Ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e ex-ministro da Justiça e de Defesa e três governos distintos, o jurista Nélson Jobim disse nesta quinta-feira (19/09) em Vitória que a insegurança jurídica do País e a “verborragia” do presidente Jair Bolsonaro são, atualmente, os principais entraves para que empresários estrangeiros voltem a investir no Brasil. A insegurança jurídica, segundo ele, é provocada por leis ambíguas aprovadas pelo Congresso.
As declarações de Nélson Jobim foram feitas durante palestra que ele proferiu dentro do Ciclo de Palestres do Banestes, no Palácio Anchieta. Jobim foi o primeiro convidado do banco estatal dentre outros que virão à capital capixaba nos próximos dias.
Para Jobim, o crescimento econômico está relacionado ao bom ambiente de negócios. “Todo investidor avalia a possibilidade do risco dos seus investimentos”, ponderou.
“O crescimento econômico depende da segurança jurídica, pois depende dos resultados e investimentos. Você não pode ter surpresa. Ou seja, quanto mais tiver risco de insegurança, maior será o custo desse investimento em detrimento ao próprio País. Creio que é necessário enfrentar essa insegurança que decorre, grande parte dela, da disfuncionalidade existente do Poder Legislativo, do Poder Executivo e do Poder Judiciário”, afirmou o ex-ministro.
Nélson Jobim foi deputado federal pelo Rio Grande do Sul para a legislatura 1987/1991. Sempre pelo PMDB (hoje MDB), foi reeleito deputado federal para o período 1991/1995. Exerceu o cargo de ministro da Justiça, de 1º de janeiro de 1995 a 7 de abril de 1997, no governo do presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB).
Nélson Jobim, que iniciou a carreira profissional como advogado – é considerado um dos mais renomados juristas do País –, foi nomeado ministro do Supremo Tribunal Federal, em 7 de abril de 1997, pelo então presidente FHC. Presidiu o STF de junho de 2004 a março de 2006, quando decidiu se aposentar voluntariamente. Um ano depois, voltou à política, assumindo, em 25 de julho de 2007 o cargo de ministro da Defesa do governo petista de Lupis Inácio Lula da Silva . Foi confirmado no cargo pela presidente Dilma Rousseff (PT), onde ficou até 4 de agosto de 2011. Atualmente, Nelson Jobim é diretor de Relações Institucionais e Políticas de Compliance e presidente do Conselho de Administração do BTG/Pactual.
Foi com base nessa vasta experiência político-jurídica que o jurista Nélson Jobim explicou para diretores do Banestes, secretários de Estado e para o governador Renato Casagrande, presente na palestra desta quinta-feira, porque o País travessa hoje uma grande instabilidade.
Antes de entrar em detalhes maiores, o ex-político ensinou que, em política, a primeira regra é a de que não se pode mudar o interlocutor. Explicou que, para mudar o País, primeiro é necessário entender que os políticos foram eleitos legitimamente e, por isso, são os interlocutores da sociedade no Congresso.
As segunda regra, de acordo com Jobim, foi ensinada pelo deputado federal Ulysses Guimarães:
“O doutor Ulysses dizia que, em política, até a raiva é combinada. Só que agra entrou um ingrediente novo: o ódio, que passou a formar consenso. Como, então, se constrói uma decisão majoritária, no Parlamento, se o diálogo está destruído? Esse ódio acaba refletindo na aprovação de leis ambíguas, o que provoca a insegurança jurídica em que vivemos. E essa insegurança legislativa criou o legislador-supletivo, que é Supremo”.
De acordo com Nélson Jobim, o STF acaba tendo que fazer interpretações de leis ambíguas aprovadas pelo Congresso, o que gera incertezas nos mercados econômicos. Cria-se, então, o que ele chama de “imprevisibilidade”.
Ele citou também que o Judiciário brasileiro carece de conhecimento macro das legislações econômicas aprovadas pelos parlamentares.
“A falta de conhecimento da Justiça gera insegurança. O Judiciário toma decisões levando em conta os reflexos econômicos e sociais. A economia brasileira deixa de ser competitiva por causa da imprevisibilidade”.
Jobim também criticou os exageros cometidos pelo presidente Jair Bolsonaro nas falas, chamando de “verborragia muito forte do chefe da Nação”. Porém, elogiou o ministro da Economia, Paulo Guedes.
“Temos um ministro muito competente no governo federal, mas a verborragia do chefe do governo afasta os investidores, que têm certa dificuldade e vir para o Brasil, mesmo com nossas taxas de juros estão a 5% e na Europa, por exemplo, abaixo de zero. Por que os investidores não vêm para o Brasil? Por causa da insegurança jurídica e a insegurança política”.
Em meio às incertezas do País, no entanto, Nélson Jobim elogiou a política fiscal do Espírito Santo, iniciada em 2012, no primeiro governo de Rebato Casagrande. Também ressaltou a importância do Fundo Soberano, criado por Casagrande agora em 2019, para investir no desenvolvimento econômico do Estado com recursos do petróleo:
“A situação fiscal do Espírito Santo é muito diferente dos demais Estados do País. Situação extraordinária. Também considero correta a criação do Fundo Soberano, porque, se os recursos do petróleo forem para o caixa normal do Estado, logo seriam consumidos pela despesas correntes. O Espírito Santo está fazendo igual a Noruega, que tem um fundo parecido”, disse o ex-ministro Nélson Jobim.
Ele criticou o Congresso por tentar abrir a CPI da Lava Toga, afirmando que uma CPI sempre tem o objetivo de criar dificuldades e, raramente, apresenta soluções. No entanto, defendeu, em certos casos, a Lei de Abuso de Autoridades, “porque é necessário que toda autonomia tem que ter responsabilização”.
Casagrande defende projetos do Estado
O Ciclo de Palestras do Banestes foi aberto ao público e teve a participação do governador Renato Casagrande, que comemorou e agradeceu a presença do ex-ministro Nélson Jobim:
“Em uma hora em que precisamos enxergar um pouco mais distante em meio a esse ambiente de nevoeiro, as palavras do ministro poderão dar uma fonte de avaliação para que a gente siga em frente com segurança em nosso projeto de Estado”, disse o governador.
Casagrande lembrou a necessidade de cautela diante do cenário nacional, mas ponderou que o bom momento vivido pelo Espírito Santo é fundamental para o Estado se tornar cada vez mais justo e eficiente:
“Temos uma economia patinando, temos conquistas sendo ameaçadas, temos preocupações com o debate político nacional e com a economia nacional. Neste momento em que estamos liderando um projeto local, precisamos ter cautela. Nosso projeto precisa ser firme e bem fincado no que pregamos como projeto de vida, que exige democracia, respeito ao meio ambiente, cultura de paz, tolerância e paciência”, ressaltou Casagrande.
O governador citou ainda a cultura da gestão fiscal responsável no Espírito Santo – único estado da Federação a ser considerado “Nota A” pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN) desde 2012. Casagrande falou também sobre a estabilidade institucional na relação com os demais Poderes, além da criação do Fundo Soberano, que vai servir como uma poupança para o futuro com os recursos hoje dos royalties de petróleo. Queremos ser um Estado justo e eficiente e para isso, precisamos de infraestrutura, educação de qualidade e um ambiente inovador”, apontou.
O diretor-presidente do Banestes, José Amarildo Casagrande, frisou a atuação do banco no desenvolvimento do Espírito Santo.
“Além de suas atribuições enquanto uma instituição financeira, o Banestes tem um compromisso com o capixaba, por ser o banco da nossa terra. Em 2019, temos atuado fortemente em prol do desenvolvimento tecnológico do Banco, trazendo como principal característica a inovação, em todas as suas frentes, de forma a promover a alta performance e aperfeiçoar a experiência do cliente. A construção do projeto do Circuito de Palestras Banestes tem como principal premissa compartilhar com a sociedade capixaba o que temos vivenciado internamente, proporcionando um alto nível de debates e valorização de ideias. O Banestes contribui para o desenvolvimento do Estado e preza pela valorização do capixaba”, observou.
Circuito de Palestras Banestes
A partir de reuniões e debates internos, surgiu no âmbito do Sistema Financeiro Banestes a necessidade de criar um fórum de discussões com temas relevantes à sociedade, aos negócios e ligados à atualidade. O intuito é promover na sociedade capixaba a possibilidade de fortalecer o senso crítico, alavancar a inovação, trabalhar temas como a disrupção, transformação digital, big data, mindset, além da economia, política, responsabilidade social, novas formas de trabalho, futuro dos negócios e outros que se relacionam à atmosfera atual.
(Fotos: Secom/ES)