionais da área de segurança pública – policiais militares e civis, em sua maioria – estavam ouvindo palestras em um ambiente refrigerado. Ouviram o maior pregador da autoestimna do País, Augusto Cury, abordar o tema “Mentes Brilhantes – Excelência Emocional e Profissional”.
“O sucesso de um profissional apenas é conquistado quando o mesmo se apropria do seu ‘eu’ interior, responsável pelo ‘brilho interno’ do ser humano. O psíquico dos homens deve ser trabalhado para que se formem excelentes profissionais. Temos que proteger as emoções e reciclar cada pensamento perturbado por meio do eu interior”, ensinou Augusto Cury.
Já o secretário da Segurança Pública, Henrique Herkenhoff, abordou o tema “Os Desperdiçadores de Tempo”. Que os ensinamentos das palestras tenham, de fato, penetrado na mente dos profissionais da segurança pública e que as famílias capixabas – pais, esposas e filhos, que têm entes queridos sendo assassinados – não tenham mais um final de semana “atípico”.
E que a polícia capixaba não desperdice mais eu tempo: o lugar dela é nas ruas, protegendo a população.