Durante décadas, o Estado do Espírito Santo explorou a figura do subdelegado de Polícia Civil. Havia, na maioria dos bairros da Grande Vitória, e nos municípios do interior, a sede de uma Subdelegacia. Os subdelegados eram “pau para toda obra”. Subiam morros, ocupavam becos, invadiam matas, tudo com uma finalidade: combater a violência. Encaravam de perto os mais famosos pistoleiros e jagunços capixabas e mineiros, que vinham agir no Estado. Eram mais destemidos e corajosos do que muitos delegados da época.
Naquela ocasião, não existia a Polícia de Carreira. Delegados e subdelegados eram nomeados pelo Governador do Estado. Por isso, era totalmente normal o delegado e o subdelegado serem puxados de dentro da Polícia Militar ou escolhidos por cidadãos da sociedade e até mesmo de dentro da Polícia Civil. Os subdelegados faziam o mesmo trabalho de um delegado: investigação, inquérito policial e outras missões, só que em distritos menores.
Todavia, veio a Constituição Federal de 1988 e criou a Polícia Civil de carreira, obrigando que, daquela data em diante, somente se entraria na instituição por meio de concurso público – o que é justo, necessário, legal, republicano e democrático. A Constituição acabou, inclusive, com o cargo de subdelegado de Polícia.
Muitos que ocupavam o cargo de subdelegado de Polícia até 1988, porém, continuaram trabalhando na instituição. Não poderiam ser exonerados mais, até porque, antes de serem nomeados subdelegados, já ocupavam outros cargos na Polícia Civil. Aos poucos, aqueles velhos guerreiros foram se aposentado ou morrendo.
Hoje, são apenas seis subdelegados aposentados ainda vivos, além de duas pensionistas (viúvas de subdelegados). Só que eles foram abandonados pelo Estado do Espírito Santo e até por aqueles que hoje são delegados de Polícia Civil – muitos, inclusive, nomeados pós-Constituição de 1988 sem concurso público, mas porque adquiriram direito por serem formados em Bacharel em Direito – o que também é justo.
O injusto, entretanto, é o que a Polícia Civil e o Estado fizeram com aqueles velhos guerreiros. Hoje, um subdelegado aposentado recebe R$ 600,00 por mês. O salário deles é estabelecido pela Lei Complementar nº 232/2002.
Ainda há uma luz ao fim do túnel, graças ao empenho do atual presidente do Sindicato dos Policiais Civis do Estado do Espírito Santo (Sindipol), Jorge Emílio Leal, de sua diretoria e do deputado estadual Euclério Sampaio.
Em 2011, o deputado Gilsinho Lopes, que é delegado de Polícia licenciado, protocolou na Assembleia Legislativa Indicação Legislativa número 746/2011, que sugeria ao Governo do Estado a propositura de projeto de lei visando a promover o “reenquadramento” do cargo comissionado de Subdelegado de Polícia Civil no cargo de Delegado Especial.
O pedido foi analisado pela Procuradoria Geral do Estado, que, por meio de análise feita pelo procurador Bruno Colodetti, concluiu que a pretensão inicial de Gilsinho Lopes era inconstitucional, “porque o Supremo Tribunal Federal sempre rechaçou o acesso a cargos efetivos sem a prévia aprovação em concurso público”.
No entanto, o procurador Bruno Colodetti recomendou que “o alcance da pretensão legislativa seja efetuado mediante projeto de lei que vise tão-somente a majorar o vencimento dos servidores aposentados nos extintos cargos de provimento em comissão de Subdelegado de Polícia, como já ocorreu, aliás, por intermédio da edição da Lei Complementar nº 232/2002”.
Nesta toada, a intenção dos subdelegados aposentados é equiparar seus vencimentos ou com os de delegados em início de carreira ou com investigadores. Tudo que eles querem é uma remuneração melhor para viver com mais dignidade, como os demais colegas de profissão também já aposentados.
A sugestão da PGE voltou ao gabinete do deputado Gilsinho Lopes, mas não andou. Por isso, agora, o Sindipol e os subdelegados vão reivindicar junto ao deputado Euclério Sampaio, que é investigador de Polícia aposentado e presidente da Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legisltiva, a abraçar a causa. Gilsinho presidiu a Comissão nos últimos quatro anos. Se ele tivesse apresentado a Indicação ao ex-governador Renato Casagrande, conforme a Procuradoria Geral do Estado sugeriu, a situação já estaria resolvida. Gilsinho Lopes era da base governista na gestão de Casagrande, que sempre atendia suas reivindicações.
“Só queremos viver com dignidade”, diz subdelegado Milton Francisco de Oliveira
O senhor Milton Francisco de Oliveira é um dos subdelegados que sofrem com o baixo salário. Aposentou-se em 2007. Entrou na Polícia Civil em 1973, como guarda de presídio – outro cargo já extinto. Trabalhou na antiga Casa de Detenção da Glória e no extinta Penitenciária de Pedra D’Água, ambas em Vila Velha.
Foi subdelegado em Brejetuba, São Pedro (Vitória), Itacibá, Flexal, Piranema, Vila Capixaba – tudo em Cariacica –, além de Cariacica-Sede.
“Naquela época, a gente trabalhava armado com revólver 32 ou 38. A viatura era um Fusca. Fizemos muito pelo Estado do Espírito Santo, que hoje vira as costas para nós. Se eu tivesse recusado a nomeação para o cargo de subdelegado e continuasse como carcereiro (guarda de presídio), hoje eu seria um agente de Polícia aposentado e meu salário seria muito maior do que os R$ 2 mil (incluindo outros benefícios) que ganho como subdelegado. Lutamos porque só queremos viver com dignidade”, diz, emocionado, Milton Francisco de Oliveira, 65 anos.
“Até nossa carteira vermelha, de identificação, a Corregedoria se recusou a entregar. Mas, graças ao então chefe de Polícia, doutor Júlio Cesar Oliveira Silva, em 3 de junho de 2009, à unanimidade, o Conselho de Polícia Civil aprovou a concessão da carteira aos subdelegados aposentados”, agradece Milton de Oliveira.