Início da madrugada do dia 21 de dezembro de 2012. As amigas Rafaela Dondoni Mendes e Tatiane Barbosa Soares são sequestradas de dentro de casa, no bairro Vila Prudêncio, em Cariacica, por quatro homens. Foram colocadas no porta-malas de um carro, onde entraram três dos sequestradores. O quarto criminoso estava em uma moto Honda Twister.
Logo em seguida, Rafaela e Tatiane são executadas, com tiros de pistola, à margem da Rodovia do Contorno, alguns quilômetros de onde foram sequestradas.
Rafaela e Tatiane foram julgadas por um grupo de extermínio, que agia em Cariacica e em outros bairros da Grande Vitória, simplesmente porque eram mulheres e negras. Foram vítimas de ódio racial e de gênero.
Oito anos depois desse duplo assassinato, a Polícia Civil e o Ministério Público do Estado do Espírito Santo ainda têm dificuldades para descobrir quem são os assassinos, apesar de algumas evidências levarem aos executores.
Dois anos antes de ser morta, Rafaela, que trabalhava numa churrascaria localizada na avenida Beira-Mar, em Bento Ferreira, Vitória, foi agredida brutalmente por seu ex-companheiro – na época, um cobrador de ônibus. Motivo: Rafaela se recusou a emprestar sua motocicleta ao ex-marido.
Um dos assassinos de Rafaela e de Tatiane usou uma moto par ajudar a levar as jovens ao local da execução. Ele abandonou a moto no local ao ouvir a sirene de viaturas de policiais rodoviários federais, que ouviram o barulho dos tiros e se dirigiram para o local.
A moto foi recolhida pela Delegacia de Crimes contra a Vida de Cariacica. A Polícia Civil conseguiu localizar o dono da moto Honda Twister,no bairro Vila Prudêncio, onde Rafaela e Tatiane foram sequestradas.
O dono do veículo mentiu para os policiais civis, dizendo que havia vendido a moto há mais de um ano. Na verdade, ele emprestou a moto a um dos assassinos e a Polícia Civil não se aprofundando na investigação.
No dia 22 de maio de 2010, Rafaela Dondoni estava em casa, em Vila Prudêncio. Seu ex-marido chegou na residência e pediu a moto da jovem emprestada. Ele tinha o costume de pegar a moto da ex-mulher e emprestar para bandidos da região, que utilizavam o veículo para praticar assassinatos.
Rafaela já estava suspeitando da conivência do ex-marido com o grupo de extermínio que agia na região. Decidiu não emprestar mais a moto. Resultado: neste dia 22 de maio de 2010, ela foi agredida pelo ex-marido com socos, tapas e chutes.
Teve lesões no pescoço, mãos e pés, conforme Boletim de Ocorrência número 9956267. Apesar de todas as marcas da violência, a 4ª Delegacia Regional de Cariacica, na época, registrou o fato como “lesão corporal leve”.
Embora Rafaela tenha registrado Boletim de Ocorrência da agressão em 22 de maio de 2010, a Polícia Civil nunca concluiu o caso. Ou melhor, em outubro de 2013, três anos e cinco meses após as agressões e quase um ano depois da execução sumária da moça, a Delegacia Especializada Atendimento à Mulher de Cariacica pediu o arquivamento do inquérito.
O Ministério Público Estadual também manifestou pelo arquivamento e o juiz Fernando Augusto de Mendonça Rosa, da 5ª Criminal (Violência Doméstica de Cariacica), acolheu o pedido.
Na quinta-feira (23/07), o Blog do Elimar Côrtes enviou à Polícia Civil e ao Ministério Público do Estado do Espírito Santo pedidos de informações a respeito da investigação do assassinato de Rafaela Dondoni Mendes e Tatiane Barbosa Soares.
Por meio de Assessoria de Imprensa da Secretaria de Estado da Segurança Pública e Defesa social (Sesp), a Delegacia Especializada de Homicídios e Proteção à Mulher (DHPM) disse que “a Polícia Civil informa que o caso segue sob investigação na Delegacia Especializada de Homicídios e Proteção à Mulher (DHPM). Não houve, até o momento, nenhum suspeito detido. Detalhes sobre a linha de investigação e outras informações não serão repassadas para preservar a investigação”.
E prossegue a nota: “Sobre a solicitação de entrevista, infelizmente a delegada da DHPM não está disponível. Informações sobre o caso podem ser repassadas para os investigadores…Denúncias anônimas podem ser repassadas através do Disque-Denúncia 181, que também possui um site onde é possível anexar imagens e vídeos de ações criminosas, o disquedenuncia181.es.gov.br. O anonimato é garantido e todas as informações fornecidas são investigadas”.
De acordo com o Portal do Tribunal de Justiça, o Inquérito Policial número 0008288-48.2013.8.08.0012 está parado desde o dia 12 de março de 2018. Nesta data, os autos foram encaminhados à Delegacia Especializada de Homicídios e Proteção à Mulher para o prosseguimento de diligências.
O Ministério Público Estadual, por sua vez, não respondeu a demanda do Blog do Elimar Côrtes até o momento desta postagem. O caso, no MPES, está sob a responsabilidade do 15º Promotor de Justiça Criminal. No MPES, a última movimentação do procedimento foi no longínquo 18 de abril de 2017, segundo o Gampes.
Na ocasião, a Polícia Civil chegou a insinuar para a imprensa que Rafaela e Tatiane teriam sido mortas por conta de envolvimento com o tráfico de drogas, o que não é verdade. Insinuou, inclusive, que Rafaela seria prostituta, outra inverdade. Mesmo que a moça se enquadrasse nas duas situações, nada justifica o assassinato e nem tão pouco a demora da Polícia Civil em elucidar o caso.
A Polícia Civil poderia buscar o Boletim de Ocorrência que registra as agressões sofridas por Rafaela e confrontar com as sequências dos fatos. Em Vila Prudêncio, há quem acredite que as duas amigas foram mortas a mando do ex-marido de Rafaela. O ex-marido é amigo de um dos supostos assassinos.
O dono da moto, utilizada por um dos assassinos, tem que ser ouvido de novo – caso, é claro, não tenha sido morto como queima de arquivo.
Se concluir o inquérito desse duplo homicídio, a Polícia Civil poderá chegar aos assassinos – alguns estão em plena atividade profissional – e poderá descobrir a existência de um grupo de extermínio que vem (ou vinha) agindo desde o início dos anos 2000 na Grande Vitória.
Assassinos que agiam impunemente, como fizeram com Rafaela e Tatiane, executadas a tiros por contra do ódio dos assassinos.