No dia 28 de novembro de 2012, o Núcleo de Repressão às Organizações Criminosas (Nuroc), da Secretaria de Estado da Segurança Pública e Defesa Social do Espírito Santo, deu início à operação denominada “Navajo”. Dessa data em diante até o dia 16 de março de 2013 – quase quatro meses –, seus delegados e investigadores, amparados por ordem da Justiça, interceptaram 29 linhas telefônicas, dentro da investigação que tinha, inicialmente, a finalidade de apurar informações a respeito de uma organização criminosa com sede na Grande Vitória e com extensão para outros municípios capixabas. A organização é voltada para a exploração de máquinas caça-níquel, bingos e jogo do bicho.
O foco das investigações se dirigiu para Guarapari, porque os barões dos jogos clandestinos estavam invadindo áreas naquela cidade, seguindo, assim, planejamento elaborado pelos chefões dos jogos dos Estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo, de quem os capixabas são associados e subordinados.
Naquela ocasião, a política em Guarapari pegava fogo. Um mês depois de iniciada a Operação Navajo, o ex-prefeito Edson Magalhães já havia deixado o mandato e tentou disputar a eleição de 2012, mas foi barrado pela Justiça Eleitoral.
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) determinou nova eleição para prefeito de Guarapari porque o candidato mais votado nas eleições de outubro de 2012, Edson Magalhães, disputou a eleição municipal de 2012 com a candidatura indeferida. Em 2006, ele era vice-prefeito e assumiu a administração de Guarapari por um ano e oito meses devido à cassação do então prefeito.
Eleito em 2008, Edson Magalhães tentou disputar a reeleição em 2012, mas foi barrado pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE-ES) que entendeu que ele estaria tentando um terceiro mandato. Para o TSE, o candidato já havia exercido dois mandatos consecutivos.
As investigações da Operação Navajo aconteceram, então, no meio da disputa da segunda eleição, vencida por Orly Gomes da Silva (DEM), aliado de Edson Magalhães. O segundo pleito ocorreu em 3 de fevereiro de 2013 e Orly Gomes recebeu 24.709 votos. Os candidatos derrotados foram Carlos Von Schilgen (23.019 votos); Ricardo Rosetti Conde (7.592); e Wederson Brambati Maioli (2.137).
Para surpresa dos delegados e investigadores do Nuroc, o que seria um trabalho para investigar a máfia dos caça-níqueis acabou descobrindo outros crimes, como o tráfico de drogas, armas e munições; crimes contra a administração pública municipal; e crimes eleitorais. No meio da investigação, os policiais do Nuroc também descobriram uma trama para matar o então presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, desembargador Pedro Valls Feu Rosa e outras autoridades, inclusive delegados do próprio Nuroc (http://elimarcortes.blogspot.com.br/2015/03/organizacoes-criminosas-ameacaram-matar.html.)
O Blog do Elimar Côrtes teve acesso com exclusividade ao Relatório de Análise da Operação Navajo. Foi descoberto que os integrantes da organização criminosa “prestam serviços de manutenção e assistência técnica para as máquinas caça-níqueis de contraventores de cidades do interior do Estado”.
Ficou ainda evidenciada que “a relação entre os investigados não se restringe apenas numa faceta da organização – o lado financeiro; além disso, há uma diplomacia das relações firmadas, como um respeito mútuo de território explorado entre os contraventores.”
No relatório, os investigadores e delegados ressaltam que a Operação Navajo teve início em novembro de 2012 e tinha o objetivo de “apurar a ação de uma organização criminosa que se estruturou na Grande Vitória e teria se estendido suas práticas para outros municípios, mormente, o município de Guarapari, onde, inclusive, a organização criminosa seria acusada de contar com a conivência de agentes públicos do Poder Legislativo daquele município, além de agentes policiais.”
Em outro trecho do relatório, o Nuroc informa que “durante o trabalho de interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça, restou provado que diversos suspeitos de fazerem parte de tal organização foram se destacando não propriamente pela prática da exploração de jogos de azar, mas também por outros crimes como tráfico de drogas, venda de armas e munições, bem como crimes contra a administração pública e crimes eleitorais.”
Para o Núcleo de Repressão às Organizações da Secretaria de Estado de Segurança Pública, no entanto, as interceptações telefônicas e as diligências de campo realizadas por agentes do Nuroc não foram suficientes para o fornecimento de elementos comprobatórios e de convicção no que concerne à relação de cumplicidade entre alguns dos investigados, bem como de correlação entre as ações criminosas dos envolvidos.
Porém, ressaltam os investigadores, “restou provado que, na verdade, acabou-se chegando a indícios de quatro distintos grupos de crimes praticados, separadamente: exploração de jogos de azar e os crimes correlatos (jogo do bicho e máquinas caça-níqueis); tráfico de drogas, armas e munições; crimes contra a administração pública municipal; e crimes eleitorais”.
O Nuroc decidiu realizar a análise compartimentada dos quatro grupos de crimes, indicando os diálogos que demonstrem a existência de indícios de participação em delitos de cada modalidade. Este blog teve acesso ao completo Relatório de Análise, contendo, inclusive, os nomes dos investigados. No entanto, como as investigações ainda estão em andamento, agora no âmbito do Ministério Público Estadual e na Procuradoria Regional da República – crimes eleitorais –, não vai divulgar nomes das pessoas e empresas envolvidas em supostos crimes de corrupção. O relatório foi encerrado em 24 de maio de 2013.
Em suas conclusões, o Nuroc informa que, em relação aos crimes contra a administração pública, “com as investigações sobre os políticos locais, em vista das eleições municipais que ocorreram no mês de fevereiro de 2013 em Guarapari, acabou-se por constatar a existência de diversos crimes eleitorais praticados durante o período eleitoral no próprio dia da eleição, tais como boca de urna, compra de votos, promessa de cargos públicos, transporte de eleitores dentre outros praticados em desfavor do livre direito de escolha do eleitor”.
O relatório final deixa claro que “verificou-se que todo o pleito eleitoral de Guarapari ocorrido no mês de fevereiro de 2013 foi corrompido pela prática dos diversos crimes eleitorais praticados pelas diversas coligações”.
O Nuroc reserva um grande capítulo para o crime contra a Administração Pública em que uma mesma empresa teria vencido licitações supostamente fraudulentas depois de participar também de campanhas eleitorais, com a compra de votos, principalmente. Esta empresas teria vencido licitações irregulares nos municípios de Guarapari, Serra, Cachoeiro de Itapemirim, Anchieta, Itapemirim, Cariacica e Vila Velha.
Em Guarapari, a mesma empresa participou e venceu três licitações, com um montante superior a R$ 3 milhões, entre 2009 e 2011. Na Serra, a mesma empresa venceu três licitações entre 2008 e 2010, obtendo um total de R$ 106.391.451,63 com os contratos.
Já em Cachoeiro, a empresa lucrou R$ 2.952.349,26 com três contratos, entre 2008 e 2011. No município vizinho de Itapemirim, o lucro foi maior: R$ 9.715.702,40 com dois contratos de serviços, entre 2008 e 2012. Em Anchieta, obteve R$ 1.895.500,00 com dois contratos, entre 2009 e 2011.
Em Cariacica, no período compreendido entre 2009 e 2010, a mesma empresa obteve ganhos de R$ 3.137.534,17 com dois contratos. E, em Vila Velha, a firma venceu um pregão, em 2011, e faturou R$ 285.960,00. Estes são apenas alguns dos exemplos citados no Relatório de Análise do Nuroc.
Ao final do relatório, os delegados do Nuroc dão por encerrada a primeira fase da Operação Navajo, sugerindo, no entanto, que cada modalidade de crime fosse encaminhada a um órgão responsável pela continuidade das investigações. Assim, para a Delegacia de Tóxicos e Entorpecentes da Polícia Civil (Deten) foram encaminhadas informações (e provas) a respeito dos crimes de tráfico de drogas, armas e munições.
Ao Tribunal Regional Eleitoral foi enviado relatório relativo aos crimes eleitorais durante o pleito de 2013 em Guarapari, enquanto ao próprio Nuroc ficou a responsabilidade de dar prosseguimento às investigações de crimes relacionados à exploração de jogos de azar e crimes correlatos. Também foi comunicado à Justiça Estadual a existência de supostos crimes de corrupção (crimes contra a Administração Pública) cometidos por autoridades com foro privilegiado.
Todas as investigações ou foram paralisadas ou continuam em andamento, ainda de modo muito lento. Em consulta ao site do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo não consta nenhuma informação sobre abertura de Inquérito Policial para investigar os crimes já apontados pelo Nuroc.
São dezenas de pessoas e pelo menos duas empresas privadas investigadas, além de sete prefeituras. Os nomes delas, entretanto, não aparecem no site do TJES como alvo de investigação, pelo menos no que diz respeito à Operação Navajo.