O governador Renato Casagrande (PSB) mostrou nos últimos dias ser um verdadeiro enxadrista. Mexeu no tabuleiro da segurança pública, dando importância a determinadas peças e minando outras, para evitar que o Espírito Santo se transforme na mesma baderna instalada na Bahia, por conta da greve de policiais militares que dura uma semana.
Casagrande sabe muito bem que, por trás de movimentos de paralisações de policiais e bombeiros militares no Espírito Santo, estão interesses pessoais e de grupos de algumas lideranças, principalmente de oficiais da PM e do Corpo de Bombeiros, de olho na direção de entidades e até mesmo visando às eleições municipais de outubro.
As entidades de classe dos militares estaduais marcaram para o dia 15 deste mês uma assembleia geral unificada, no Campo do Caxias, onde serão discutidas a recomposição salarial e a reestruturação do Quadro Organizacional da PM e do CBMES.
Existe uma ameaça de, caso o governo não atenda as reivindicações dos militares capixabas, ocorrer aqui também uma paralisação, que seria definida entre greve ou aquartelamento. Vale lembrar que a Constituição Federal proíbe greve de policiais e bombeiros militares.
Conforme este blog já informou com exclusividade, na última sexta-feira (03/02), quando a greve de policiais militares baianos chegou ao auge – com assassinatos, arrastões e a invasão da Assembleia Legislativa baiana por parte de um grupo de policiais –, Renato Casagrande fez várias ligações para seu colega Jaques Wagner (PT), para entender como se desenrolava a crise na Bahia.
Casagrande agiu rápido na mesma sexta-feira e decidiu que o negociador do governo com os policiais militares passaria a ser o comandante geral da PM, coronel Ronalt Willian, que nesta segunda-feira (06/02) já começou a se reunir com as entidades de classe.
O governador sabe o que se passa nos bastidores e tem conhecimento que eleições na Associação dos Oficiais Militares Estaduais (Assomes) e na Caixa Beneficente dos Militares Estaduais, ainda este ano, podem ter influência direta nas movimentações da tropa em torno das reivindicações.
Casagrande pode ter certeza, porém, que os militares, em sua a maioria, são responsáveis e cumpridores de seus deveres e torcem para que um acordo seja feito sem necessidade de qualquer paralisação.
Tanto que um oficial – fonte deste blog – que disputará a eleição para presidente da Assomes (Clube dos Oficiais) diz que é contra a paralisação de policiais militares, pois aquartelamento já aconteceu no passado e em nada contribuiu para melhoria salarial de praças e oficiais.
Lembra ele que, após os movimentos paradistas, restam somente inquéritos e processos para alguns poucos militares. Esta mesma fonte informa que há um movimento para fortalecer a candidatura de um oficial que concorrerá também à presidência do Clube dos Oficiais (Asssomes), cujas eleições estão previstas para novembro deste ano.
Este outro candidato teria se aliado ao ex-comandante geral da PMES, coronel Oberacy Emmerich Júnior, atual subsecretário de Estado da Justiça (Sejus), que pleiteia disputar, também este ano, uma vaga de conselheiro na Caixa Beneficente dos Policiais e Bombeiros Militares.
O coronel Emmerich e o seu parceiro, que está de olho na direção do Clube dos Oficiais, têm enviado correspondências eletrônicas (emails) para os eleitores das duas entidades, se apresentando como candidatos.
Aliás, a Caixa Beneficente – para a qual todos os policiais e bombeiros militares do Espírito Santo são obrigados a contribuir financeiramente mensalmente – ultimamente vem sendo motivo de discordância por conta da remuneração que paga a seus conselheiros.
Por força do estatuto, somente oficiais de alta patente – majores, tenentes-coronéis e coronéis – podem fazer parte do Conselho da Caixa Beneficente. Por mês, cada conselheiro da Caixa Beneficente recebe de jeton cerca de R$ 1,8 mil, para participar apenas de uma reunião semanal.
De acordo com uma fonte do Comando Geral da PM, um grupo de oficiais que estão sendo liderados pelos chamados “Tucunzeiros” – turma de oficiais da PM formada, a partir dos anos 90, no Centro de Formação e Aperfeiçoamento, no bairro Tucum, em Cariacica – “teria se unido nos últimos meses para ganhar representações também nas demais entidades de classe dos policiais militares, numa troca de interesses que nenhum benefício levaria os praças – sobretudo cabos e soldados”.
Este movimento, no entanto, não tem a adesão de todos os oficiais. E uma liderança que emerge entre os oficiais mais novos é o major José Augusto.
Atento a tudo, na reunião de sexta-feira no Palácio Anchieta o governador Renato Casagrande teria dito a seguinte frase para o comandante geral da PM, coronel Ronalt Willian: “A quem muito é dado, muito será cobrado”. Esta frase enigmática vai mostrar os rumos da crise que se inicia nos bastidores da política local envolvendo a PM.
Ainda na sexta-feira, Renato Casagrande manteve contatos importantes com autoridades de outros estados, do governo federal e até com o ex-governador Paulo Hartung.
Segundo fontes do Palácio Anchieta, com seu antecessor, Casagrande quis sua opinião sobre outras crises envolvendo policiais militares e sobre a situação na Bahia.
Lá, os militares estaduais invadiram a Assembleia Legislativa e levaram até esposas e filhos para acampamentos dentro do prédio. Tropas do Exército e da Força Nacional de Segurança estão nas ruas de Salvador tentando garantir a segurança da população.
Lembrando que, no passado, os movimentos de paralisações ocorridas na PM capixaba nasceram quase do nada, mas se fortaleceram, inclusive, com adesões importantes dos quartéis do interior, como aconteceu em 1998, quando o então tenente Bruno Polez desceu de Colatina para Vitória comandando uma considerável tropa de militares que culminou na paralisação de serviços essenciais e fez engasgar o governador Vitor Buaiz (PT).
A entrada do coronel Ronalt Willian como negociador máximo entre os policiais militares e o governo indica que Renato Casagrande acertou em cheio. A conclusão é que pode até não vir o aumento salarial que os policiais militares precisam e merecem, mas pelo menos o governador está conseguindo restaurar a figura do comandante geral que ultimamente se passava de um mero coadjuvante.
Na avaliação de alguns políticos ligados ao Palácio Anchieta, Casagrande parece ser mesmo um enxadrista; mexe na peça certa do complicado tabuleiro da segurança pública. Assim, Casagrande não comete os mesmos erros e “mandonices” protagonizados no governo Hartung, que passou uma PM em grave crise interna ao seu sucessor.
Enfim, Casagrande está tentando resolver um problema que não começou com ele.