O juiz da 002ª Zona Eleitoral de Cachoeiro de Itapemirim, Roney Guerra, condenou o instituto de pesquisa eleitoral Leia Pesquisa & Marketing Ltda (antiga M.S.Passos Comunicação Ltda) ao pagamento de uma multa no valor de R$ 53.205,00 pela acusação de divulgar de maneira antecipada uma pesquisa que apontava a preferência do eleitorado para o cargo de prefeito daquele município, localizado no Sul do Espírito Santo. A pesquisa foi divulgada no ‘site’ Folha do ES, do jornalista e advogado Jackson Rangel, um dos capixabas investigados no âmbito dos Inquéritos que apuram a ação de milícias digitais e de atos contra a democracia, que tramitam no Supremo Tribunal Federal. A sanção aplicada, segundo o magistrado, está prevista no artigo 33, §3º, da Lei das Eleições c/c art. 17 da Resolução TSE nº23.600/2019. A multa, depois de paga, será revertida em favor do Fundo Partidário, nos termos do art.38, I, da Lei nº9.096/95, Resolução TSE nº21.975/2004 e Portaria TSE nº288/2005. A pedido do Ministério Público Eleitoral, o caso vai ser investigado também no âmbito criminal.
Na Representação 0600040-56.2024.6.08.0002, ajuizada pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), aduz que a pesquisa registrada sob número ES-05361/2024 não teria atendido os requisitos exigidos pela Resolução TSE nº 23.600/2019, tendo em vista a (i) ausência de mecanismo de controle interno, (ii) ausência de comprovação da origem dos recursos que custeiam a pesquisa e (iii) divergência no nome do profissional de Estatística responsável pela pesquisa e do profissional responsável pela empresa Leia Pesquisa e Marketing cadastrado no sítio eletrônico do Conselho Regional de Estatística do Espírito Santo e Minas Gerais.
Na Inicial, o PDT apontou supostas irregularidades na pesquisa. Por isso, pleiteou uma liminar para impedir a sua divulgação. A liminar, no entanto, foi indeferida pelo juiz Roney Guerra. O PDT apresentou, posteriormente, um pedido de reconsideração da decisão que indeferiu a liminar, noticiando ao Juízo Eleitoral que o site “Folha do ES” realizou a divulgação antecipada da pesquisa impugnada, em 21 de maio de 2024, a qual detinha a data prevista para divulgação o dia 22/05/2024. Novamente o pedido foi negado.
Na fundamentação da sentença, o juiz Roney Guerra destaca a importância da realização de pesquisas eleitorais, “desde que observada, por razões óbvias, a legislação de regência”. Trata-se, segundo ele, do processo de coleta da opinião dos eleitores de uma determinada região a englobar suas convicções de intenção de votos, opiniões sobre candidatos/ indivíduos envolvidos, dentre outros fatores. O magistrado observa, todavia, que, “preocupada com a lisura do processo eleitoral e até mesmo para propiciar a conferência de todos os dados estatísticos utilizados, a Justiça Eleitoral exige, por meio da Resolução nº 23.600/2019, que, a partir de 1º de janeiro de 2024, as entidades e empresas que realizarem pesquisas de opinião pública relativas às eleições ou aos candidatos, para conhecimento público, não divulguem a pesquisa eleitoral sem que antes elas sejam registradas no Tribunal Eleitoral ao qual compete fazer o registro dos candidatos.”
Ao analisar a Representação do PDT no quesito da ‘Divulgação Antecipada da Pesquisa’, o juiz Roney Guerra escreve na sentença que, em 22 de maio de 2024, os representantes do partido informam que a pesquisa ES-05361/2024 foi publicada no dia 21/05/2024, às 20:09h, pelo site “Folha do ES”. O juiz Roney Guerra ressalta ainda que o jornalista Jackson Rangel (Foto ao lado) anexou um vídeo na Representação em que “tenta demonstrar na prática a inconsistência alegada [pelo PDT], e por tratar-se de prova literalmente unilateral, sem o crivo do contraditório e da ampla defesa, não se mostra suficiente para comprovar a tese da representada.”
O magistrado prossegue: “A partir de todo o arcabouço probatório, a pesquisa foi registrada no dia 16/05/2024, a sua divulgação ocorreu em 21/05/2024, conforme certificado pelo cartório em ID 122238990, e consta do sistema de registro de pesquisa eleitoral – PesqEle, o dia 22/05/2024 como data inicial para a divulgação”. Informa que, nos termos do caput do art. 33 da Lei n° 9.504/97, “as entidades e empresas que realizarem pesquisas de opinião pública relativas às eleições ou aos candidatos, para conhecimento público, são obrigadas, para cada pesquisa, a registrar, junto à Justiça Eleitoral, até cinco dias antes da divulgação, as seguintes informações”.
O juiz Roney Guerra descreve o artigo 2°, caput e § 2°, da Resolução TSE n° 23.600/2019, que estabelece as normas para divulgação de pesquisa eleitorais. E conclui que, pelas regras, a contagem do quinquídio, in casu, começou no dia 17/05/2024, pois se exclui o dia do início (16/05/2024), e encerrou-se no dia 21/05/2024, porquanto se inclui o dia do vencimento. “Desse modo, a divulgação [da pesquisa questionada pelo PDT] seria possível somente a partir do dia 22/05/2024, conforme devidamente informado no sistema de registro de pesquisa do TSE – PesqEle, no histórico de alterações que segue anexo…Portanto, a consequência para a divulgação antecipada de pesquisa eleitoral, como bem pontuou o parecer ministerial, é a aplicação da multa prevista no art. 33, § 3º, da Lei n° 9.504/97. Na linha jurisprudencial, tal multa, embora se refira expressamente à divulgação de pesquisa sem o prévio registro, também é aplicada aos casos em que não foi observado o prazo de 5 (cinco) dias entre o registro e a efetiva propagação.”
O juiz Roney Guerra entendeu, no entanto, que não houve por parte do Leia Pesquisa/Folha do ES o crime de ‘Litigância de Ma-fé’. Para ele, a pena de litigância de má-fé não deve ser aplicada à parte que busca acesso à justiça, mesmo que seu pleito seja considerado improcedente, uma vez que a Constituição garante o direito de ação, desde que exercido sem abuso. E, na litigância temerária, a má-fé não é presumida, mas requer evidências satisfatórias não apenas de sua existência, mas também da caracterização do dano processual que a condenação prevista em lei busca compensar. Assim, não restou caracterizada, no caso em questão, a presença de litigância de má-fé devido à ausência dos elementos que caracterizam o dolo processual pela parte representante e à falta de prejuízo processual para a representada.”
O promotor de Justiça Eleitoral Jeferson Ribeiro Gonzaga solicitou ao juiz Roney Guerra que o caso seja levado à Polícia Federal, para a instauração de um Inquérito Policial para apurar se houve crime de fraudes por parte dos autores e divulgadores da pesquisa. O magistrado acolheu o pedido.
Saiba Mais
Dono do Folha do ES, Jackson Rangel foi preso juntamente com o vereador afastado Armando Fontoura Borges Filho, o Armandinho Fontoura (Vitória), o falso pastor Fabiano Oliveira e o radialista e microempresário Maxcione Pitangui de Abreu, no âmbito dos Inquéritos 4.781 (atos contra a democracia) e 4.828 (atuação de milícias digitais), ambos de relatoria do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, depois de uma Representação feita pela então procuradora-geral de Justiça do Estado, Luciana Andrade. O ministro Alexandre de Moraes converteu, em 18 de dezembro de 2023, a prisão dos quatro em liberdade provisória, mas com o uso de tornozeleira eletrônica. O deputado Capitão Assumção (PL), o ex-deputado Carlos Von advogado e advogado e empresário Gabriel Coimbra também foram alvos da mesma operação, mas não tiveram a prisão decretada.