Entre 2005 e 2014, pelo menos 1.280 pessoas cometeram suicídio no Espírito Santo. Deste total, 510 foram registrados na Grande Vitória. Do total da Região Metropolitana, 44 casos ocorreram na Terceira Ponte, que liga Vitória a Vila Velha. Os dados constam no livro “Crise suicida: avaliação e manejo”, de autoria do professor-doutor Neury José Botega, considerado um dos maiores pesquisadores sobre o tema no Brasil.
Preocupado com a situação, o presidente da Comissão de Segurança Pública e do Combate ao Crime Organizado da Assembleia Legislativa, deputado Euclério Sampaio (PDT), voltará a apresentar à Casa, a partir de janeiro de 2017, projeto de lei que prevê a instalação de grades ou telas de proteção na Terceira Ponte.
Mais: Euclério vai criar nos próximos dias a Associação dos Familiares e Amigos Vítimas de Pessoas que Cometeram Suicídio. Entre 2005 e 2014, pelo menos 193 pessoas tentaram pular do vão central da Terceira Ponte para cometer suicídio:
“Diante da inoperância e omissão do Estado do Espírito Santo e da falta de sensibilidade da maioria dos nossos deputados estaduais, vou criar a Associação, com o objetivo de alertar a sociedade sobre a gravidade do tema. Infelizmente, meus colegas de Parlamento, em sua maioria, pensaram em salvar os cofres da Rodosol, ao votar pelo arquivamento de minha proposta. Esses deputados que votaram contra o projeto de lei e os que fugiram do Plenário da Assembleia para não votar, para não se comprometer com a Rodosol e nem com o governo, não pensam na vida humana”, reagiu Euclério Sampaio.
Em seu portal na internet, o Sindicato dos Servidores Policiais Civis do Estado do Espírito Santo (Sindipol) explica que suicídio não é crime e o motivo é simples: não se processa ou pune alguém que já está morto. Mas também não se pode prender uma pessoa que tentou se matar e fracassou: não existe crime em tentar tirar a própria vida.
“O tema ainda é um grande tabu e um desafio para os legisladores. No Espírito Santo, especificamente na Terceira Ponte, a maior do Estado, os casos de suicídio continuam acontecendo e os reflexos vão além do sofrimento das famílias que perdem alguém”, diz, preocupado, o presidente do Sindipol,Jorge Emílio Leal.
No Centro de Vitória, condomínio instalou grades nas janelas e acabou com suicídio
A proposta de Euclério Sampaio, que é também advogado e investigador de Polícia Civil aposentado, previa a instalação de grades ou redes de proteção ao longo da ponte que liga Vitória ao município de Vila Velha. Uma ideia simples, eficiente e que não demandaria grandes investimentos. A Terceira Ponte é administrada por uma empresa privada (Rodosol), e o cidadão paga pedágio.
“Vale lembrar que, antigamente, se registravam muitos casos de suicídio no edifício Ames, localizado na rua Alberto de Oliveira Santos, 60, Centro de Vitória. No entanto, a partir de 1997, o síndico do prédio, onde havia diversos consultórios médicos, instalou grades em todas as janelas de seus 21 andares, tanto na parte da frente quanto atrás e nas laterais. Pronto: não houve mais suicídio. O Poder Público tem a obrigação de exigir da Rodosol que adote medidas protetivas. Quando digo Poder Público, falo de todas as esferas: Legislativo, Executivo e o sistema de Justiça”, defende Euclério Sampaio.
As pessoas e entidades interessadas em participar da Associação a ser criada pelo deputado podem procurar Euclério Sampaio pessoalmente nas sessões da Comissão de Segurança Pública, que ocorrem todas as segundas-feiras, a partir das 11 horas; no Plenário da Assembleia Legislativa; ou em seu gabinete.
Em votação no plenário da Ales, no dia 22 de novembro deste ano, o Projeto de Lei foi arquivado por nove votos a oito. A base do governo alegou inconstitucionalidade, esse foi o argumento apresentado por Gildevan Fernandes (PMDB) e Erick Musso (PMDB), respectivamente.
Amaro Neto, Favatto e Freitas fugiram do Plenário para agradar a Rodosol e o governo
Teve deputado que deixou o plenário na hora da votação, como o apresentador do programa policial Balanço Geral, Amaro Neto (SD), Rafael Favatto (PEN) e Freitas (PSB). Amaro Neto foi candidato a prefeito de Vitória, enquanto Favatto foi vice-prefeito de Vila Velha na atual gestão e se candidatou a prefeito como oposição em 2016.
De acordo com o Sindipol, apesar de não ser um crime previsto em lei, existem situações em que o suicídio vira “caso de polícia”. Jorge Emílio explica:
“Certamente você já viu ou ouviu falar que alguém foi preso por ‘tentar se matar’. Nesse caso, a prisão não é uma punição, a polícia prende a pessoa para protegê-la de si mesma, por relacionar o fato a problemas mentais. Mas, de acordo com especialistas, há três casos passíveis de prisão, e é aí que entra a Polícia Civil.”
Numa tentativa frustrada, a pessoa pode acabar matando, ferindo alguém ou danificando patrimônios, por exemplos. Tudo isso é crime. Exemplo: o suicida que se atira e acaba caindo e destruindo a propriedade alheia, ou o suicida que abre o gás, causa uma explosão no prédio no qual mora, mas não morre.
Situação parecida com os casos que causam grandes congestionamentos. Quando a Terceira Ponte fica parada, o trânsito compromete não só a mobilidade em Vitória e Vila Velha, mas na Serra e em Cariacica também. Nesse exemplo, a Lei das Contravenções Penais pune quem “praticar qualquer ato capaz de produzir pânico ou tumulto” (art. 41)”, informa o Sindipol.
O terceiro e último exemplo é o que afeta diretamente a Polícia Civil. “Como explicamos, se suicidar não é crime, mas estimular, auxiliar ou induzir alguém é. É o caso das pessoas que fornecem à arma para que o suicida se mate ou das pessoas que gritam para que o suicida se atire do alto de um prédio. Esse é um crime contra a vida, e sabemos que a Polícia Civil tem delegacias especializadas com esse nome. Esses crimes são ou deveriam ser investigados, mas o Sindicato dos Policiais Civis lembra que a Polícia Civil capixaba está em crise, com uma defasagem no efetivo de 1.428 policiais, isso equivale a quase 38%. O reflexo disso são delegacias com inquéritos parados e policiais sobrecarregados”, acrescenta o presidente do Sindipol, Jorge Emílio, no Portal da entidade.
Em defesa da vida, Sindipol apoia instalação de grades na Terceira Ponte
“O Sindipol/ES lamenta que o Projeto de Lei do deputado Euclério Sampaio tenha sido arquivado na Assembleia Legislativa. O Sindipol acredita que a Terceira Ponte precisa de uma intervenção para evitar novos suicídios, não causar mais transtornos à população e não sobrecarregar ainda mais o policial civil capixaba. Nossos parlamentares precisam pensar na sociedade, no servidor público, não nos interesses empresariais. O Sindipol apoia o projeto do deputado Euclério Sampaio. É necessária uma intervenção urgente na Terceira Ponte”, destacou Jorge Emílio Leal.