A direção do Partido Liberal (PL) se reuniu, por cerca de quatro horas, na tarde de segunda-feira (24/11), em Brasília, para discutir estratégia depois da decisão da 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), que manteve a prisão preventiva do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Ele está preso desde sábado (22/11) na Superintendência da Polícia Federal em Brasília (DF).
A medida, adotada pelo ministro Alexandre de Moraes, substituiu a prisão domiciliar anteriormente imposta e foi tomada a pedido da Polícia Federal, que apresentou novos elementos indicando risco concreto de fuga e ameaça à ordem pública, especialmente diante da iminência do trânsito em julgado (fim da possibilidade de recursos) da condenação de Bolsonaro, na Ação Penal (AP) 2668, por crimes relacionados à tentativa de golpe de Estado.
No entanto, o que seria uma reunião entre amigos, se tornou numa espécie de lavagem de roupas sujas. O encontro teve broncas públicas entre os participantes, a escolha de um porta-voz oficial para o ex-presidente e momentos de reconciliação. Um dos alvos da família Bolsonaro foi o deputado capixaba federal Gilvan da Federal (PL). Ele foi citado nominalmente pela ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, por ter criticado a visita que quatro senadores bolsonaristas fizeram ao Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília.
A visita foi feita na terça-feira (18/11) passada e dela participaram a senadora Damares Alves (Republicanos-DF), Eduardo Girão (Novo-CE), Izalci Lucas (PL-DF) e Marcio Bittar (PL-AC). A intenção dos senadores era denunciar o estado da prisão que pode receber Bolsonaro a partir da execução da pena pela condenação na ação penal que julgou a tentativa de golpe.
Gilvan afirmou na ocasião ser “inadmissível” ver senadores admitindo a prisão do ex-presidente. Gilvan da Federal, considerado um vassalo da família Bolsonaro, disse no dia seguinte à visita à Papuda que a direita precisa “aprender” com a esquerda a ser mais unida, em referência aos protestos no período em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ficou preso em Curitiba:
“É inadmissível ver senadores admitindo a prisão do presidente Bolsonaro. Que crime ele cometeu? Temos um ditador no Brasil, que rasga a Constituição e que fecha o Congresso Nacional. Moraes, em uma canetada só, passa por cima de 513 deputados e 81 senadores. Jamais vou admitir a prisão de alguém inocente. Criaram uma narrativa de golpe e vamos, nós da direita, admitir a prisão?”, questionou o parlamentar.
Na reunião do PL de segunda-feira, entretanto, Michelle puxou a orelha dos colegas. Ela criticou as brigas e a “lavagem de roupa suja” em público que têm sido feitas nas últimas semanas, expondo fragilidades e desunião no bolsonarismo. Sobre Gilvan daFederal, Michelle argumentou que quem mais sofre pela prisão de Bolsonaro é ela, enquanto esposa, e que os correligionários precisam conversar a sós para lidar com insatisfações, em vez de expô-las na internet.
A ex-primeira-dama também afirmou que “reza pela vida e pela alma” do ministro Alexandre e Moraes, para que ele melhore e tenha mais juízo em suas decisões, e disse que, como cristã, não vai rezar para desejar o mal a ninguém.
O encontro de segunda-feira foi convocado pelo presidente do PL, Valdemar Costa Neto, para debater como realinhar a tropa em defesa de Bolsonaro. Pelo menos 50 parlamentares se reuniram num auditório da sede do partido por quase quatro horas.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) foi designado porta-voz do pai. Ficará sob sua responsabilidade, em alinhamento com os irmãos e a madrasta Michelle, repassar aos parlamentares as orientações do ex-presidente, preso numa cela especial na Superintendência Regional da Polícia Federal. Por ser filho, Flávio tem autorização para visitar Bolsonaro na PF, assim como costumava ir até o condomínio Solar de Brasília durante a prisão domiciliar. Moraes deu aval à ida do senador à superintendência na manhã desta terça-feira, 25, num horário marcado. O acesso ao ex-presidente e ao “mundo externo”, onde tem mandato e holofotes voltados para si, o cacifa à função.
Um deputado federal então perguntou a Flávio qual orientação os bolsonaristas deveriam seguir, uma vez que Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que se mudou para os Estados Unidos para trabalhar por sanções contra o STF, tem agido em dissonância com a atuação do PL em solo brasileiro.
“Isso vocês podem deixar que eu vou resolver”, respondeu Flávio.
O senador chegou a dar uma bronca pública no marqueteiro do PL, Duda Lima, sobre as inserções que a legenda tem promovido na TV, no rádio e na internet, convocando apoiadores a se filiarem. “Por que o meu pai não está nas inserções?”, questionou Flávio de cima do palco.
O encontro teve momentos de reconciliação. Michelle, que tem convivência difícil com os enteados, chamou Renan Bolsonaro ao palco ao fim do evento para a oração pelo ex-presidente. O vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ), por sua vez, rasgou elogios ao deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), que tem sido alvo de críticas da família Bolsonaro nos últimos meses.
Realinhamento de discurso e novo gás pela anistia
Na saída da reunião, o tom foi outro. Flávio e o senador Rogério Marinho (PL-RN) deram entrevista em que acusaram Moraes de intolerância religiosa e defenderam a retomada do projeto de lei da anistia no Congresso. Flávio afirmou que um eventual projeto de lei que foque na redução de penas dos condenados no 8 de janeiro não interessa ao PL. Mas os parlamentares defendem que a proposta seja primeiro colocada em votação para então se votar qual o texto a ser aprovado.
“Não abrimos mão de buscar isentar essas punições absurdas que estão sendo impostas a pessoas inocentes, ainda mais depois desse último ato de tirar o presidente Bolsonaro da prisão domiciliar com base em intolerância religiosa”, afirmou o senador.
A acusação de intolerância religiosa reside no fato de que Moraes embasou parte de sua decisão na convocação de uma vigília que o próprio senador convocou para a noite do sábado. O ministro entendeu que ela poderia provocar uma confusão que facilitaria uma eventual fuga de Bolsonaro.
“Eu fiz um chamado para orar pelo presidente Bolsonaro, pela sua saúde, por justiça. E de uma forma mirabolante nós vimos isso ser transformado, ser criminalizado. Fomos acusados de organização criminosa por querer exercer nosso direito ao culto. Que isso sirva de alerta a todas as lideranças religiosas deste País, que se não abrirem o olho agora amanhã será tarde demais”, disse Flávio.
