Em artigo publicado na edição desta sexta-feira (24/08) do jornal A Gazeta, o coronel da Reserva Remunerada da Polícia Militar do Estado do Espírito Santo Gustavo Debortoli explica que “não há como ignorar essa verdade inconveniente”, que é o aumento da violência no Estado.
“Uma verdadeira onda de violência, mortes e roubos atingiu a Grande Vitória nos últimos dias e tornou a população capixaba, mais uma vez, refém da insegurança. Como nada parece os intimidar, criminosos estabelecem suas próprias regras, que são estampadas nos muros da cidade, e tomam para si a tarefa de decidir quem vive ou morre em comunidades dominadas pelo medo”, resume o coronel Debortoli, que foi, até abril deste ano, subsecretário de Gestão Estratégica da Secretaria de Estado da Segurança Pública e Defesa Social (Sesp).
O texto do coronel Debortoli corrobora com artigo do Blog do Elimar Côrtes postado na última terça-feira (21/08), que, com o título FALÁCIA DO SECRETÁRIO-CORONEL CAUSA CONSTRANGIMENTO À POPULAÇÃO DO ESPÍRITO SANTO: Nylton Rodrigues e “O Delírio da Negação”, mostrou o desespero e destempero do atual secretário de Estado da Segurança Pública, coronel Nylton Rodrigues, em insistir na negativa de que o tráfico domina dezenas comunidades da Grande Vitória.
O coronel Debortoli crava que “não existe solução simples para um problema tão complexo”. E arremata: “A simples ampliação do efetivo policial, a realização de um sem número de operações espetaculosas e o uso sistemático de frases de efeito têm pouco ou nenhum resultado prático no enfrentamento da violência. Fosse assim, o Rio de Janeiro, que encontra-se sob intervenção federal, estaria há muito pacificado”.
E encerra o artigo propondo que a redução da escalada da violência passa, sobretudo, pela oferta de oportunidades aos jovens.
“Resta, portanto, resistir à tentação de encontrar soluções mágicas e priorizar aquilo que realmente tem o poder de transformar: a geração de oportunidades”.
Abaixo, a íntegra do artigo do coronel RR Gustavo Debortoli
Uma verdade mais que inconveniente
Uma verdadeira onda de violência, mortes e roubos atingiu a Grande Vitória nos últimos dias e tornou a população capixaba, mais uma vez, refém da insegurança. Como nada parece os intimidar, criminosos estabelecem suas próprias regras, que são estampadas nos muros da cidade, e tomam para si a tarefa de decidir quem vive ou morre em comunidades dominadas pelo medo.
A polícia, com seus parcos recursos, tem se desdobrado para exercer seu papel e tentar, de alguma forma, dar uma resposta à sociedade. Infelizmente, a ação isolada da polícia não tem sido suficiente.
Acuada por um orçamento que mal cobre a folha de pagamento e por uma legislação penal permissiva e ultrapassada, que coloca criminosos reincidentes nas ruas e prolonga processos judiciais por décadas antes de uma condenação, a repressão policial tornou-se tão eficaz quanto enxugar gelo.
A certeza da impunidade associada à completa ausência de políticas públicas para desenvolvimento social só faz ampliar as vantagens da atividade criminosa. Gerações inteiras de jovens, que não estudam nem trabalham, estão cada vez mais próximas de retroalimentar o ciclo vicioso da criminalidade.
Não há como ignorar essa verdade inconveniente. Também não existe solução simples para um problema tão complexo.
Mas é preciso que fique claro que a simples ampliação do efetivo policial, a realização de um sem número de operações espetaculosas e o uso sistemático de frases de efeito têm pouco ou nenhum resultado prático no enfrentamento da violência. Fosse assim, o Rio de Janeiro, que encontra-se sob intervenção federal, estaria há muito pacificado.
Estratégias e intervenções duradouras para a redução de violência precisam obrigatoriamente focar na interrupção do ciclo de violência. Pesquisa baseada em dados do último censo no Espírito Santo mostra que a redução da desigualdade na distribuição de renda e do desemprego, especialmente entre os jovens, tem impacto mais significativo na criminalidade do que respostas tradicionais como a contratação de policiais ou a intensificação das abordagens.
Resta, portanto, resistir à tentação de encontrar soluções mágicas e priorizar aquilo que realmente tem o poder de transformar: a geração de oportunidades.
Gustavo Debortoli, Coronel da Reserva da Polícia Militar do Estado do Espírito Santo e Doutorando em Administração.