O dia 8 de agosto de 1983 está marcado eternamente na Polícia Militar do Espírito Santo. Nesta data, começava o primeiro curso de uma turma de policiais feminina da Corporação. Foi o Curso de Formação de Sargentos. No início, muita luta, sobretudo, contra o preconceito. Luta que as Pioneiras venceram ao longo desses 37 anos.
Essas guerreiras foram conquistando espaços dentro da PM e fora da caserna. Algumas tiveram que abandonar a farda, mas nunca esqueceram das colegas que ficaram. Algumas mudaram de profissão, tornando-se promotoras de Justiça, juíza, policiais civis, advogadas, etc. Mas nunca abandonaram o charme e elegância que levaram para a Polícia Militar há 37 anos.
Todas as 67 meninas que fecharam o curso deixaram sua marca na Polícia Militar. Uma delas, entretanto, foi mais além: protagonizou o primeiro casamento entre um casal militar da história da PMES. Driblou, inclusive, o regulamento da época, cuja orientação era que o casamento entre casais de sexo oposto – sim, naquela ocasião jamais se admitiria o relacionamento fosse somente dentro do mesmo círculo hierárquico.
“Dentro das normas militares, a mulher pode casar, engravidar, ter o seu lar normalmente. Se o futuro marido for militar, ela deve respeitar a hierarquia: sargento casa com sargento. Caso contrário, será desligada da PM. Se quiser, pode escolher um civil. Não há restrições nesse sentido”, era o que dizia o regulamento.
Muita coisa mudou de 1983 até hoje, mas há certos aspectos que continuam em vigor na “lei castrense”. Por exemplo: para ser casar, o militar ainda tem que comunicar o fato ao seu superior.
Uma daquelas Pioneiras, entretanto, mudou a história. Trata-se da hoje capitã da Reserva Remunerada Acedina Maria de Souza, que, em 6 de dezembro de 1986 casou-se com o então capitão QOC Robinson Pereira de Souza, hoje coronel reformado por conta de problemas cardíacos.
“Falo com muito orgulho desse feito histórico. Formamos uma espécie de Casal Parada Dura: eu, sargento; e ele capitão. Foi emocionante a cerimônia de casamento, que contou a presença de colegas e até do comandante da época. Hoje, temos dois filhos”, comemora a capitã Ascendina.
Ela e o coronel Robisson têm dois filhos: o cirurgião dentista Nícolas e Mathias de Souza e Souza, formado em Gastronomia e pós em Gestão Empresarial. O filho dentista está no Rio de Janeiro, fazendo outro especialização na área médico-dentária.
Trinta e sete anos depois, a presença feminina na Polícia Militar capixaba é uma realidade. Seja nas atividades operacionais, administrativas, de saúde e até mesmo como musicista na Banda de Música da PM, lá estavam aquelas policiais que deram origem a essa história há 37 anos, marcando presença e conquistando cada vez mais espaço.
A turma, que se formou em junho de 1984, tinha 67 (uma delas, porém, pediu desligamento antes da conclusão do curso) policiais, que conquistaram patentes de tenente e até mesmo coronel. Foram atuantes tanto nos setores administrativos quanto no operacional. As atividades desempenhadas por elas, portanto, agregam valor a projetos, estratégias e ações necessárias para o bom desenvolvimento do trabalho entorno da segurança pública.
Quatro das sargentos se especializaram depois para atuar no Corpo de Bombeiros, de onde saíram para a Reserva Remunerada. Na época da implantação do Curso de Sargentos Feminino, o Corpo de Bombeiros era um Batalhão da PMES. Mais tarde, houve a separação.
Mulheres na PMES
A inserção da mulher na PMES ocorreu em 1983, quando, por meio do Decreto de 6 de maio de 1983, foi instituída a Companhia de Polícia Feminina. Em agosto do mesmo ano foi aberto o 1º Curso de Formação de Sargentos Femininos da PMES e, em junho de 1984, formaram-se 67 policiais femininas. O Decreto foi instituído pelo então governador do Estado, Gerson Camata.
Já em 1986 teve início a primeira turma de soldados femininas, que agregou mais 27 mulheres aos quadros da Corporação. As policiais femininas são atuantes em praticamente todos os setores da Corporação incluindo Batalhões, Companhias Independentes, unidades especializadas como o Batalhão de Missões Especiais (BME), a Ronda Ostensiva Tática Motorizada (Rotam), o Regimento de Polícia Montada (Rpmont), o Batalhão de Polícia de Trânsito (BPTran), o Batalhão de Polícia Ambiental (BPAmb) e, também, na Banda de Música da PMES.
Unidas, as Pioneiras fazem questão de comemorar todo ano o dia 8 de agosto. Elas participam de eventos que contribuem para uma sociedade melhor, como a realização de ajuda a entidades civis. Os encontros são constantes, mesmo após a aposentadoria.
Coronel Aurich ressalta a importância do casal Camata na chegada das Pioneiras à PMES
O hoje coronel Reformado Luiz Sérgio Aurich era, na época da implantação do primeiro Curso de Formação de Sargentos Feminino, chefe da PM-3, seção do Estado Maior da PMES responsável pelo planejamento dos assuntos relativos à articulação operacional e à administração. Coube a ele a tarefa de ir a São Paulo conhecer como era a presença das mulheres na PM paulista.
Segundo o coronel Aurich, o grande responsável pela presença da mulher na Polícia Militar capixaba foi o então governador do Estado, Gerson Camata, e sua esposa, a primeira-dama Rita Camata:
“A presença da mulher na PMES deveu-se à determinação da então esposa do governador Camata. Rita Camata defendeu o ingresso das mulheres na PM e aprovou junto ao marido. Com o preconceito ainda forte na época, exigiu-se ingressar como 3o sargento. Fui eu, como PM/3, que estive em São Paulo, onde, com a fusão da Força Pública com a Guarda Civil, nasceu a PMSP e foram incorporadas às mulheres da Guarda. Fui o responsável pela condução do concurso público. Realmente, essas mulheres fizeram a diferença”, elogia o coronel Aurich.
Saiba Mais
Das 66 Pioneiras que concluíram o Curso de Formação de Sargentos, 42 se aposentaram na PMES e 04 no Corpo de Bombeiros, a maioria como Capitães QOA; uma pediu desligamento durante o curso; uma faleceu por acidente automobilístico; e 20 migraram para outras profissões, sem no entanto, perderem o contato.
Elas se reúnem constantemente e mantêm o vínculo de amizade, sob o lema “Amigas Para Sempre.”
Pediu desligamento do CFS Feminino: Carla Pedroni.
04 Foram para o Corpo de Bombeiros Militar: Antonina, Lourdes, Márcia e Rosane Guzzo.
Foi para o Tribunal de Justiça: Juíza Janete Pantaleão.
Três fizeram Curso de Formação de Oficiais na PM de Minas Gerais: Sônia Grobério, Josette e Margareth Carreta (in memorian – acidente automobilistico).
Duas foram para o Ministério Público Estadual: Maria Auxiliadora Freire (procuradora de Justiça) e Kátia Gujawnski (promotora de Justiça). Ambas já aposentadas.
Três são serventuárias da Justiça: Maristela Valandro, Cirleide Scárdua e Gilma Hertel.
Uma é advogada militante: Verônica Cordeiro
Duas são policiais civis: Débora Coutinho e Nicemara Jagger.
Procuradora Municipal: Dione De Nadai
10 em atividades diversas: Benícia, Evânia, Luzia, Carla, Michela, Eliane, Nilcéia Lima, Nilcéia Leal, Levina, Leila, Marlúcia.
Nota do editor:
Vai aqui um testemunho histórico. No dia 7 de agosto de 1983, um dia antes das Pioneiras iniciarem o Curso de Formação de Sargentos, o titular deste Blog, o jornalista Elimar Côrtes, dava início a sua trajetória no Jornalismo. Foi como repórter esportivo, da Rádio Capixaba, na transmissão de um jogo do Campeonato Capixaba, entre Desportiva e Ibiraçu, vencido pela Tiva, por 2 a 1. A narração da partida foi do Dárcio Campagnoli, comentário do saudoso Jorge Reis, o eterno Goleiro Recordista do Rio Branco.
Talvez essa coincidência explique uma ligação quase umbilical com essas meninas, cuja maioria eu ainda não conheço pessoalmente – só de nome –, mas nutro uma eterna admiração e gratidão.
Parabéns, Pioneiras – mesmo aquelas que não concluíram o curso ou que deixaram a profissão, depois de formadas, para seguir outra carreira –, por suas entregas, profissionalismo e por levar a alma, a competência e, sobretudo, a sabedoria e o chame femininos à Polícia Militar do Estado do Espírito Santo.