A Corregedoria Geral da Polícia Militar do Espírito Santo levou nove meses, mas, enfim, conseguiu concluir sindicância que apurou a conduta de 16 policiais militares – sete cabos e nove soldados – detidos em flagrante pela acusação de fazer segurança particular para a Rodosol, no pedágio da Terceira Ponte, em Vitória, durante manifestações populares. A Corregedoria concluiu que os militares teriam cometido transgressão da disciplina – este foi também o motivo da autuação em flagrante há nove meses atrás. Por isso, vão responder a Processo Disciplinar Administrativo (PAD).
Na época, os 16 policiais teriam sido contratados por um consultor de segurança. Dos 16 policiais, oito eram do 4º Batalhão (Vila Velha), seis do Batalhão de Missões Especiais e dois do 7º Batalhão (Cariacica). Na iniciativa privada, os militares tinham a missão de proteger as catracas da Terceira Ponte e foram orientados a trabalhar como se fossem da Tropa de Choque da PM.
Os policiais, no dia em que foram presos por oficiais do BME, estavam de folga e armados com “paint ball”. Supostamente, estariam atacando manifestantes, para reprimir os protestos e evitar que eles invadissem escritórios da Rodosol.
A sindicância foi delegada ao major Pedro César de Lima. No relatório, encaminhado ao Ministério Público Militar Estadual, é informado que os policiais foram investigados por “haverem, em tese, participado da atividade de segurança patrimonial das instalações da administração da Rodosol (praça do pedágio da 3º Ponte), no dia 24 de junho de 2013, ocasião em que ocorriam manifestações públicas de caráter reivindicatório.”
Ainda segundo a sindicância, por volta das 17h30 de 24 de junho do ano passado, os oficiais que comandavam o policiamento na região da Enseada do Suá foram informados que policiais militares à paisana estariam realizando segurança na Terceira Ponte. A informação chegou ao então chefe do Comando de Polícia Ostensiva Especializada, o coronel João Henrique Cunha, que comandava pessoalmente o policiamento na região, a afim de evitar depredações e ataques a patrimônio público e privado e garantir a realização de manifestações pacíficas.
O coronel Henrique acionou o comandante do BPM, tenente-coronel Alexandre Ofranti Ramalho, que, por sua vez, determinou outros oficiais a seguirem à praça do pedágio. Um capitão foi à sede administrativa da Rodosol com a finalidade de averiguar se havia no local algum policial militar atuando como segurança privado.
O capitão chegou ao estacionamento para funcionários da concessionária e logo viu seis pessoas conversando. Após interpelá-los, tomou conhecimento de que se tratava de policiais militares e que “estariam naquele local a serviço do civil M.R.V., para realizar segurança privada”, conforme consta no relatório da sindicância.
No mesmo instante, outros policiais militares foram sendo identificados, “todos com a mesma função de proteção ao patrimônio da concessionária.” Por ordem do coronel Ramalho, todos os 16 policiais foram conduzidos à Corregedoria da PMES, onde foram autuados em flagrante disciplinar, por haver infringido “o art. 133, Inciso II, alínea “q” e Art. 144, Inciso II, alínea “a”, na forma do Art. 11, § 2º do Regimento Disciplinar dos Militares Estaduais.”
O encarregado da sindicância, major Pedro César de Lima, ressalta na sindicância apenas que, “embora os Policiais Militares tivessem sido visualizados no interior das instalações da administração da concessionária responsável pela 3ª Ponte, não foram flagrados efetivamente executando segurança privada”.
Por isso, ao assinar a solução da sindicância, o corregedor geral da PM, coronel Ilton Borges, salienta que “entende o Encarregado que existe a ‘tentativa’ de transgressão da disciplina. Aduz o Encarregado que os Sindicados embora observados/flagrados no local em que ocorreriam as manifestações, local esse que inclusive já havia sido objeto de destruição por parte de vândalos, não foram encontrados no efetivo exercício da atividade de segurança. Disse também não existirem imagens que comprovem a participação dos civis M.R.V. e C.J. no agenciamento ou ainda na contratação desses militares com o fito de ofertar proteção ao patrimônio da concessionária RODOSOL.”
Porém, mesmo com ressalvas, a Corregedoria entendeu que “a simples presença” dos 16 policiais nas instalações da Rodosol “no dia dos fatos objeto desta apuração indicam que esses estariam naquele local com a finalidade de prestarem serviço de vigilância, pelo que nessa ação encontrou indícios de transgressão da disciplina a ser apurado em procedimento administrativo pertinente.”
O corregedor geral da PM, coronel Ilton Borges, concordou com o parecer do encarregado da sindicância, mas ressalvou que “a simples presença dos militares naquele local já caracteriza o exercício da atividade ilegal de segurança, até porque esta, para sua consecução, não depende necessariamente da prática de atos materiais a demonstrar a ação dos que ali agiam. É dizer: a ação efetiva contra algum dos manifestantes seria mero exaurimento da conduta”.
Um dia após a detenção dos 16 policiais, o próprio comandante geral da PM, coronel Edmilson dos Santos, já havia reconhecido que os militares teriam cometido transgressão da disciplina. No mesmo dia 24 de junho de 2013, o comandante do BME, tenente-coronel Ramalho, afastou seis policiais de sua unidade. Hoje, eles se encontram diluídos entre o 1º e 4º Batalhões.
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Na época, o comandante geral da PM, coronel Edmilson dos Santos, se irritou com a “atitude irresponsável dos policiais e de que os contratou”. O comandante chegou a declarar que os militares, supostamente, estariam atacando manifestantes, para reprimir os protestos e evitar que eles invadissem escritórios da Rodosol. Na ocasião, Edmilson dos Santos informou que somente seguranças civis – que são empregados de uma empresa de um consultor de segurança teriam atacado os manifestantes: “Os policiais foram descobertos antes fazerem os ataques”, disse o coronel Edmilson dos Santos.
Ainda na ocasião, o comandante geral da PM disse que o equipamento utilizado pelo seguranças do consultor e que estavam também com 16 policiais militares pode ferir as pessoas atingidas e até causar cegueira. O coronel Edmilson dos Santos lembrou que a prática do “paint ball” exige equipamentos (vestimentas) de segurança e não pode ser feita em vias públicas. Edmilson dos Santos também apontou outra falha grave por parte dos policiais e de seus contratantes. Disse que os militares estavam prestando um serviço paralelo ao praticado oficialmente pela Polícia Militar, com sua tropa de elite e com o policiamento ostensivo, que foi o de garantir a segurança dos manifestantes.
“Eles (policiais) estavam numa ação totalmente errada. Faziam um serviço particular em que poderiam gerar graves problemas para a Polícia Militar caso a população se rebelasse contra o ataque deles (policiais e seguranças particulares) com as armas de paint ball. Eles estavam interferindo numa ação policial. Poderiam ter deixado pessoas cegas e com outras lesões”, disse o coronel Edmilson dos Santos.