O apartamento recheado com mais de R$ 51 milhões em espécie e impressões digitais do ex-ministro Geddel Vieira Lima (PMDB) vem preocupando as autoridades da Polícia Federal e do Ministério Público também no Espírito Santo. E um dos motivos dessa preocupação é que o Relatório de Inteligência Financeira (RIF) do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), ao qual o Blog do Elimar Côrtes teve acesso com exclusividade, detectou, somente este ano, ao menos 723 movimentações financeiras suspeitas no Espírito Santo.
As notificações, feitas por bancos e demais instituições financeiras, são de até o dia 8 de agosto de 2017 e informam que, entre 1999 e este ano, o Estado foi alvo de 96.120 comunicações de operações suspeitas realizadas em espécie – quando as transações financeiras são feitas com dinheiro vivo. Também foram distribuídas em solo capixaba, segundo o Coaf, 79.256 comunicações de operações atípicas – provavelmente fraudulentas – nos últimos 18 anos.
Em resposta do Blog do Elimar Côrtes, o Coaf informou que os dados dizem respeito à quantidade de comunicações recebidas pelo órgão, enviadas pelos setores financeiros em obediência ao artigo 9º da Lei 9.613/98 (que dispõe sobre os crimes de “lavagem de dinheiro” ou ocultação de bens, direitos e valores).
Ainda segundo o Coaf, Comunicações de Operações Suspeitas (COS) compreendem as operações financeiras considerando as partes envolvidas, os valores, a frequência, as formas de realização ou a falta de fundamento econômico ou legal, que podem configurar indícios da ocorrência de delitos penais, passíveis de comunicação ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras.
Já as Comunicações de Operações em Espécie (COE) compreendem as operações financeiras efetuadas em “dinheiro vivo” que devem ser comunicadas ao Coaf, independentemente de qualquer análise, pelos setores obrigados, na forma, condições e limites fixado pelos seus respectivos reguladores.
De acordo com o disposto no artigo 14 da Lei nº 9.613/98, o Coaf, Unidade de Inteligência Financeira do Governo Brasileiro, foi criado com a finalidade de disciplinar e aplicar penas administrativas, bem como de receber, examinar e identificar as ocorrências suspeitas de atividades ilícitas, definidas no artigo 11 do mesmo normativo.
Essas ocorrências são informadas ao Coaf por meio das comunicações (COS e COE) das entidades obrigadas, dentre elas, as instituições financeiras, e, após análise e confrontação com demais bancos de dados disponíveis, ou seja, após os devidos procedimentos de “análise de inteligência financeira”, propiciam a elaboração de Relatórios de Inteligência Financeira (RIF), que registram todas as informações recebidas ou agregadas.
Assim, acrescenta o Coaf, desde que constatados, ao menos, indícios de ilícitos, “os RIFs são encaminhados às autoridades competentes, como os Ministérios Públicos e Polícias Judiciárias, para a instauração dos procedimentos cabíveis”, conforme reza o artigo 15 da Lei da Lavagem de Dinheiro.
“A atuação do Coaf, portanto, restringe-se à análise de informações de inteligência financeira utilizáveis por autoridades para fins de combate a delitos penais, principalmente aqueles relacionados com lavagem ou ocultação de ativos. O Coaf, portanto, não realiza investigações”, explica o órgão.
Sobre os dados relativos ao Espírito Santo – 723 movimentações financeiras somente neste ano –, o Coaf acrescenta que o número informado é de comunicações e que pode envolver uma ou mais transações financeiras. “Ademais, os valores envolvidos nas comunicações não são divulgados, tendo em vista que uma mesma operação pode estar reproduzida em mais de uma comunicação. Em geral, essas comunicações apresentam o somatório de débitos e créditos e não necessariamente o valor recebido em conta”, afirma o Coaf.
O Coaf não possui estatística de quantas pessoas estão envolvidas nas comunicações. O fato de estar em uma comunicação não significa que a pessoa está sendo ou será investigada. Uma comunicação pode envolver uma ou mais pessoas e essas podem aparecer em diversas comunicações.
Segundo o órgão, os Relatórios de Inteligência Financeira do Coaf (que são feitos com base em uma ou mais comunicações) são enviados para as autoridades competentes para investigar, principalmente a Polícia Federal e o Ministério Público (Federal e Estadual).
Já as comunicações de operações em espécie devem ser feitas, no caso dos bancos, nos pedidos de provisionamento, saques ou depósitos em espécie acima de R$ 100 mil.
Presidente do Coaf diz que pagamento em espécie é motivo de preocupação em todo o mundo
Na semana passada, o presidente do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), Antônio Gustavo Rodrigues, disse que, apesar da evolução tecnológica e das novas ferramentas de segurança oferecidas pelos bancos, ainda há enorme preocupação com o uso do dinheiro em espécie, que não é rastreável. Em palestra no 7º Congresso de Combate e Prevenção à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento do Terrorismo, Antônio Gustavo destacou que é preciso tomar medidas para restringir a circulação e proibir ou dificultar a adoção de pagamentos em dinheiro.
“Isso para qualquer pagamento. Se você vai comprar um carro, uma casa, não vai ficar carregando mala de dinheiro. Para qualquer tipo de pagamento, não é razoável que uma pessoa carregue grandes quantidades de moeda. Em princípio, eu diria que devia ser proibido pagar em dinheiro a partir de R$ 30 mil. Até mesmo menos do que isso já é muito dinheiro para ficar carregando. Devíamos seguir o exemplo de outros países e ter leis proibindo pagamentos acima desse valor em dinheiro”, afirmou Antônio Gustavo.