A empresa Concremat Engenharia e Tecnologia S/A, contratada pelo governo do Estado para supervisionar, controlar e fiscalizar o andamento das obras do Cais das Artes, na Praça do Papa, em Vitória, é a mesma que planejou e executou as obras da Ciclovia Tim Maia, no Rio de Janeiro, e que desabou no dia 21 de abril de 2016. O trecho de cerca de 20 metros da ciclovia, na Avenida Niemeyer, em São Conrado, na Zona Sul do Rio, desabou pouco mais de três meses após sua inauguração, matando duas pessoas.
A Concremat foi contratada pelo governo do Estado do Espírito Santo em 2010, conforme extrato de contrato número 066/2010, cujo processo leva o número 49225200/2010, publicado no Diário Oficial do Estado em 10 de novembro de 2010. O contrato foi firmado com o Instituto de Obras Públicas do Espírito Santo (Iopes). Pelo contrato firmado em 2010 com o IOPES, a Concremat recebeu R$ 4.352.821,19.
“Pelo que se obtém do Diário Oficial à época, a empresa (Concremat) teria que prestar serviços de gerenciamento para supervisionar, fiscalizar e proteger o cronograma da obra do Cais das Artes, bem como zelar pela boa aplicação dos recursos públicos. Mas não é isso que vemos hoje, oito anos depois, já que as obras estão paralisadas desde 2015”, protestou o deputado estadual Euclério Sampaio, na sessão ordinária da Assembleia Legislativa desta quarta-feira (14/03).
Na sua edição de terça-feira (13/03), o jornal A Gazeta informou que, apesar de paradas, as obras do Cais das Artes vão custar R$ 20 milhões a mais aos cofres públicos, gastos que serão pagos pela população capixaba. O jornal cita que “o projeto se tornou num caixote de concreto” e diz que R$ 126 milhões já foram gastos com as obras e que mais R$ 100 milhões ainda serão gastos para conclusão do projeto, “R$ 20 milhões a mais do que o previsto até o fim de 2017”, totalizando R$ 226 milhões.
O Cais das Artes é a menina dos olhos do governador Paulo Hartung (PMDB), que iniciou a construção em 5 de abril de 2010, durante o último ano de seu segundo mandato – hoje, Hartung está no terceiro mandato.
Já na edição desta quarta-feira (14/03), A Gazeta mostra que, além das obras paradas, o Cais das Artes está abandonado. Uma perícia realizada em 2017 constatou que equipamentos metálicos armazenados e já instalados estão enferrujados e se deteriorando. Há infiltrações nas paredes e aparelhos de ar condicionados encontram-se ao relento.
Para o deputado Euclério Sampaio, mais do que “o abandono” das obras e “o descaso com o dinheiro do povo”, por “parte do governo estadual”, é saber que a mesma empresa (Concremat) que cometeu falhas no planejamento e execução da Ciclovia Tim Maia, que foi construída para ser um dos legados dos Jogos Olímpicos de 2016 na cidade do Rio, também é responsável pelo planejamento das sobras do Cais das Artes:
“Conforme consta em documentos amplamente divulgados pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio de Janeiro (Crea-RJ), em maio de 2016, uma série de irregularidades e descumprimentos de normas de segurança e de licitação levou ao desabamento de um trecho da Ciclovia Tim Maia. O acidente aconteceu durante uma ressaca no mar e lamentavelmente causou a morte de duas pessoas. E a mesma empresa que atuou no Rio, a Concremat, que recebeu mais de R$ 4 milhões por um contrato de serviços com o Governo do Espírito Santo, falhou também no planejamento do Cais das Artes”, disse Euclério Sampaio.
“Resumindo: do jeito que as obras se encontram hoje, o Cais das Artes corre risco de acidente”, alerta o parlamentar.
Em maio de 2016, o Crea do Rio divulgou laudo pericial com os resultados do estudo sobre a queda da ciclovia. Uma das principais conclusões dos engenheiros civis envolvidos no estudo é que houve falha na elaboração do projeto, uma vez que faltaram estudos preliminares oceanográficos dos efeitos das ondas sobre a estrutura da ciclovia. Segundo o documento, a Fundação Instituto de Geotécnica (Geo-Rio) não tinha experiência para licitar e fiscalizar uma obra da complexidade como a exigida pela ciclovia, falhando na fiscalização do empreendimento.
Além disso, observa Euclério Sampaio, a Concremat não poderia ter sido contratada pelo governo capixaba, em 2010, porque, dois anos antes – em 2008 –, tornou-se alvo de uma Ação de Improbidade Administrativa, de acordo com denúncia do Ministério Público do Estado do Espírito Santo, pela acusação de superfaturamento em contrato com o próprio governo do Espírito Santo.
A ação, realizada através da 8ª Promotoria Cível de Vitória, salienta que foram encontradas irregularidades em um contrato de R$ 8.996.215,65, firmado entre o Instituto de Obras Públicas do Espírito Santo (Iopes) e a empresa, em março de 2008. A empreiteira Concremat foi contratada para prestar serviços de engenharia consultiva, de apoio ao gerenciamento geral e supervisão de obras do programa de ampliação e modernização do sistema hospitalar do Espírito Santo.
De acordo com o MPES, o contrato teve validade de três anos, a partir de 2008, sendo que, para o exercício financeiro do primeiro ano, foram pagos R$ 4,5 milhões à empresa. Segundo o Ministério Público, o superfaturamento do contrato está estimado em R$ 4.263.455,26. Ou seja, dos R$ 8,9 milhões contratados, R$ 4,2 milhões estariam superfaturados.