Em acórdão publicado na terça-feira (31/05), a 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região (Espírito Santo) acolheu recurso ordinário interposto pelo Sindicato dos Servidores Policiais Civis do Estado do Espírito Santo (Sindipol) em que reforma sentença de primeiro grau para determinar ao Sindicato dos Médicos do Estado do Espírito Santo (Simes) que se abstenha de praticar quaisquer atos de representação em favor dos médicos legistas, integrantes da Polícia Civil capixaba, sob pena de multa diária no valor de R$ 5 mil.
Com essa decisão, mais uma vez a Justiça entende que somente o Sindipol tem legitimidade para representar todos os servidores da Polícia Civil no Espírito Santo, incluindo delegados, investigadores, agentes de Polícia, escrivães, peritos criminais e papiloscópicos e, agora, os médicos-legistas.
Mais recentemente, a Justiça já havia dado vitória ao Sindipol em ações contra o Sindicato dos Delegados de Polícia (Sindepes) e o Sindicato dos Investigadores (Sinpol), reconhecendo a inexistência das duas entidades como representantes legítimas da categoria de Policiais Civis capixabas.
A decisão da 2ª Turma do TRT/ES aconteceu na Sessão Ordinária realizada no dia 19 de maio deste ano, sob a Presidência da desembargadora federal Cláudia Cardoso de Souza; com a participação dos desembargadores federais Wanda Lúcia Costa Leite França Decuzzi e Lino Faria Petelinkar; e do representante do Ministério Público do Trabalho, o procurador João Hilário Valentim.
A relatora do recurso ordinário foi a desembargadora Wanda Lúcia Costa Leite França Decuzzi e tem o número 0001115-66.2014.5.17.0002. O recurso do Sindipol foi contra decisão do juiz da 2ª Vara do Trabalho de Vitória, Roberto José Ferreira de Almada, que julgou improcedentes os pedidos do Sindicato. Em razões de recurso ordinário, o Sindipol pugnou pela reforma da sentença quanto à obrigação de não fazer dirigida ao Sindicato dos Médicos, indenização por danos morais e quanto aos honorários advocatícios.
O Sindipol ajuizou a ação para que o Simes “abstenha-se de praticar atos sindicais” da categoria dos Policiais Civis, “à qual integram os Médicos Legistas, por pertencerem aos quadros da Polícia Civil.”
O Departamento Jurídico do Sindipol argumentou que a entidade tem representação, de natureza sindical, quanto aos servidores policias civis do Espírito Santo, nos estritos moldes previstos no Estatuto da entidade sindical, única que possui o devido reconhecimento e registro junto ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
“Não sem razão, por diversas oportunidades, o Poder Judiciário, inclusive o Excelso Supremo Tribunal Federal, manifestou que o Sindicato-Reclamante (Sindipol) é a única entidade sindical com representação dos servidores policiais civis no Estado do Espírito Santo”, ressalta nos autos a desembargadora federal Wanda Lúcia Costa.
Todavia, segue a magistrada, o Sindicato dos Médicos “tem empreendido pretensa liderança de movimento grevista deflagrado (em 2014) pelos Policiais Civis ocupantes do cargo de Médicos Legistas, servidores públicos estaduais ocupantes de cargo de natureza essencial e regidos por legislação própria, de função essencial e com atribuições específicas, tendo por argumento a reivindicação de melhores condições de trabalho e reajuste salarial.”
A pretensão deduzida nos autos baseou-se na alegação de enquadramento dos médicos legistas na categoria dos policiais civis, e não na categoria médica, e, por conseguinte, na ilegitimidade do Sindicato dos Médicos para representar a categoria dos médicos que integram a carreira da Polícia Civil, ressalta a ação.
O Simes se defendeu, alegando, em suma, que “tal especialidade médica engloba conhecimentos médicos e, como médicos que são, nada mais coerente que o Sindicato dos Médicos do Espírito Santo representar os interesses que levaram os Médicos Legistas a deflagrarem a greve”.
O juiz de primeiro grau indeferiu o pedido do Sindipol, por entender que os médicos-legistas, apesar de servidores integrantes da carreira policial, pertencem a uma categoria diferenciada de servidores, por força de estatuto profissional especial.
O Sindipol, porém, recorreu, argumentando que “o entendimento da sentença esbarra na ausência de especificidade para a desconsideração de que os médicos legistas são integrantes do Sindicato-Recorrente.”
Nesse sentido, ensina o Departamento Jurídico do Sindipol, a Lei Complementar Estadual 04/1990 estipula, como integrantes da carreira da Polícia Civil do Estado do Espírito Santo, também os médicos legistas, “o que é motivação suficiente para sustentar a negativa de se considerar o cargo de médico legista como categoria própria e específica.”
Na análise do mérito, a desembargadora federal Wanda Lúcia Costa explica que “em regra, o enquadramento sindical deve ser realizado tendo em vista a atividade preponderante do empregador, e não pela função do empregado, com exceção das categorias diferenciadas, em que o critério de agregação passa a ser o próprio labor do empregado (art. 511, §3º, art. 577 e art. 581, §2º da CLT). Ocorre, porém, que os servidores públicos estatutários não estão sujeitos a sindicatos de categorias diferenciadas, isso porque já integram uma ‘categoria diferenciada’ de servidores – a categoria dos servidores públicos -, em consequência de condições de vida singular.”
A desembargadora diz ainda: “Não se nega, ressalte-se, a existência de categorias profissionais diferenciadas dentro do setor público, na medida em que a preexistência de sindicato da vasta categoria dos servidores públicos não impede a criação de um sindicato específico, diante das necessidades e especificidades diferentes de certos grupos de servidores. É dizer: é possível a criação de uma categoria específica de servidores públicos, tão somente.”
Prossegue a desembargadora federal Wanda Lúcia Costa Leite que, na presente hipótese, a situação é peculiar: “O que se discute é se o Sindicato dos Médicos do Estado do Espírito Santo, representante da categoria médica em geral, possui legitimidade para representar os médicos legistas, integrantes da Carreira Policial Civil do Estado do Espírito Santo.”
Ela é taxativa: “A resposta é não, pois não é possível um sindicato congregar empregados da iniciativa privada e servidores públicos, isso porque não se situam na mesma categoria, na medida em que submetidos a regimes jurídicos estruturalmente diversos, ou seja, o estatutário e o celetista, o que afasta qualquer comunhão de interesses, de modo que as peculiaridades decorrentes dos estatutos profissionais especiais dos médicos não são suficientes para afastar o cargo de médico legista da categoria da qual pertence.”
Assim, esclarece a desembargadora Wanda Lúcia Costa Leite, o fato de existir lei específica regulamentando a atividade dos médicos não é suficiente para que configurem, os médicos legistas, categoria diferenciada, para efeito de enquadramento e representação sindical, pois, independentemente da atividade que exerçam, integram a categoria profissional dos servidores públicos policiais.
“Além disso, há que se ter em mente que o objetivo maior na criação de um novo sindicato é o de melhor atender aos interesses específicos da categoria profissional, objetivo este que, no caso, não seria alcançado, uma vez que a representação sindical abrangeria, como dito, grupos heterogêneos de trabalhadores – servidores públicos estatuários e empregados da iniciativa privada, o que acabaria enfraquecendo a organização e a luta dos trabalhadores, uma vez que, não tendo os servidores públicos a possibilidade de pleitear, através da via judicial, cláusulas de natureza econômica (Súmula n. 339/STF), a atuação do sindicato, em relação a essa categoria, jamais ocorreria de forma uniforme em relação a todos os seus integrantes.”
Ela decide: “Conclui-se, portanto, que os médicos legistas integram a categoria profissional dos servidores públicos, e por isso, estão sob o âmbito de atuação do Sindicato dos Servidores Policiais Civis do Estado do Espírito Santo.”
Portanto, “por todo o exposto, dou provimento ao recurso do Sindicato-autor (Sindipol) para, reconhecendo a legitimidade do SINDIPOL-ES para representar os interesses dos médicos legistas, integrantes da Carreira Policial Civil do Estado do Espírito Santo, determinar que o Sindicato-réu abstenha-se de praticar quaisquer atos de representação sindical em favor dessa categoria específica de servidores públicos, sob pena de multa diária no valor de R$5.000,00 (cinco mil reais), com fulcro no art. 461 do CPC.”
O Sindipol também requereu a condenação do Simes ao pagamento de indenização por danos morais, a ser arbitrado pelo Juízo, aduzindo que “foi atingido na esfera moral, pois além de terem sofrido todo o impacto reativo da mobilização capitaneada pelo Reclamado (Simes), sofreu igualmente com o tratamento desrespeitoso e de má-fé do Reclamado que, sabidamente, conhecia não possuir atribuições e competência que foram usurpadas.”
A desembargadora federal Wanda Lúcia Costa Leite entende que, nesse caso, o Sindipol não tem razão. E explica os motivos: “O fato do movimento paredista ter sido capitaneado por Sindicato que não detém a representação dos médicos legistas não configura dano moral; necessário maiores elementos indicativos que demonstrem que, realmente, houve ofensa à imagem do Sindipol, sendo certo que meras críticas à entidade não têm o condão de provar o alegado dano, porque ínsitas aos próprios movimentos sindicais.”
Quanto aos honorários advocatícios, decidiu a magistrada, aplica-se o artigo 5º da IN nº 27/2005 do Tribunal Superior do Trabalho, “que preceitua serem devidos os honorários advocatícios pela mera sucumbência quando não se trata de relação de emprego. Logo, ante a sucumbência do Sindicato-réu (Simes), cabe-lhe responder pelos honorários advocatícios, ora fixados no percentual de 15% sobre o valor da causa, atribuído no valor de R$ 30.000,00.”