A juíza auxiliar do Tribunal Regional Eleitoral do Estado do Espírito Santo (TRE/ES), Isabella Rossi Naumann Chaves, determinou ao candidato a ao governo capixaba pelo PL, Carlos Manato, a retirar propaganda eleitoral em suas redes sociais por disseminar mentiras ao chamar o governador e candidato à reeleição, Renato Casagrande (PSB), de “abortista” e “assassino de bebês. Na decisão tomada na noite de sexta-feira (28/10), o TRE determinou ainda que Manato removesse imediatamente propaganda que difama Casagrande com “fato sabidamente inverídico, com grave descontextualização e finalidade de vincular a figura do candidato ao cometimento do crime”, com multa de R$ 50 mil reais em caso de não cumprimento.
A empresa responsável pelas redes sociais em que Manato divulgou as informações mentirosas também foi intimada a retirar a propaganda eleitoral irregular em até 24 horas, com multa de R$ 100 mil. Na decisão, a Justiça Eleitoral informou que “não será tolerada a propaganda eleitoral que calunie, difame ou injurie qualquer pessoa, sendo ela candidata ou não, ficando assegurado o seu direito de intentar, inclusive, a Ação Penal condenatória e Ação Civil reparatória do dano que sofreu”.
Na ação, denominada de ‘Pedido de Direito de Resposta’, os advogados de Casagrande, Rodrigo Barcellos Gonçalves e Altamiro Thadeu Frontino Sobreiro, explicam que o candidato Manato busca divulgar que o governador é um “assassino de bebês”, propagando a ideia que cometeu ato ilícito em evento ocorrido em 2020 e amplamente divulgado pela imprensa
Manato vem explorando uma tragédia ocorrida em 2020 no Estado. No dia 17 de agosto daquele ano, uma menina de 10 anos de idade, que engravidou após ser estuprada pelo tio – o criminoso já está preso –, em São Mateus, passou por um procedimento e interrompeu a gravidez em um hospital de referência em Pernambuco. A gravidez foi revelada no dia 7 de agosto de 2020, quando a menina foi ao hospital, na cidade de São Mateus, se queixando de dores abominais. Ela relatou que começou a ser estuprada pelo próprio tio desde que tinha 6 anos e que não o denunciou porque era ameaçada.
O juiz da Vara da Infância e da Juventude de São Mateus, Antônio Moreira Fernandes, acolheu pedido do Ministério Público do estado do Espírito Santo e autorizou aborto. O magistrado determinou que a menina fosse submetida ao procedimento de melhor viabilidade para preservação de sua vida: “Seja pelo aborto ou interrupção da gestação por meio de parto normal imediato”. A menina teve que ir para Pernambuco porque o Hospital das Clínicas de Vitória, referência em realizar aborto em mulheres vítimas de estupro, não tinha condições técnicas para atender a menina, que corria risco de morte.
“Contudo, denota-se que os Representados (Carlos Manato e sua coligação) não apresentaram as informações necessárias sobre o caso em comento, o que evidencia, assim, grave ofensa à honra e a reputação do candidato ao governo estadual (Renato Casagrande)”, diz a defesa do governador.
Os advogados dizem ainda que o vídeo mentiroso produzido por Manato faz alusão a caso de interrupção da gestação decorrente do crime de estupro envolvendo criança ocorrido no ano de 2020 em São Mateus, com ampla repercussão nacional e internacional. “O Poder Judiciário determinou que o procedimento médico fosse providenciado pelo Poder Público Estadual, em estrito cumprimento à ordem judicial expedida pelo Juízo da Vara da Infância e Juventude daquele município, conforme declaração da Procuradoria Geral do Estado no bojo da Medida Protetiva n. 0003071-69.2020.8.08.0047, que tramitou sob segredo de Justiça, tendo como fundamento o permissivo legal contido no art. 128, I e II do Código Penal Brasileiro”, pontuam os advogados Rodrigo Gonçalves e Thadeu Sobreiro.
Ao analisar o Pedido de Reposta, a juíza eleitoral Isabella Rossi Naumann Chaves chama de “graves” os fatos mentirosos “advindos do vídeo veiculado concernem a imputações criminosas e desqualificadoras atinentes ao Representante (Renato Casagrande), quais sejam, denominando-o de ‘abortista’, eis que o ele teria alugado avião para levar uma criança e realizar aborto, bem como que o Representante deveria responder por referido crime.”
A magistrada entende que “há nos autos indevida descontextualização e adulteração dos fatos. Isso porque há decisão do Poder Judiciário que autorizou a interrupção da gravidez da criança de dez anos de idade a que faz referência o Representado (Manato) em sua propaganda negativa.” Verifica-se, segundo ela, que “o vídeo ora guerreado se apresenta como veículo de grande alcance, com manipulação de discurso e minuciosamente editado com a finalidade de vincular o candidato” Casagrande à prática criminosa do aborto, em flagrante descontextualização e inveracidade.”
Segundo a Justiça Eleitoral, “a publicação advém de interpretação plenamente desprovida de respaldo concreto, de modo que os termos ‘abortista’ e ‘assassino de bebês,’ ambos atribuídos ao candidato (Casagrande), decorrem de fatos sabidamente inverídicos e de narrativa espúria e manipulada, o que não pode ser tolerado por esta Corte Eleitoral.”
Ainda na decisão, a juíza Eleitoral Isabella Rossi Naumann Chaves ressalta que a divulgação de fato sabidamente inverídico, com grave descontextualização e aparente finalidade de vincular a figura do candidato Casagrande “ao cometimento de crime parece suficiente a configurar propaganda eleitoral negativa, na linha da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral, segundo a qual a configuração do ilícito pressupõe ato que, desqualificando pré-candidato, venha a macular sua honra ou a imagem ou divulgue fato sabidamente inverídico (AgR–REspe 0600016–43, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO).”
“Ora”, prossegue a magistrada, “a propaganda atrela o Representante (Renato Casagrande) a fatos que, mesmo em sede de juízo perfunctório, permitem se inferir gravíssima ofensa ao postulado da dignidade da pessoa humana e da higidez do processo eleitoral. Fere-se a dignidade da pessoa humana porque há clarividente vilipêndio da honra do candidato Representante que foi denominado de abortista e criminoso em total descompasso à realidade. Ofende-se à higidez do processo eleitoral porque a descontextualização alcança número considerável de eleitores, podendo ensejar desequilibro ao prélio eleitoral.”
A magistrada ensina que “a liberdade de expressão, como componente ínsito à consolidação do Estado Democrático de Direito, configura-se como postulado constitucional que permite a livre circulação de ideias, razão pela qual sua limitação deve acontecer apenas e tão somente na defesa da democracia, da dignidade da pessoa humana e nos limites do ordenamento jurídico, o que inclui a legislação eleitoral. Nessa toada, para que seja assegurado o direito à livre manifestação do pensamento e o direito de crítica, próprias do debate eleitoral, esta Justiça Eleitoral deve atuar de forma limitada, sendo-lhe possível cercear a propaganda eleitoral somente quando esta ofender a honra ou a imagem de quaisquer pessoas ou candidatos, ou quando divulgar fatos sabidamente inverídicos ou descontextualizados.”
Em outras palavras, explica a juíza Isabella Rossi Naumann Chaves, “não será tolerada a propaganda eleitoral que calunie, difame ou injurie qualquer pessoa, sendo ela candidata ou não, ficando assegurado o seu direito de intentar, inclusive, a Ação Penal condenatória e Ação Civil reparatória do dano que sofreu.”
A magistrada finaliza: “Repisa-se que a imputação de crime a candidato fere sua honra, conduta que é vedada pelo agente propagador, na forma do art. 22, X, da Resolução TSE nº 23.610/2019 e, em si mesmo, admitiria a ordem de suspensão da veiculação.”
“O potencial lesivo da mensagem é bastante elevado. Isso porque a propaganda negativa traduzida pela conexão entre conclusões descontextualizadas criam no imaginário do eleitor uma límpida descaracterização da candidatura, mormente a considerar a grande visibilidade da propaganda.”
“Nesse cenário, entende-se que os Representados devem se abster de divulgar o referido vídeo, mormente diante do caráter de descontextualização apresentado, que extrapola a livre manifestação do pensamento.”
“Portanto, após compulsar as provas trazidas com a inicial, cotejadas com as disposições legais e jurisprudenciais anteriormente registradas, conclui-se pela ocorrência de grave propaganda eleitoral negativa, em exercício de juízo perfunctório, situação que merece ser cerceada com urgência, para a proteção de direitos dos Representantes.”