Depois das críticas feitas à maneira como a Audiência de Custódia vem sendo realizada no Espírito Santo pela presidente da Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas – Regional Espírito Santo (ABRACRIM-ES) –, Carla Pedreira, chegou agira é a vez do presidente do Sindicato dos Servidores Policiais Civis, Jorge Emílio Leal, se manifestar sobre o tema.
Em artigo escrito em nome da Diretoria do Sindipol, Jorge Emílio aponta pontos positivos no modelo, mas assegura que, devido à soltura de marginais nas Audiências de Custódia, menos de 24 horas depois de serem presos autuados em flagrante pela Autoridade Policial, muitos são soltos, voltam às ruas e acabam praticando novos crimes. De acordo com o lide classista, após a adoção da Audiência de Custódia no Espírito Santo, o número de crimes contra o patrimônio aumentou no Estado.
Audiência de Custódia: incongruências e paradigmas
O Sindicato dos Servidores Policiais Civis do Estado do Espírito Santo se posiciona contra o atual modelo de Audiência de Custódia, por ser o modelo mais prejudicial que benéfico à sociedade em razão do aumento da criminalidade, principalmente no que tange aos crimes patrimoniais, cujos criminosos reincidentes são postos livres e soltos nas ruas para cometerem novos crimes, esquivando-se da ressocialização da pena, além de prejudicar em muito as atribuições das instituições policiais, notadamente a da policia judiciária, que atua sem condições materiais e humanas suficientes a demanda enfrentada em total desvio de função, os policiais trabalham enxugando gelo.
O SINDIPOL-ES concorda com um projeto para o modelo de Audiência de Custódia melhor elaborado, uma vez que os governos vem adotando uma visão estrábica na defesa dos direitos humanos e na politica de segurança pública implantada no Brasil, não obstante, caminha em sentido contrário ao estabelecido em pactos e convenções internacionais tais como o de São Jose da Costa Rica. No Brasil se implantou a inusitada Audiência de Custódia, antagônica por ir de encontro ao sistema penal, processual e constitucional pátrio.
Noutra senda, o congresso nacional por meio de suas casas, enfrenta o tema por meio do PLS nº 554/11 e se discute o instrumento da prisão em flagrante delito no entendimento de se evitar o inchaço do sistema penitenciário que está abarrotado com presos provisórios, em regra, de classe mais baixa dentro do tecido social, condições que conflitam com os regramentos internacionais de proteção aos direitos humanos contra todo tipo de violação ou tratamento desumano ou degradante.
Suscita-se em muito, duvidas e questionamentos, base do método cientifico, em torno do tema, cujo Senado Federal enfrentado pelo PLS nº 554/11, almejando-se a regulamentação constitucional e legal da obrigatoriedade de apresentação de toda pessoa presa incontinenti a presença do juiz tão logo ocorra a prisão em flagrante no estado brasileiro.
Projeto esse que tramita na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, sujeito a emendas que contemplem além de obrigatoriedade de apresentação de todos os presos ao juiz em 24 horas, também a regulamentação da citada Audiência de Custódia com a presença da defesa e da acusação (advogado, defensor público e ministério público).
Convergem e divergem as opiniões várias no referido projeto PLS nº 554/11, mas que são compartilhadas entre os defensores desse instrumento ora denominadoAudiência de Custódia para o enquadramento do sistema penal e processual brasileiro aos pactos e tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Brasil.
Ressaltasse que, o Brasil efetivamente é signatário do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (ONU) e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos denominada Pacto de São José da Costa Rica e vários instrumentos internacionais que versam sobre a condução do criminoso a presença de um juiz ou autoridade, visando a garantia da dignidade da pessoa humana.
Nesse sentido, a Magna Carta de 1988 estabelece uma reserva jurisdicional em seu artigo 5º, inciso LXI, ao afirmar que ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente.
Também a Constituição Federal de 1988 estabelece ainda, em seu artigo 5º, LXIV, que o detido tem o direito de saber a identidade do responsável por sua prisão. Os tratados internacionais que versam sobre direitos humanos e a própria constituição brasileira trazem em suas normas a salvaguarda de direitos e garantias fundamentais, convergindo com o ratificado instrumento de proteção aos direitos a dignidade da pessoa humana de uma forma geral.
Noutra senda o delegado de polícia detém a competência e o amparo constitucional que o habilita e autoriza ao exercício de suas atribuições a exemplo de sua discricionariedade em emitir juízo de valor para o indiciamento de uma pessoa investigada, bem como no arbítrio de uma fiança ao preso para garantir-lhe a liberdade provisória ou ainda na convalidação da prisão em flagrante, que adentra em seu poder discricionário diante da legalidade ou não de uma prisão em flagrante, a fim de convalidar os atos e determinar ou não o recolhimento do preso ao sistema penitenciário, no exercício das funções de polícia judiciária e de apuração de infrações penais estabelecida no artigo 144 da CF88.
Insta frisar que, a Lei nº 12.830 soma-se ao arcabouço legal e constitucional ao estabelecer regras que garantam autonomia ao delegado de polícia em suas atividades, no interesse público, garantindo ainda a necessidade de fundamentação para que o mesmo seja removido de sua localização e que a previsão legal do ato de indiciamento seja privativo do delegado de polícia, não obstante, ser–lhe dado o mesmo tratamento protocolar dispensado aos magistrados, promotores e advogados, entabulados como garantia legal.
Desta forma, ao se adotar de forma precipitada um modelo de Audiência de Custódia no qual o excelso julgador forme um juízo de valor balizado em precárias condições, sem maiores possibilidades conjunturais para se formar uma homologação segura do convencimento acerca dos indícios de materialidade e autoria da conduta delitiva, caminha-se então na contramão do direito.
Argumentos e opiniões não faltam de todos os lados, mas é claro que o modelo atualmente em vigor é inconstitucional, diante do sistema procedimental vigente, pois, o delegado realiza uma detida análise da situação fática sob vários aspectos, inclusive o da legalidade, da materialidade delitiva encimada por critérios jurídicos objetivos, desta forma não se pode jamais efetivar prisão ilegal ou sem justa causa.
Ressalta-se que a obrigação de apresentação precária dos presos perante o juiz em Audiência de Custódia torna-se prejudicada, porque certamente exigiria uma maior e melhor organização da metodologia e sistemática envolvidas, tais como: amparo constitucional, presença do defensor público e/ou do advogado, presença do ministério público e emprego dos agentes de segurança em conformidade com suas atribuições constitucionais no desenvolvimento de um trabalho conjunto para se implementar uma proposta razoável de segurança pública com ações que acolham os casos de prisões em flagrantes.
Todavia, na atual forma em que se encontra a Audiência de Custódia, percebe-se que os objetivos da lei não são alcançados, que vão desde potenciais nulidades processuais inevitáveis que envolvem a prisão, bem como, o desgaste das instituições policiais que continuam enxugando gelo ao tempo das prisões reiteradas dos mesmos indivíduos em curto período, formando um círculo vicioso que gera a insatisfação dos advogados em relação a defensoria, alegando tratamento desigual praticado pelo estado, acarretando com isso o cerceamento de defesa.
Portanto, para a administração pública, que atua na contramão do interesse da sociedade, o atual modelo Audiência de Custódia é mais vantajoso, na medida em que não é preciso investir no sistema prisional para o aumento de vagas, por não gastar recursos públicos com os vários presos que são postos reiterada e rapidamente em liberdade com medida cautelar ou não. Ainda que o crime de homicídios venha diminuindo consideravelmente, o mesmo não reflete a realidade dos crimes patrimoniais que estão em ascensão no seio da sociedade, principalmente, nas circunstancias atuais da crise econômica brasileira.
A Audiência de Custódia compromete os custos com gastos e investimentos públicos na área de segurança pública, cuja área detém parcos e ínfimos recursos materiais e humanos, que são gritantemente escassos, estando ainda totalmente comprometidos com o potencial desvio de função diante da intensa demanda de custódia prisional e transporte de presos, aumentando em muito o comprometimento da policia judiciaria com outras funções, o que exige uma urgente contratação para repor os escassos efetivos policiais, do contrário expõem-se a risco toda a sociedade, pela reiterada alternância de presos libertos que ficam saracoteando pelas ruas em razão de seus crimes não pagos.
Nesse diapasão, há que se ressaltar que algumas mudanças, transformações e quebra de paradigmas são necessárias, indo desde a regulamentação legal e constitucional, com adoção de critérios mais objetivos e transparentes, realinhamentos das atribuições das policias, reenquadramento constitucional de todo o cenário envolvido e discussão com ampla participação de toda a sociedade brasileira.