Em artigo publicado no jornal A Gazeta da última segunda-feira (02/09) e em entrevista ao Bom Dia ES desta quinta-feira (05/09), o ex-secretário de Estado da Segurança Pública e Defesa Social, o pernambucano André Garcia, comete erros históricos e injustiças com os capixabas.
Primeiro, vale um retrospecto. André Garcia é procurador do Estado de Pernambuco aposentado. Veio de lá em 2009, trazido por Rodney Miranda, quando este assumiu pela segunda vez o comando da Sesp no Espírito Santo. Foi no segundo mandato de Paulo Hartung.
André Garcia foi sub de Rodney na Sesp e assumiu o comando da Segurança Pública em 2010, quando Rodney Miranda deixou o cargo para ser candidato a deputado estadual – ganhou, ficou dois anos e depois foi eleito prefeito de Vila Velha e não foi reeleito.
André Garcia foi mantido no Executivo Estadual e não precisou retornar para o Recife, sua terra natal. A convite do então governador Renato Casagrande, que assumiu o Palácio Anchieta pela primeira vez em 1º de janeiro de 2011, André Garcia foi o primeiro chefe da Secretaria Extraordinária de Ações Estratégicas, tendo sido um dos responsáveis pela implantação do Programa Estado Presente – no entanto, por influência de Paulo Hartung, André Garcia excluiu o Estado Presente de seu currículo.
Depois, Garcia foi secretário da Justiça e, por fim, da Segurança Pública de Renato Casagrande. Nos últimos dias de Casagrande no poder, em dezembro de 2014, André Garcia de novo se debandou para o lado de Paulo Hartung, que em janeiro de 2015 assumiu pela terceira vez o governo do Estado, tendo o pernambucano como seu secretário da Segurança.
Como primeira missão dada por Hartung, André Garcia teve que acabar com o Estado Presente, que ele mesmo ajudou a criar. A segurança pública do Espírito Santo voltava, assim, a mergulhar de novo num caos, sem investimentos, com cortes até nos combustíveis das viaturas, sem controle.
No artigo de segunda-feira, André Garcia fala sobre “prisão e violência”. Escreve que “o primeiro e inadiável êxito de política pública de contenção e controle da criminalidade passa pela organização de um sistema prisional moderno e seguro”. Nada de anormal na manifestação.
Em seguida, entretanto, começam os erros históricos e as injustiças. “De um cenário de quase inexistência de um sistema minimamente organizado e seguro, cujo ápice do descontrole foi atingido no início dos anos 2000, o Espírito Santo conseguiu, com enorme esforço do governo iniciado em 2003 e a colaboração de diversos atores, construir diversos unidades novas, seguras e modernas, que possibilitaram a virada da estatística iniciada em 2010 e até hoje em curso”.
É preciso ir em partes. “De um cenário de quase inexistência de um sistema minimamente organizado e seguro, cujo ápice do descontrole foi atingido no início dos anos 2000”…Com esta frase, André Garcia não está sendo real com os fatos. O governo que ele defende (de Paulo Hartung), iniciado em 2003, herdou um sistema prisional pelo menos moralizado e controlado pelo Estado.
O então governador José Ignácio Ferreira, ao assumir em 1999, promoveu uma verdadeira intervenção nos presídios por meio da Polícia Militar.
Outra falha de memória do pernambucano André Garcia é quando ele diz que “o Espírito Santo conseguiu, com enorme esforço do governo iniciado em 2003 e a colaboração de diversos atores, construir diversos unidades novas, seguras e modernas, que possibilitaram a virada da estatística iniciada em 2010 e até hoje em curso”.
O governo Paulo Hartung, iniciado em janeiro de 2003, só começou a investir na construção de novos presídios em seu segundo mandato, já em 2007. O governo permitiu a instalação do caos no sistema prisional, para, enfim, a partir de 2007 começar a construção de novas cadeias. Diga-se de passagem, construções realizadas sem licitação, mas nada de ilegal, segundo o Ministério Público Estadual e o Tribunal de Contas à época.
Uma série de ataques a ônibus forçou o governo a mudar sua política em relação ao sistema prisional. De dentro das cadeias, os chefões do crime ordenaram os ataques, entre final de 2005 e 2006. Foi necessário o emprego de forças federais, com o Exército e a Força Nacional de Segurança ocupando as ruas da Grande Vitória.
André Garcia esquece de outros acontecimentos. No governo que ele defende, o Espírito Santo passou a alojar presos em contêineres. Foi nesse período que presos eram esquartejados nas celas. Por conta desse histórico, o Espírito Santo e o Brasil foram denunciados na ONU. Quem não se lembra de artigo do jornalista Elio Gáspari, sob o título “As Masmorras de Hartung”, publicado nos principais jornais do País?
Ao reaparecer, o ex-secretário André Garcia busca espaço para, quem sabe, tentar algo na política. Direito que ele tem, uma vez que decidiu se radicar definitivamente em solo capixaba, onde constituiu família. Porém, a sociedade tem que saber que ele e a maioria de seus colegas de governo Hartung deixaram para o atual governador, Renato Casagrande, uma herança maldita em diversas áreas.
No sistema prisional, por exemplo, a taxa de ocupação em 2018 foi de 159,8, ou seja, uma superlotação do sistema prisional de 59,8% acima da capacidade.
Em 2009, ápice da crise do sistema prisional, o Estado estava com uma superlotação de 45,6%. E mais: na gestão de Paulo Hartung, o Espírito Santo oscilou entre o segundo e terceiro Estado mais violento do País.
Não foi à toa que em 2009 o Espírito Santo registrou 56,9 homicídios por um grupo de 100 mil habitantes, o segundo maior de toda a história do Estado, perdendo apenas para o ano de 1998, quando, no governo petista de Vitor Buaiz, o Estado teve 57,8 assassinatos por 100 mil pessoas.
Naquele mesmo ano de 2009, o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), órgão ligado ao Ministério da Justiça, entregou ao então procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, pedido de intervenção federal no Espírito Santo “em função de denúncias de precariedade das unidades prisionais e da prática de tortura e esquartejamento nos presídios do Estado”. O pedido, no entanto, foi rechaçado.
André Garcia faz a defesa do governo passado. Cita que, nos mandatos anteriores, Paulo Hartung construiu diversas unidades novas, seguras e modernas. Vive, todavia, de um passado. No terceiro mandato, Hartung não investiu um centavo sequer no sistema prisional. Em dezembro de 2010, quando encerrou seu segundo mandato, Hartung deixou o sistema prisional capixaba com 9.481 vagas disponíveis em suas unidades, para uma população carcerária de 11.381 presos.
Em janeiro de 2015, ao retornar a governar o Espírito Santo, Hartung encontrou o mesmo sistema com 13.192 vagas e uma ocupação de 16.541 presos. Significa que seu sucessor, Renato Casagrande, abriu mais unidades e aumentou o número de bandidos presos, fruto do Estado Presente, abandonado por André Garcia.
Para surpresa geral, o governo que diz ter investido tanto “no social” e se gaba do ajuste fiscal, encerrou o terceiro mandato, em dezembro de 2018, com o mesmo número de vagas que herdou de Casagrande em janeiro de 2015 – cerca de 13.800 – e uma população carcerária de 22.155. Ou seja, deixou o sistema com 1,59 presos para uma vaga disponível. Um caos. Um sistema preste a explodir.
Conclusão: o governo que o pernambucano André Garcia defende e sempre vestiu a camisa ganhou fama por destruir programas de segurança pública que deram resultados positivos. Antes de destruir o Estado Presente, retomado em janeiro de 2019 com a volta do governador Renato Casagrande, Hartung acabou com o Pro-Pas, criado anteriormente no governo de José Ignácio Ferreira.
(Texto atualizado às 5h34 de 06/09/2019)