O juiz federal substituto de Colatina, Guilherme Alves dos Santos, condenou quatro agentes públicos e um empresário em uma Ação Civil Pública pela acusação de atos de Improbidade Administrativa, proposta pelo Ministério Público Federal. Eles foram denunciados por supostas irregularidades praticadas na execução do Convênio 024/2008, celebrado entre o Estado do Espírito Santo e o Município de Alto Rio Novo, com utilização de verbas oriundas do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (Programa Nacional de Apoio ao Transporte Escolar – PNATE).
Os servidores teriam ofendido princípios constitucionais e regras atinentes à dispensa de licitação, gerando prejuízos ao erário. Foram condenados, em sentença prolatada no dia 5 de março deste ano, a devolver R$ 1.519.192,60 aos cofres públicos, além de pagamento de multa. Na visão do Ministério Público Federal, “não foram observadas formalidades pertinentes à dispensa de licitação alusiva a 10 contratos/aditivos celebrados em 2008.
De acordo com o MPF, em 8 de fevereiro de 2008, fora requerida pela então secretária Municipal de Educação, Nilza Borel Ribeiro, autorização para contratação emergencial (sem licitação) de serviços de transporte escolar, devido à falta de convênio firmado entre o município de Alto Rio Novo e o governo do Estado, e que tal situação seria regularizada posteriormente mediante licitação. O Ministério Público Federal apresenta o que entendeu como irregularidades nos 10 contratos.
De acordo com o Ministério Público Federal, ALDO SOARES DE OLIVEIRA (ex-prefeito de Alto Rio Novo), GILDA DE ALMEIDA BASTOS (secretária de Educação de Alto Rio Novo em 2008), ÂNGELA AMÉLIA CASELI (presidente da comissão de licitação em 2008), MÁRIO DE FREITAS (membro da comissão de licitação em 2008) e MÁRIO LUIZ DA SILVA( sócio e efetivo administrador da empresa RIOTUR) “violaram os princípios intrínsecos à administração pública ao colaborarem para a formalização de contratos irregulares com superfaturamento.”
Ainda segundo o MPF, os denunciados “incorreram nas infrações insculpidas no art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa, ante ao desrespeito aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade e eficiência e no art. 10, inciso VIII do mesmo diploma legal, por ter havido dispensa de licitação de modo indevido.”
Na sentenla, o juiz federal Guilherme Alves dos Santos observa que o Ministério Público Federal “assenta que o periculum in mora, no que tange às Ações de Improbidade, não decorre da intenção do agente em dilapidar o patrimônio, mas da magnitude dos fatos e do prejuízo causado aos cofres públicos e que, assim, tal requisito, necessário para concessão da medida cautelar, é presumido nas ações de Improbidade.”
Na ação, o MPF requereu: I) medida cautelar, inaudita altera pars, para decretar a indisponibilidade de bens dos requeridos de tantos quantos bastem para ressarcimento integral do dano e pagamento da multa requerida, através de: 1) Bloqueio de valores via BACENJUD, no total de R$ 911.515,56 (valor do dano e aproximado da multa); 2) Quebra de sigilo fiscal dos réus, permitindo a obtenção das duas ultimas declarações de imposto de renda; II) A expedição de ofícios aos cartórios de registro de imóveis correspondentes para efetivação de bloqueio de qualquer transferência ou gravames e inscrição da existência da presente ação na matricula dos referidos imóveis, quando da posse das declarações; e III) A expedição de ofício ao Diretor geral do DETRAN/ES para bloqueio de veículos.
Por meio de decisão judicial, determinou-se o bloqueio de valores via BACENJUD, quebra de sigilo fiscal, bloqueio de veículos via RENAJUD, intimação da UNIÃO FEDERAL, MUNICÍPIO DE ALTO RIO NOVO, ESTADO DO ESPÍRITO SANTO para manifestação nos termos do artigo 17, § 3º, da Lei nº 8.429/92 c/c artigo 6º, § 3º, da Lei nº 4.717/65, intimação do Ministério Público Estadual do ES para, querendo, ingressar no feito, conforme disposto no artigo 5º, § 5º, da Lei nº 7.347/85. Além disso, determinou-se a notificação dos requeridos para, querendo, apresentarem manifestação por escrito, nos termos do artigo 17, § 7º, da Lei nº 8.429/92.
Defesa dos acusados
O empresário Mário Luiz da Silva apresentou manifestação, alegando tratar-se de pessoa honesta e que a notícia da existência de um processo de improbidade contra sua pessoa, o fez passar por constrangimentos e humilhações. As alegações firmadas nos atos do inquérito administrativo demonstrariam que nunca houvera pagamento de vantagens para ganhar processo licitatório; que os erros do procedimento licitatório não lhe poderiam ser atribuídos; que os fatos descritos na denúncia teriam sido narrados de forma genérica, não conseguindo o “Ministério Público Federal comprovar qualquer participação do requerido em desvio de dinheiro público.”
O ex-prefeito Aldo Soares de Oliveira alegou nos autos que não tinha poderes ou condições para direcionar as licitações; que não intencionou nem obteve ganhos ilegais; que a responsabilidade do setor de licitações era dos servidores Mário de Freitas e Ângela Amélia Caseli; que o insucesso dos certames, a urgência na prestação dos serviços e a existência de uma única empresa de transportes justificariam as contratações do serviço.
Ainda de acordo com o ex-prefeito Aldo, o Município não teria sido lesado com as contratações; que o MPF deixou de consignar na denúncia todos os dados dos contratos firmados; que o valor pago dos serviços efetivamente prestados seria R$ 794.346,52 e o valor orçado seria de R$ 796.446,80, ou seja, um saldo credor de R$ 2.034,04 para o Município. Para o ex-prefeito, para tipificação da improbidade administrativa deveria ter sido demonstrado o dolo/culpa do requerido e, por fim, não havendo enriquecimento ilícito e nem prejuízo ao erário, mas inabilidade do administrador, não cabem as punições previstas na Lei nº 8.429/92.
Membro da Comissão de Licitação de 2008, Mário de Freitas alegou, em resumo, que o MPF se equivocara ao afirmar que ele seria um dos responsáveis pela contratação e respectiva dispensa de licitação, não se atentando sobre a função de cada servidor público, “que apenas fazia parte da Comissão de Licitação e não do Setor de Contratos cujos atos sempre envolveram apenas o Prefeito Aldo Soares de Oliveira e a Secretária de Educação”.
Disse que não existiu, em momento algum, participação do requerido na contratação ou qualquer aditamento com a empresa RIOTUR; que o setor de licitação realizava apenas o procedimento licitatório, ao passo que a contratação e aditamentos eram realizados pelo Setor de Contratos; que a Comissão de Licitação realizara diversos procedimentos licitatórios com a finalidade de encontrar uma empresa apta a prestar o serviço de transporte escolar, sendo que não obtivera êxito por ausência de empresa cumpridora dos requisitos mínimos ou por constar como “deserto”.
Ângela Amélia Caseli, que foi a presidente da Comissão de Licitação, apresentou manifestação preliminar, alegando, de forma semelhante a Mário de Freitas, que cumprira de forma lídima as atribuições de seu cargo, que não seria responsável pela contratação e dispensa de licitação e, sim, o Prefeito e a Secretária de Educação, que o ato administrativo só configura ilícito de improbidade quando revelar indícios de má-fé ou dolo do agente e que o MPF não apontara de forma clara quais foram os erros cometidos pela requerida.
Já a ex-secretária de Educação de Alto Rio Novo, Gilda de Almeida Bastos, disse que, ao contrário do descrito pelo Ministério Público Federal, a sua conduta não pode ser considerada ímproba, de má-fé, uma vez que não possui conhecimento técnico jurídico, sendo as minutas dos contratos submetidas à análise da Procuradoria do Município e que nunca fora alertada sobre qualquer ilegalidade nas cláusulas dos contratos; que nunca agiu motivada por dolo ou culpa grave e, sim, preocupada com a possibilidade de paralisação do transporte escolar; que não fora alertada da impossibilidade de prosseguimento do contrato existente; que nunca obteve qualquer vantagem durante o tempo em que ocupou a pasta da secretaria da educação; que não foi a única a responder nem apresentar justificativas para as contratações diretas em 2008, fato que comprovaria que tais condutas eram previamente orientadas, que se trata de pessoa simples, de hábitos simples, amplamente conhecida em Alto Rio Novo cujo maior patrimônio seria seu nome, que a requerida jamais buscou burlar o caráter competitivo do procedimento licitatório, muito menos causar dano ao erário.
O juiz federal Guilherme Alves dos Santos fundamental cada item de sua decisão. E concluiu que “é evidente a ocorrência de dano ao erário no caso em tela, tendo em vista que, amparados por uma suposta urgência (processo 000589/2008), foram realizadas cotações prévias de valores em empresas aptas à prestar o serviço, tendo a própria empresa RIOTUR – TRANSPORTES E TURISMO LTDA – ME orçado o serviço anual no valor de R$ 490.508,00, tendo, contudo, o valor do serviço prestado custado aos cofres públicos o montante de R$ 794.346,52. Portanto, sobrepondo o valor orçado inicialmente às operações feitas, denota-se que o poder público pagou um excedente de mais de R$ 300 mil”, descreve o magistrado.
Guilherme dos Santos diz mais: “Dúvidas não restam, a meu sentir, que houve dano ao erário nesse ponto. E tal prejuízo (sacrifício de verbas da educação, tão escassas), conforme apontado pelo MPF, e devidamente comprovado ao longo da instrução processual, deve ser imputado aos Requeridos.”
As condenações
1. Ressarcimento integral do dano, solidariamente pelos Requeridos, ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, ao Estado do Espírito Santo e ao Município de Alto Rio Novo/ES, no valor de R$ 303.838,52 (trezentos e três mil oitocentos e trinta e oito reais e cinqüenta e dois centavos), relativo ao Convênio nº 024/2008, (sendo R$ 9.145,55 devidos à União, R$ 247.021,04 ao Estado do Espírito Santo e R$ 47.641,93 ao Município de Alto Rio Novo, valores proporcionais aos seus dispêndios no convênio). Os valores deverão ser atualizados desde 12/12/2008, data do último aditivo contratual realizado naquele ano (nº 105/2008), tendo em vista o fracionamento do dano, ocasionado pela celebração de vários contratos irregularmente. Juros a partir da citação, nos termos do Manual de Cálculos do CJF;
2. Suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 05 (cinco) anos a Aldo Soares De Oliveira, Gilda De Almeida Bastos e Mário Luiz Da Silva;
3. Proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário a Aldo Soares De Oliveira, Gilda De Almeida Bastos e Mário Luiz Da Silva;
4. Multa Civil nos percentuais de 10% (Ângela Amélia Caseli e Mário de Freitas) e 20% (Aldo Soares De Oliveira, Gilda De Almeida Bastos e Mário Luiz Da Silva) do valor do dano causado, devidamente atualizado, nos parâmetros lançados no item 1 acima;