O diretor-geral da Polícia Federal, delegado Leandro Daiello, publicou no dia 8 deste mês a Instrução Normativa Nº 108/2016, que se propõe a tratar da Investigação Criminal e da Polícia Judiciária no âmbito da PF. No entanto, de acordo com dirigentes de classe, a medida “se revelou um normativo de interesse meramente corporativo, que amplia e privilegia o cargo de delegado de Polícia Federal.”
Nesta quarta-feira (16/11), a Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef) divulgou nota de repúdio em que ataca os principais pontos da Instrução Normativa. Em Vitória, o presidente do Sindicato dos Policiais Federais do Estado do Espírito Santo (Sinpef-ES), Marcus Firme dos Reis, anunciou que a entidade vai entrar com uma ação na Justiça Federal para cassar a decisão da direção da PF:
“Essa Instrução Normativa transforma os agentes, escrivães e papiloscopistas em meros auxiliares dos delegados federais. O diretor-geral da PF conferiu atribuições a cargos sem a aprovação de lei específica. Fez tudo isso por meio de Instrução Normativa, o que é ilegal”, afirma Marcus Firme.
Ao justificar a Instrução Normativa, o diretor-geral da Polícia, Leandro Daiello, cita que “considerando a relevância da execução da atividade de polícia judiciária, implicando na premente e constante necessidade da padronização do procedimento apuratório em âmbito federal; e Considerando a necessidade de atualizar mecanismos existentes, simplificar funções e atividades na busca de maior celeridade aos feitos, mantendo-se a segurança, transparência, qualidade, eficiência e eficácia das investigações criminais, realizadas no âmbito federal e relativas à competência da Polícia Federal”.
Em nota, a diretoria da Fenapef e o seu Conselho de Representantes repudiam o ato do diretor-geral da Polícia Federal ao expedir a Instrução Normativa nº 108-DG/DPF, de 8 de novembro de 2016, “de forma inconstitucional, corporativa, autoritária e desleal para com o conjunto dos cargos que fazem parte da instituição.”
De acordo com a Fenapef – que também entrará com uma ação em Brasília contra o ato do diretor Leandro Daiello –, a nova norma interna fixa inúmeras atribuições e prerrogativas a um único cargo, “desprezando as ações operacionais levadas a efeito pelos cargos de agente, escrivão e papiloscopista Policial Federal, “de crucial importância na estrutura da investigação.”
Segundo a Fenapef, o Supremo Truibunal Federal já asseverou que quaisquer modificações ou mesmo a fixação de atribuição de cargos públicos não podem ser feitas por outra via que não a da lei formal.
A Instrução Normativa 108/2016 proíbe os Papiloscopistas Policiais Federais de realizarem perícia papiloscópica. O artigo 89 da IN 108/2016 limita a atribuição dos papiloscopistas no sentido de fazerem apenas “exames” papiloscópicos.
“Trata-se de uma intenção de diminuir a importância dos trabalhos periciais há décadas confeccionados por papiloscopistas da PF”, protestou Marcus Firme.
Em sua página no Facebook, o escrivão de Polícia Federal aposentado e professor Marco Antônio Scandiuzzi postou um vídeo em que tece análises críticas em relação à Instrução Normativa. Ela chama a atenção para alguns artigos, como 65, afirmando que, dentro da instituição da PF, é do conhecimento geral que ninguém gosta de ir a um presídio colher depoimento ou interrogar um presidiário.
Por isso, segundo ele, o artigo diz que a “realização de inquirições à distância, inclusive do preso recolhido a estabelecimento prisional ou de custódia, poderá ser feita por videoconferência ou por qualquer outro meio de transmissão simultânea de imagem e som, facultada a gravação de áudio e vídeo da audiência.”.
O parágrafo 1º esclarece que “o Delegado de Polícia Federal deverá estabelecer contato com a Corregedoria Regional ou com o Chefe da Delegacia descentralizada do local onde se encontra a pessoa a ser inquirida, solicitando sua intimação e acordando a data e o horário da realização da oitiva.” Já o parágrafo 3º informa que “a oitiva será conduzida pelo Delegado de Polícia Federal solicitante e formalizada por Escrivão de Polícia Federal, presente no local onde esteja a pessoa a ser inquirida. Finalizada a oitiva, o Escrivão de Polícia Federal colherá as assinaturas dos presentes, providenciando a remessa das peças e da gravação produzidas, ao Delegado de Polícia Federal solicitante, que assinará o termo assim que o receber.”
“Ou seja, por tratar de um local que ninguém gosta de ir, o delegado ficará em seu gabinete e caberá ao escrivão ir à cadeia colher o depoimento do preso”, resumiu Scandiuzzi.
Em protesto, a Fenapef convocou seus sindicatos filiados e orientou todos os servidores sindicalizados a não participarem das solenidades pelo Dia do Policial Federal, agendadas para esta quarta-feira (16/11) pela administração do Departamento de Polícia Federal em alguns Estados e Distrito Federal, mesmo as que foram custeadas pelas entidades de classe, em protesto pela publicação da Instrução Normativa nº 108/2016-DG/PF.
A decisão foi tomada pelo Conselho de Representantes da Fenapef, em videoconferência realizada na última sexta-feira (11/11), “e tem o intuito de demonstrar o repúdio da categoria ao desrespeito e menosprezo com que vem sendo tratada pela Direção-Geral do DPF.”
Segundo a Fenapef, a Instrução Normativa nº 108-DG/DPF é inconstitucional porque “trata de matéria que deve ser objeto de lei em sentido estrito, como as inovações que dispõem sobre atribuições de cargos policiais. Os cargos policiais não têm atribuições em lei e não podem ser normatizados por simples regramento interno organizacional do órgão.”
É corporativa porque o “texto (Instrução Normativa) foi objeto de um grupo de trabalho criado pelo Diretor-Geral do qual participaram somente os cargos de delegado e perito, alijando os demais cargos que integram a Carreira Policial Federal”. Essa carreira (singular) está bem definida na Constituição Federal e nas leis que dispõem sobre os cargos policiais no âmbito do órgão, e são cinco, devendo-se sempre somar os cargos de agente, escrivão e papiloscopista aos de delegado e perito. Tal postura demonstra que a Direção-Geral da Polícia Federal é parcial e não administra para todos os cargos.”
Ainda segundo a Fenapef, a Instrução é desleal, pois “o Diretor-Geral Leandro Daiello em várias reuniões realizadas com a Diretoria da Fenapef quando foram levadas as preocupações dos policiais federais acerca do tema, afirmou que as discussões sobre a normatização dos serviços da polícia dita judiciária viriam de um consenso construído entre todas as entidades representativas de cargos da Polícia Federal.”
É “autoritária porque alterou diversas atividades do órgão realizadas por todos os cargos, inclusive servidores do Plano Especial de Cargos, atropelando propostas que vinham sendo objeto de estudo em grupo de trabalho formado em 2013, e resultando em medidas que estabelecem prerrogativas aos cargos de delegados e peritos e subjugam os demais cargos da Carreira Policial Federal, estabelecendo uma nova relação, agora assombrosamente hierarquizada, mas entre cargos e não a partir das funções de comando e chefias no órgão.”
Para a Fenapef, “após a entrada em vigor da referida norma infralegal, policiais federais passarão a ter diminuídas, dificultadas e anuladas várias de suas atribuições, contribuindo ainda mais para o incremento da burocracia das investigações e, consequentemente, da impunidade no Brasil.”