O Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo proferiu decisão definitiva reconhecendo a ilegalidade da ordem de prisão do advogado Cristiano Caldeira Ramalho, por entender que os fatos que lhe foram imputados não passam de desavenças entre ele e seu sócio Geraldo Santana Machado. A ordem de prisão sequer chegou a ser cumprida e nem o advogado esteve foragido ou teve seu nome incluído na Interpol.
A prisão de Cristiano havia sido decretada pelo juiz da Vara Única de Ecoporanga, Bruno Fritoli Almeida, que acolheu pedido do delegado Gabriel Duarte Monteiro, que à época dos fatos atuava no Departamento Especializado de Investigações Criminais (Deic) da Polícia Civil, em Vitória. O magistrado decretou a prisão sem ouvir manifestação do Ministério Público do Estado do Espírito Santo.
Na data de 21 de maio de 2021, o Blog do Elimar Côrtes publicou reportagem noticiando que a Justiça havia decretado a prisão do advogado Cristiano Caldeira, acusado de desviar valores, fraudar documentos e ameaçar empresários. No dia 1º de junho, o desembargador Sérgio Bizzotto concedeu liminar a Cristiano, suspendendo, assim, o mandado de prisão que havia sido expedido pelo juiz Bruno Fritoli Almeida.
No dia 25 de agosto, à unanimidade, a 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça julgou o mérito do Habeas Corpus e confirmou a liminar, concedendo parcialmente a ordem a Cristiano Ramalho. O acórdão da decisão dos desembargadores foi publicado na última segunda-feira (30/08). O TJES publicou decisão definitiva, reconhecendo a ilegalidade da ordem de prisão por entender que os fatos que foram imputados ao advogado Cristiano não passam de desavenças entre sócios.
“Bom ficar claro que eu nunca fui advogado do Geraldo Machado. Sou sócio dele. Ele me convidou para entrar como sócio na empresa de granito, por conta de dificuldades financeiras. A briga judicial, portanto, versa sobre questões de sociedade. Entrei como sócio e ajudei a levantar a empresa. Quando o Geraldo Machado não precisou mais de mim, ele tentou me afastar. Eu nunca desviei um centavo da empresa e as provas periciais atestam isso. Fui vítima de uma perseguição e injustiça”, frisou Cristiano Caldeira.
“Na verdade, a ordem de prisão em face do doutor Cristino sequer chegou a ser cumprida, nem ele esteve foragido ou teve seu nome incluído na Interpol, como fora noticiado na matéria anteriormente publicada”, pontuou o advogado Clebson da Silveira, que representa o colega Cristino Caldeira.
Liminar já havia cassado a ordem de prisão
Em decisão liminar o TJES havia cassado a referida ordem de prisão antes de seu cumprimento e, agora, em decisão definitiva, o Tribunal reconheceu expressamente que o advogado Cristiano Caldeira era sócio de Geraldo Machado na GSM – empresa do ramo de granito –, tendo ele adquirido as cotas sociais do irmão de Geraldo, Bruno Machado, conforme comprovou por meio de documentos e mensagens eletrônicas, passando, assim, a qualidade de sócio nesta empresa e outras mais.
“O próprio Ministério Público Estadual, na pessoa do insigne promotor de Justiça Geraldo Abreu, não apresentou denúncia criminal na Justiça em face do advogado Cristiano por tais fatos, reconhecendo que nos autos do Inquérito Policial, onde sua prisão foi decretada, não haviam provas suficientes do que lhe estava sendo imputado, motivo pelo qual requereu a baixa do referido inquérito à Delegacia de Polícia”, explicou Clebson da Silveira.
“Ou seja, tanto o Tribunal de Justiça quanto o Ministério Público reconheceram que o decreto de prisão em desfavor de Cristiano Caldeira foi uma decisão afoita e indevida, sem qualquer embasamento legal e probatório, tanto que o Inquérito Policial não virou processo na Justiça, sendo baixado à delegacia!”, completou o advogado.
Pesou em favor do advogado Cristiano Caldeira a sua elevada reputação no meio jurídico e empresarial do Espírito Santo, gozando de boa estima por todos, tanto que já recebeu diversos títulos de cidadão honorário em níveis municipal e estadual.
Desembargador-relator não identificou fraudes por parte do sócio Cristiano Caldeira
Sobre o contrato de compra das cotas sociais da empresa GSM por parte de Cristiano, o Tribunal de Justiça não identificou fraude, pois, como observado no voto do relator do HC, o desembargador convocado Ezequiel Turíbio, o próprio Bruno Machado (dono das referidas cotas sociais) não nega que vendeu as suas cotas sociais para o advogado Cristiano Caldeira, tendo seu irmão Geraldo Machado plena ciência disso conforme espelhos de conversas (prints) apresentados por Dr. Cristiano à Justiça.
Também observou o Tribunal de Justiça que Bruno não teria qualquer motivo para prejudicar o irmão Geraldo, até porque não obteve nenhuma vantagem especial com tal negociação, inclusive ficando expressamente registrado no referido contrato de venda das suas cotas sociais que seu irmão Geraldo Machado permaneceria como único administrador da empresa GSM.
“Por óbvio, se Cristiano Caldeira quisesse fraudar a compra das cotas sociais da empresa GSM e assumir sua administração, como foi acusado, teria aproveitado esta oportunidade de alteração contratual para destituir Geraldo Machado como administrador da empresa; o que não ocorreu!”, afirmou o advogado Clebson da Silveira
Por fim, “em relação à débil acusação de ameaça” que teria sido feita por Cristiano ao empresário e sócio Geraldo Machado, o Tribunal de Justiça também não identificou nos autos do Inquérito Policial qualquer prova neste sentido, reiterando mais uma vez que a acusação não passava de mera desavença comercial entre sócios – tanto eram sócios que mantinham conta corrente bancária em conjunto como registrou o Tribunal.
“Geraldo tratava Cristiano como ‘sócio’ perante todos”, diz trecho do voto do desembargador
O delegado Gabriel Duarte Monteiro indiciou o advogado Cristiano Caldeira Ramalho. O voto do relator do Habeas Corpus, Ezequiel Turíbio, diz que, “conforme se extrai do Relatório da autoridade policial (fls. 65/85), instaurado a partir de Ofícios oriundos da Junta Comercial e de Notícias-crime apresentadas pelas vítimas, em apertada síntese, o paciente Cristiano Caldeira Ramalho, exercendo a função de diretor jurídico, financeiro e administrativo na empresa GSM Indústria Comércio Importação e Exportação LTDA, em conluio com os demais indiciados, teria arquitetado um golpe com intuito de obter vantagem patrimonial e lesar a vítima Geraldo, mediante diversas fraudes, inclusive falsificação de documentos. Narra-se que a vítima Geraldo era sócio majoritário da empresa, detendo 75% das cotas, enquanto seu irmão Bruno possuía 25% das cotas.”
Prossegue o voto do desembargador-relator: “Nessa linha, menciona-se que a defesa trouxe diversos espelhos de conversas (prints) em que Geraldo trata Cristiano como sócio, inclusive perante terceiros, bem como afirma a Bruno que é Cristiano quem estava comprando parte da empresa, mencionando, ainda, os mesmos termos de compra retratados no Contrato que se alega falso. É evidente que a veracidade e a legitimidade de tais elementos de prova precisam ser averiguadas no procedimento próprio, mas também não devem ser desconsideradas. Também há dados que demonstram que Geraldo sabia que seria utilizado o nome de Obede como comprador (“laranja” de Cristiano). Além disso, indica-se, nos autos (fl. 200), que Cristiano e Geraldo possuem uma conta conjunta no exterior, situação que reforça a tese de não ser Cristiano mero funcionário, mas sim sócio (de fato) de Geraldo.”
E mais: “A propósito, não há um ato do sócio majoritário da empresa (Geraldo) transferindo os poderes inerentes da administração e direção a Cristiano, formalidade natural ao âmbito empresarial, o que também indica que todo o relacionamento se deu na informalidade, sendo que, como visto, Geraldo tratava Cristiano como ‘sócio’ perante todos”.
Ezequiel Turíbio destaca que “até mesmo na alteração contratual supostamente fraudulenta, há uma Cláusula (Sexta) em que se afirma que a administração seria exercida unicamente por GERALDO. A meu sentir, tal cláusula protetiva ao sócio majoritário, em contrato supostamente forjado pelo minoritário, é aparentemente incompatível com a afirmação de que Cristiano pretendia ter controle da empresa”.
Ainda no voto, o desembargador Ezequiel Turíbio afirma que, “para além dessas ponderações, ainda que se assuma como verídica a versão trazida pela suposta vítima (Geraldo Machado), não se demonstrou risco concreto de que o paciente (Cristiano Ramalho) venha a praticar atos fraudulentos perante a empresa ou a destruir provas, uma vez que ele não está mais no controle da atividade, nem dos estabelecimentos empresariais, e o próprio ato supostamente fraudulento não tinha o condão de obtê-los.”
Desembargador viu “tom de reconciliação do que efetivamente ameaçador”
Quanto à alegação de ameaças – o grifo é do desembargador-relator –, “observa-se que a suposta correspondência recebida pela filha da vítima, contendo uma cartolina preta, endereçada a seu pai, não possui remetente (selo da Suíça), e as vítimas afirmaram não ter certeza de que o paciente seria de fato o autor.”
Além disso, afirma Ezequiel Turíbio, “o Relatório Policial relata que Cristiano teria enviado a um terceiro uma mensagem de celular destinada a Geraldo contendo ameaça contra a vítima e sua família (fls. 647/654 do IP). Porém, mesmo que seja comprovada a veracidade e a autoria da mensagem, depreende-se que o contexto geral apresenta mais um tom de reconciliação – ou até amedrontamento por parte do remetente –, do que efetivamente ameaçador.”
Nessa perspectiva, diz o desembargador, “entendo que, por ora, não subsistem os motivos ensejadores da medida cautelar restritiva da liberdade pessoal, merecendo maior aprofundamento probatório, o que se reforça com o entendimento do Ministério Público no sentido de que ainda não haveria substrato para oferecer Denúncia, requisitando diligências complementares básicas, tais como a oitiva dos indiciados”.
O Ministério Público devolveu os autos à Polícia Civil, pois Cristiano Ramalho e outros indiciados não foram ouvidos pala Autoridade Policial durante o Inquérito Policial.