Parece mentira, do tipo “pegadinha” do Faustão, mas pelo jeito nem a decisão firme da Justiça capixaba em abrir um espaço para que denúncias de tortura nos presídios do Espírito Santo venham à tona está intimidando uma parte dos agentes penitenciários lotados na Secretaria de Estado da Justiça (Sejus). Eles continuam praticando, segundo denúncias, ações de tortura nas cadeias. E, desta vez, são acusados de torturar seus próprios colegas que estão presos em celas do seguro em um dos presídios localizados na Grande Vitória. É como se o Estado, por intermédio da Sejus, ao contratar esses servidores, tenha decretado: “Vocês estão livres para torturar”.
Vale ressaltar, todavia, que o “torturômetro” do Tribunal de Justiça do Espírito Santo ficou 12 dias sem receber uma denúncias de tortura em presídios. O “torturômetro” voltou a zerar nesta quinta-feira (12/04).
Relatos encaminhados ao Núcleo de Comissões da Presidência do Tribunal de Justiça do Estado indicam que as vítimas são agentes penitenciários que estão detidos na unidade prisional.
Segundo a denúncia, agentes penitenciários acusados de crimes e que estão detidos por ordem judicial em uma cadeia de Viana estariam sofrendo maus tratos e humilhações como cusparada nas marmitas servidas aos detentos, suspensão do banho de sol por mais de 30 dias e falta de remédios e papel higiênico.
Os agentes presos são também intimidados pelos próprios agentes penitenciários. “Nossos colegas chegam na nossa cara e nos xingam, dizendo somos uma vergonha para classe”, denunciou um dos agentes. “Quem são eles para nos condenar? Se cometemos algum crime, já estamos pagando”, completou.
Os agentes que cumprem prisão ficam numa cela do seguro justamente para que não sejam torturados ou assassinados pelos presidiários comuns.
De acordo com o site do Tribunal de Justiça, a Lei 9.455, de 7 de abril de 1994, também conhecida como “Lei da Tortura”, constitui-se crime de tortura: constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental, com o fim de obter informação, declaração ou confissão da vítima ou de terceira pessoa; para provocar ação ou omissão de natureza criminosa; em razão de discriminação racial ou religiosa.
Também constitui tortura, de acordo com o inciso II da lei, “submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intenso sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo”. A pena é reclusão de dois a oito anos.
Tem algo errado na política prisional do Estado. Já passou da hora do governador Renato Casagrande agir diretamente no sistema. O governador, que sempre foi um homem democrático, legalista, justo e defensor dos direitos humanos, não vai querer que seu currículo seja manchado por conta de uma administração que não consegue mais colocar um freio na indisciplina cometida por um grupo de agentes penitenciários.
É caro que o Estado, por meio da Sejus, jamais autorizaria seus agentes a praticar tortura, mas, quando se vê agentes torturando seus próprios colegas, dá para imaginar o que eles não fazem com os presidiários comuns.
A impressão que passa para a sociedade é a de que quem manda hoje no sistema prisional é a turma da tortura, que já obedece mais as ordens de seu secretário, o sempre bem intencionado Ângelo Roncalli.