O advogado André Luiz Moreira protocolou, na tarde desta terça-feira (25/08), Representação na Corregedoria da Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo em que solicita que seja instaurado Processo para Declaração de Conduta Incompatível com o Decoro Parlamentar e, ao final, seja aplicada a penalidade da perda do mandato do deputado estadual Lucínio Castelo de Assumção, cujo nome social é Capitão Assumção.
O pedido do advogado, reconhecido nacionalmente por seu profícuo trabalho na defesa dos direitos humanos e da cidadania, tem como base o Inquérito Policial que apurou o acidente automobilístico, ocorrido no dia 5 de janeiro de 2020 (num domingo de recesso legislativo por conta de férias), em que o deputado Capitão Assumção, dirigindo o Ford Focus SE AT 2.0, de cor preta, modelo ano 2018/2018, com placa PPY-0845, veículo oficial da Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo, atropelou e matou o motociclista Ernani Gomes da Silva.
O parlamentar alega que não teve culpa pelo acidente e que o motociclista teria invadido a contramão. Assumção foi indiciado pela Polícia Civil por homicídio culposo (quando não há intenção). O Ministério Público Estadual ainda não decidiu se denuncia ou não o deputado.
O acidente ocorreu na Rodovia ES 320, na pista de sentido Ecoporanga-Barra de São Francisco, quando o deputado Capitão Assumção voltava, acompanhado de sua esposa, Alda Márcia Vas de Araújo Casagrande Assumção, de uma de suas residências, situada em Ecoporanga. Alda Márcia estava de carona no carro da Assembleia Legislativa, o que é também proibido por lei, já que ela não é servidora da Casa.
Assumção, que dirigia o carro da Ales, atingiu a moto Honda CG 125 FAN KS, cor preta, modelo ano 2011/2011, placa OCX-3064, que estava no sentido contrário na mesma rodovia. O forte impacto da batida matou o motociclista na hora, embora, na ocasião, ele tenha sido levado por policiais militares para um hospital da região, onde, oficialmente, morreu.
Na Representação, o advogado André Moreira salienta que fotos do acidente, reproduzidas em diversos veículos de comunicação, registra o local em que o veículo oficial da Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo permaneceu após a colisão, ou seja, o ponto de repouso do veículo.
“Em que pese o Capitão Assumção ter afirmado reiteradamente que a colisão teria decorrido de culpa exclusiva da vítima, ou seja, que o motociclista teria invadido sua mão, não sendo possível evitar o acidente, a imagem sugere exatamente o oposto, qual seja, que o veículo oficial da Assembleia teria invadido a contramão de direção e atingido a moto, causando a morte do motociclista”, frisa o advogado. “Não é por menos que o deputado veio a ser indiciado por homicídio culposo”, completa André Moreira.
No entanto, sem aprofundar na análise da dinâmica da colisão, o advogado ressalta que, como de conhecimento público, eis que amplamente divulgado na imprensa, o deputado Capitão Assumção estava com a Carteira de Habilitação vencida há mais de dois anos, infração gravíssima nos termos do Artigo 162, IV do CTB, dirigindo um veículo oficial da Assembleia Legislativa, na única companhia de sua esposa, retornando para Vitória de Ecoporanga, onde também possui domicílio, num domingo à tarde, em franca utilização de bem público de forma indevida.
Em que pese ter afirmado, através de sua Assessora de Imprensa, que estaria em visita a suas bases, “como de costume”, e que, como se lê da reportagem de A Gazeta, estaria com assessores no veículo oficial da Assembleia Legislativa, o deputado, na verdade, estava somente com sua esposa no veículo oficial da Assembleia Legislativa, retornando para Vitória de uma de suas residências, em Ecoporanga.
De acordo com André Moreira, o uso de veículos de propriedade ou posse da Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo, como se lê no Ato nº 2008, de em 27 de janeiro de 2014, somente é permitido para uso exclusivo dos deputados para atividades de interesse público e vinculadas ao exercício do mandato.
Para ele, diante das evidências do uso inadequado de bem público, que restou utilizado não apenas para deslocamento para sua residência no interior, como também o da sua esposa, Alda Márcia, e com utilização de carteira de habilitação vencida há mais de dois anos, infração gravíssima nos termos do Artigo 162, IV do CTB, envolvendo-se em colisão que resultou – no mais grave – na morte de um cidadão e, ainda, destruiu patrimônio público, o deputado Capitão Assumção “violou o disposto no Art. 1º do ATO nº 2008, de em 27 de janeiro de 2014, nos Arts. 3º, II; 6º, § 3º e 294, §3º, II e III, do Regimento Interno da Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo, com QUEBRA DE DECORO PARLAMENTAR nos termos do Artigo 4º, V e IX do mesmo Regimento, devendo ser penalizado com PERDA DO MANDATO a teor do disposto no Art. 53, II, da Constituição Estadual, do Art. 6º, IV; 10, incisos I e II; 293, IV e 300, II, todos do já citado Regimento Interno, que desde já se requer”.
André Moreira lembra que a Constituição Estadual, em seu Art. 53, II, estabelece que perderá o mandato o parlamentar cujo comportamento for declarado incompatível com o decoro, segundo disposições materiais e processuais previstas no Regimento Interno da Casa: Art. 53. Perderá o mandato o Deputado: […] II – cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar; […] § 1° É incompatível com o decoro parlamentar, além dos casos definidos no regimento interno, o abuso das prerrogativas asseguradas ao Deputado ou a percepção de vantagens indevidas. § 2º Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será declarada pela Assembleia Legislativa, por maioria absoluta, mediante provocação da Mesa ou de partido político com representação na Casa, assegurada ampla defesa. § 3° Nos casos previstos nos incisos III, IV e V, a perda será declarada pela Mesa, de ofício, ou mediante provocação de qualquer Deputado ou de partido político com representação na Assembleia Legislativa.
“O uso de veículos de propriedade ou posse da Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo, como se lê no Art. 1º do ATO nº 2008, de em 27 de janeiro de 2014, somente é permitido para atividades de interesse público e vinculadas ao exercício do mandato: Art. 1º Fica estabelecido que os veículos oficiais disponibilizados aos parlamentares são de uso e responsabilidade exclusivos dos deputados, sendo a sua utilização permitida somente para atividades de interesse público e vinculadas ao exercício do mandato”, frisa o advogado na Representação.
Para André Moreira, a conduta do deputado Capitão Assumção, “além da violação aos dispositivos do Regimento Interno da Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo, também viola o princípio da moralidade administrativa previsto no caput do art. 37 da Constituição Federal, configurando ainda a ilegalidade prevista no §4º deste mesmo dispositivo, violando ainda os arts. 4º, 9º, IV, XII, 10, 11, I, da Lei nº 8.429/92, que tipifica os atos de improbidade administrativa”.
Para o advogado André Moreira, a moralidade administrativa é tema de alto valor cívico, ocupando na topologia da Constituição brasileira o lugar de Princípio da Administração Pública, ao lado da legalidade, publicidade, eficiência e impessoalidade. O §4º do mesmo dispositivo vincula ao princípio da moralidade à sanção de perda da função pública para o caso de conduta improba do agente público.
Segundo ele, a ação do deputado Capitão Assumção é lesiva ao erário, “importando em enriquecimento ilícito do parlamentar que utilizou do veículo – a serviço da administração – e do combustível pago com dinheiro público, para atender a demandas particulares, muito distantes do interesse público”.
Salienta o advogado: “A expressão vantagem patrimonial consignada no artigo 9º, caput, da Lei 8.429/92, não traduz apenas a ideia de vantagem econômica propriamente, mas, como acentua Marcelo Figueiredo, “o conceito legal de ‘vantagem patrimonial’ refere-se, inclusive, a aspectos da moralidade administrativa, ao fim visado pelo agente, à análise da licitude da conduta”. Assim, estando duplamente enquadrado no conceito estabelecido pelo artigo, tanto pelo seu critério financeiro direto quanto ao aspecto da moralidade administrativa”.
Portanto, pondera André Moreira, “a conduta do REPRESENTADO (deputado Capitão Assumção) configura ato de improbidade administrativa, mais ajustado à norma-tipo do art. 9º da Lei 8.429/92, conduta que é agravada ainda pelo fato do REPRESENTADO guiar veículo da administração com habilitação vencida e pelo resultado que importou na morte de um cidadão e na destruição do patrimônio do ente público, que estava em sua responsabilidade”.
Na sua Representação, André Moreira coleciona jurisprudências de cortes superiores, em que parlamentares perderam mandato por falta de decoro e por improbidade administrativa, ajudando, assim, em futura decisão por parte dos deputados que integram a Corregedoria da Assembleia Legislativa do Espírito Santo.
“As aplicações das penalidades administrativas por improbidade alcançam também os agentes políticos – como é o caso do REPRESENTADO (deputado Capitão Assumção) –, para os quais o uso do veículo oficial deve estar limitado ao uso no interesse público, não estando ‘incluídos passeios com a família fora do expediente, em fins de semana e feriados”, ensina André Moreira.
Nesse sentido, ela apresenta na Representação decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que reconheceu expressamente como ato de improbidade administrativa a utilização de veículo oficial para deslocamentos para residência no interior do Estado: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ARTIGOS 9 E 11 DA LEI Nº 8.429/92. DIRETOR PRESIDENTE DA CORAG. UTILIZAÇÃO DE VEÍCULO OFICIAL. DESLOCAMENTOS PARA RESIDÊNCIA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. ANÁLISE DO ELEMENTO SUBJETIVO. DOLO EVIDENCIADO. 1. Afastada prefacial de nulidade da sentença por ausência de fundamentação, ante a expressa referência à conduta dolosa como ensejadora da conduta de improbidade administrativa, além de terem sido analisados todos os pontos invocados pelas partes. 2. No mérito, a análise do ato apontado como de improbidade impõe a abordagem da existência do elemento subjetivo na conduta do agente público, ante a inexistência de possibilidade de se inferir a responsabilidade objetiva. 3. Para a configuração das condutas previstas nos artigos 9 e 11 da Lei nº 8.429/92 exige-se a demonstração da conduta dolosa, que restou evidenciada pela utilização de veículo público, sem autorização legal, para deslocamentos à residência do demandado no interior do Estado, com manipulação de dados constantes nos diários de bordo. 4. Hipótese não contemplada dentre as entidades previstas no inciso IX do art. 3º do Decreto nº 34.832/93. 5. Ausência de demonstração de conduta dolosa no tocante à ausência de… emplacamento de dois veículos como oficiais, a ensejar a responsabilidade pelo pagamento do IPVA. 6. Juros de mora a contar da citação, conforme art. 219 do CPC/73 e art. 405 do Código Civil. 7. Sentença de parcial procedência na origem. APELAÇÕES DESPROVIDAS. (Apelação Cível Nº 70066382482, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Antônio Vinícius Amaro da Silveira, Julgado em 19/09/2018). (TJ-RS – AC: 70066382482 RS, Relator: Antônio Vinícius Amaro da Silveira, Data de Julgamento: 19/09/2018, Quarta Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 18/10/2018)
Concluiu o doutor André Moreira:
“No caso dos autos, como já demonstrado, o REPRESENTADO (deputado Capitão Assumção) não apenas utilizou o veículo oficial da Assembleia Legislativa para deslocar-se para sua residência no interior, como o fez na exclusiva companhia de sua esposa e utilizando-se de carteira de habilitação vencida há mais de dois anos, infração gravíssima nos termos do Artigo 162, IV do CTB, praticando assim conduta ilegal e incompatível com a atuação como Parlamentar, conduta que configura, como já demonstrado, QUEBRA DE DECORO PARLAMENTAR nos termos do Artigo 4º, V e IX do mesmo Regimento e consequente PERDA DO MANDATO a teor do disposto no Art. 53, II, da Constituição Estadual, do Art. 6º, IV; 10, incisos I e II; 293, IV e 300, II, todos do já citado Regimento Interno”.
(Texto corrigido e atualizado às 21h13 do dia 25/08/2020)