Quatro dias depois de sofrer uma derrota no Tribunal de Justiça, o deputado estadual Lucínio Castelo de Assumção, conhecido como Capitão Assumção (Patriotas), desafiou uma ordem judicial, gravando um vídeo em que acusa o Judiciário de promover censura e de novo promove ataques com ofensas o governador Renato Casagrande (PSB).
Na última quinta-feira (23/04), o Tribunal de Justiça do Espírito Santo reverteu decisão de primeiro grau, para conceder liminar favorável a Casagrande: o desembargador Robson Albanez determinou o deputado Capitão Assumção a retirar também de suas redes sociais acusações “infundadas”, segundo o magistrado, contra o governador.
Inicialmente, Assumção cumpriu a ordem. Todavia, na segunda-feira (28/04), ele postou um vídeo em suas redes sociais em que afronta o Judiciário capixaba e volta a chamar o governador Renato Casagrande (PSB) de “ladrão”. No vídeo, Assumção fica em silêncio, mas apresenta mensagens em folhas de papel ofício em que novamente repete termos anteriores que culminaram na concessão da liminar em favor de Casagrande. No mesmo vídeo, ele diz ter sido censurado pela Justiça.
Desta vez, Capitão Assumção se deu mal: em um único dia, a Justiça voltou a obrigar o parlamentar a apagar postagens ofensivas ao governador e a retirar também das redes sociais o vídeo que ele gravou e postou na segunda-feira (28/04).
Somente no mês de abril, Renato Casagrande impetrou, na condição de Pessoa Física – cidadão comum –, duas Ações de Indenização por Danos Morais c/c Pedido Liminar em desfavor do deputado Assumção. As ações são assinadas pela advogada Mariane Porto do Sacramento. A primeira ação, de número 0007279-68.2020.8.08.0024, tramita na 6ª Vara Cível de Vitória. Liminar foi deferida pelo Tribunal de Justiça, depois de negada no âmbito do primeiro grau.
A segunda ação é de número 0007459-84.2020.8.08.0024 e tramita na 3ª Vara Cível de Vitória. Esta liminar, impetrada na última sexta-feira (24/04), foi concedida a tarde de segunda-feira (28/04) pelo juiz Jaime Ferreira Abreu.
Nesta segunda ação, o governador Renato Casagrande pediu que o réu (Capitão Assumção) excluísse “a postagem inverídica e difamatória sobre o Autor (Casagrande) de suas redes sociais Facebook e Instagram.”
Os posts consistem na mesma montagem, com a foto do governador ao lado de uma imagem de um anúncio de uma tenda piramidal 10×10 pelo valor de R$ 5.999,00, com os dizeres “Roubando na cara dura!”, “eu sou ladrão e vacilão” escrito sobre a testa do autor (governador), e abaixo das imagens o texto “Governador Casagrande aluga, sem licitação, 60 tendas por 20 mil/mês cada uma. Na internet a mesma tenda é vendida por 5.999. Valor do contrato 1 MILHÃO E 200 MIL REAIS.”
Renato Casagrande explica que a compra insinuada pelo deputado não foi feita e que esse tipo de ato não passa pelo seu crivo, sendo no caso específico de competência da Secretária de Saúde, “configurando-se aí a inverdade do post, caracterizada nídida a injúria ao se fazer a acusação de corrupção.”
Para a defesa de Casagrande, o falso conteúdo veiculado pelo deputado Assumção causou sérios prejuízos à sua imagem de homem público. E defende ainda que tais postagens não foram realizadas no exercício da função parlamentar, não havendo que se falar em imunidade parlamentar nesse caso, notadamente por se tratar de ofensas pessoais lançadas fora de Plenário.
De acordo com o juiz Jaime Ferreira Abreu, “pela simples leitura das postagens do instagram e facebook do réu, conforme URL’s indicadas, extrai-se o conteúdo injurioso ao autor, nos exatos moldes da inicial.” Na avaliação do magistrado, “o ataque” promovido pelo deputado Capitão Assumção “denota prática de corrupção pelo demandante (Casagrande), qual seja, contratação sem licitação e superfaturada, prática, inclusive, que configura crime em tese.”
O juiz Jaime Ferreira Abreu pondera: “Ocorre que a referida contratação não é ato de competência do Chefe do Executivo, mas sim do Secretário de Saúde (art. 15, IV da CE c/c art. 46, m, da Lei n.º 3.043/75), já que as tendas foram alugadas pela referida Secretaria para utilização nas barreiras sanitárias que vem sendo instaladas no Estado. Neste tocante, não é demais frisar que cabe ao Secretário de Saúde gerir os recursos da pasta da saúde. Ademais, o momento atual justifica a contratação em regime de urgência, sem licitação, ante da pandemia por COVID-19, sendo diverso o procedimento para contratação nesta hipótese.”
O magistrado ainda ensina: “Ressalte-se que os meios legais para apuração de eventual ato delituoso são outros, não havendo no momento instauração de Comissão Especial de Investigação sobre a referida contratação, de modo que sequer se verifica relação entre a atuação parlamentar do réu e as referidas postagens.”
Portanto, diz o juiz Jaime Ferreira Abreu da decisão, “num juízo de cognição sumária, verificando-se que o ato supostamente ilícito imputado ao Autor (Renato Casagrande) sequer é de sua competência, bem como que o réu (Capitão Assumção) se valeu de redes sociais para imputar ato de corrupção ao demandante sem relação com sua função parlamentar, entendo que o fato não encontra proteção na Constituição, sob o manto da Imunidade Parlamentar.”
Para o magistrado, “excluída tal hipótese, frise-se que a liberdade de expressão dos cidadãos em geral não pode ser exercida com abuso, de modo a lesar a honra objetiva dos demais, sob pena de configurar ato ilícito. Tal, por sua vez, está evidentemente ocorrendo no caso dos autos, já que o Réu circulou na rede social em questão uma informação inverídica e no mínimo injuriosa.”
Por isso, salienta, “provados os elementos que justificam a antecipação da tutela, ressalte-se que a urgência é clara, ante o risco de agravamento dos danos ao Autor.”. O juiz fixou multa diária de R$ 2.000,00 em caso de descumprimento por parte de Assumção.
No mesmo dia, a advogada do governador, Mariane Porto, peticionou no mesmo Juízo um aditamento à inicial para incluir no pedido mais uma postagem do réu em suas redes sociais Facebook e Instagram, postulando que sejam igualmente removidas diante de seu conteúdo, que imputa a Renato Casagrande a conduta ilícita de “ladrão”.
O juiz Jaime Ferreira Abreu analisou o pleito e concedeu a medida. Segundo ele, da visualização das postagens em questão é possível verificar que, de fato, o réu imputa ao autor a conduta de ladrão (“LADRÃO!” e “Vá roubar no inferno!”), sem qualquer contexto que vincule tal à sua atividade parlamentar. “Além disso, é notório que o autor (Casagrande) não possui condenação em crimes desta natureza, sendo, portanto, no mínimo injuriosa a imputação”, pontua o magistrado.
“Assim, sem maiores delongas, acolho a emenda à inicial e integro a decisão antecipatória proferida, sob os mesmos fundamentos que pontuaram a presença de todos os requisitos legais do art. 300 do NCPC, para determinar ao réu a exclusão das postagens em questão, identificadas nos links abaixo, sob pena da multa já arbitrada, devendo ainda ser intimado o FACEBOOK do inteiro teor desta decisão para os devidos fins”.