A Polícia Civil e a Corregedoria Geral da Polícia Militar estão investigando a ação de um falso pastor que, se passando por investigador, enganou o Batalhão de Polícia Ambiental e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e extorquiu fazendeiros e empresários capixabas ligados a rinhas de galo.
Em reportagem exclusiva publicada no Blog do Elimar Côrtes na segunda-feira (03/10), foi informado que o homem que se passava por Jorge de Araújo, Nilo Araújo e Lino Araújo estaria cobrando “resgate” de até R$ 5.800,00 para liberar galos de brigas apreendidos em uma rinha de São Mateus. Dizia a denúncia que o homem – identificado na ocasião como policial civil – estaria poupando de blitz os donos de rinhas que aceitavam pagar propina de R$ 1.500,00 por cada torneio realizado. Mais informação no link http://elimarcortes.blogspot.com/2011/10/fazendeiros-pagam-ate-r-5-mil-de.html
Logo após a publicação da reportagem, veio a versão oficial. O tal Jorge de Araújo é um tremendo estelionatário, que conseguiu se infiltrar no Ibama como informante (x-9) e, depois, no Batalhão Ambiental da PM.
Para todos, ele se identificava também como investigador da Polícia Civil e pastor de uma igreja Batista. Chegou a fazer até investigações sigilosas, normalmente reservadas a agentes do Serviço de Informação (P-2).
Um dos oficiais que chegaram a trabalhar com o investigador caô, o falso pastor gostava de ser chamado de “PC Araújo”. Usava coleta da Polícia Civil, uma pistola ponto 40 e até algemas penduradas no cinto da calça.
Como falso pastor, Jorge de Araújo ganhava, como doação, produtos – como peixes e aves – comestíveis apreendidos em operações conjunto do Ibama e Polícia Ambiental.
As doações teriam que ser repassadas pelo investigador caô a instituições filantrópicas. Teriam…
Por trás do falso policial, no entanto, existia a intenção de ganhar dinheiro fácil. Para isso, ele vinha extorquindo fazendeiros e empresários, que têm rinhas de galo na Serra e no interior do Estado. O falso policial foi descoberto no início deste ano, mas somente agora o caso vem sendo trazido à tona.
Ele está sendo investigado pela Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente e Patrimônio Cultural da Polícia. A Corregedoria da Polícia Militar entrou nas investigações com o objetivo de descobrir se há envolvimento de militares com os crimes que teriam sido praticados por Jorge de Araújo.
O falso policial chegou ao Batalhão Ambiental supostamente indicado pelo Ibama. Foi se integrando à Polícia Ambiental, garantindo que era informante do Ibama.
Repassava informações à PM sobre pesca ilegal, maus tratos a animais e as localidades onde haviam rinhas de galo. Foi assim que ele conquistou a confiança dos oficiais e praças da Ambiental, inclusive, do seu comandante, o então tenente-coronel Leonardo Marchezi – que acaba de ser promovido a coronel e será, em breve, Diretor de Pessoal da PMES.
CONSULTA DA DINT NÃO PEGOU NADA
Antes, entretanto, de confiar no falso investigador, o coronel Marchezi tomou o cuidado de pedir à Diretoria de Inteligência (Dint) da PM que “sondasse” o passado de Jorge:
“Pelo CPF e a Identidade dele (Jorge de Araújo), a Dint descobriu uma única ocorrência: foi quando a ex-esposa dele tentou atropelá-lo. Nem cheque sem fundos o cara tinha”, disse o coronel Marchezi.
Policiais lotados na Ambiental lembram que Jorge de Araújo atuava no Batalhão repassando informações, mas era, na verdade, “um agente duplo”. Ou seja, para quem cometia crimes ambientais e aceitava pagar propina ao falso policial, Jorge não denunciava.
Antes de denunciar, por exemplo, uma rinha de galo, ele extorquia os proprietários. Cobrava, inicialmente, um salário mínimo para manter a rinha sem a presença da polícia; depois, passou a cobrar dois salários mínimos. Por fim, já estava cobrando três salários – mais de R$ 1.500,00.
Foi aí que a casa começou a cair para o investigador caô. Ele foi a São Mateus e ajudou a PM local a prender mais de 50 pessoas e apreender 104 galos.
FALSO POLICIAL FEZ INVESTIGAÇÃO SECRETA
O então comandante do Batalhão Ambiental, coronel Marchezi, garante que Jorge não participava das operações. Apenas dava informações sobre os delitos e criminosos e ia sempre nos locais de saída das guarnições fazer oração para os policiais e para o sucesso das operações.
Mas na operação de São Mateus – ocorrida em 6 de novembro de 2010 –, que culminou com a apreensão de 104 galos, Jorge de Araújo foi o responsável pelas investigações preliminares, conforme consta no relatório de Serviço n° 299/2010, da 3ª Companhia, assinada pelo 3° sargento Itamar Laurindo:
“Denúncia n° 664/2010: cujo delator informa estar ocorrendo um torneio de RINHA DE GALO em zona rural nas proximidades do Km 10. Com apoio do Sr. Araújo (Policial Civil à disposição do IBAMA) foi realizado serviço velado de reconhecimento e posteriormente abordagem pela equipe de dia, reforçada pela presença do Ten (tenente) Correia e ARAÚJO…”.
Nessa operação, foram apreendidos galos que custavam até R$ 40 mil. De acordo com o mesmo relatório da 3ª Companhia da PM de São Marteus, “os galos foram entregues ao Sr. Araújo, conforme orientação do Tenente Correia, que os levou para Vitória onde será dado destinação adequada”,
FRANGO DO PÉ DURO E GALINHA CONGELADA NO LUGAR DE GALOS DE BRIGA
Segundo as investigações, Jorge de Araújo teria levado os galos para Guarapari, de onde passou a telefonar para os proprietários das aves dizendo que queria dinheiro para devolvê-las.
Antes, o falso investigador comprou em um supermercado uma grande quantidade de frangos congelados e os repassou a uma instituição filantrópica.
O responsável pela instituição assinou o ato de doação, documento expedito pelo Ibama, como se estivesse recebido galos.
Ainda de acordo com as investigações, um empresário concordou em pagar R$ 15 mil a Jorge de Araújo por três galos que seriam devolvidos a sua fazenda. Os galos tinham sido apreendidos em São Mateus.
O falso investigador marcou com o empresário para resgatar os galos no trevo de Guarapari, na BR-101 Sul. Era de noite. O empresário se encontrou com Jorge e recebeu uma caixa de madeira, onde estariam os galos.
Quando chegou em sua fazenda, em São Mateus, já no outro dia de manhã, abriu a caixa e, para sua surpresa, se deparou com três frangos do pé duro.
Seus galos verdadeiros já tinham sido levados para o Rio, onde Jorge de Araújo teria vendido. Detalhe: cada galo desse empresário era avaliado em R$ 40 mil.
POLICIAL CAÔ CONHECER DUDA MENDONÇA
“O papo dele (Jorge) era tão forte que ele dizia que era amigo até do Duda Mendonça – famoso publicitário responsável pelas campanhas políticas vitoriosas, como a o ex-presidente Lula, e que foi preso pela Polícia Federal, no início da gestão Lula, em 2003, em uma rinha de galo no Rio.”, conta um policial do Batalhão Ambiental.
“Ele dizia que conhecia galeiros de todo o País. Por isso, tinha a intenção de ajudar a nossa polícia a colocar os caras na cadeia”, completou um outro oficial.
Conforme informações em postagem anterior, a extorsão praticada pelo falso policial foi denunciada ao Ministério Público Estado, Ibama e Corregedorias das Polícias Civil e Militar.
Tão logo soube das denúncias, o corregedor geral da PC, delegado Emerson Gonçalves da Rocha, tomou providência. Viu que Jorge de Araújo não era policial civil. E, como estava também praticando crimes de maus tratos a animais – não só de extorsão –, passou o caso para a Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente e Patrimônio Cultural.
A Corregedoria Geral da PM também investiga o caso, mas a DP do Meio Ambiente acredita que Jorge de Araújo teria agido sozinho. Não teve ajuda de nenhum policial militar em suas ações criminosas.
O inquérito, aberto há pelo menos quatro meses, está perto de ser concluído com pedido de prisão e indiciamento de Jorge de Araújo.
Segundo as investigações, ele participava de operações do Ibama e da Polícia Ambiental como “voluntário” e se dizia também representante de organizações que cuidam de dependentes químicos. Ao final do inquérito, Jorge deverá ser indiciado pelos crimes de falsidade ideológica, extorsão, maus tratos e estelionato.
FALSO PASTOR FAZIA ORAÇÕES PARA POLICIAIS
O coronel Leonardo Marchezi, que está deixando o comando do Batalhão Ambiental para assumir a Diretoria de Pessoal da PM, informou que Jorge de Araújo constava na relação de informantes do Ibama. Desta forma, ele passou a ajudar a polícia com denúncias sobre crimes ambientais.
“Muitas informações se concretizaram. Ele (Jorge) surge nesse cenário, como pessoal ligada ao Ibama. Jorge ia sempre aos locais onde começavam as operações e fazia oração. Ele indicava as entidades que iriam receber doação dos produtos comestíveis apreendidos nas operações”, disse Marchezi.
Embora para policiais militares Jorge de Araújo se identificava como “PC Araújo”, o coronel Marchezi garante que tinha nele a figura de um pastor e de um informante do Ibama.
“Por isso, a denúncia de que o Jorge estaria extorquindo fazendeiros nos surpreendeu”, conta o coronel Marchezi.
Ele reforçou sua tese de que o falso policial civil somente participava das saídas das diligências em alto mar, indo sempre se encontrar com a tropa militar e os fiscais do Ibama na saída das embarcações.
“Ele chegava, se apresentava como pastor e fazia orações. As operações eram sempre do Ibama. A Polícia Ambiental apenas dava apoio. A operação em São Mateus, quando foram apreendidos os 104 galos, foi a única que em que o Ibama não estava presente”, lembrou Marchezi.
A superintendência do Ibama preferiu se manifestar por intermédio de sua assessoria de imprensa. Inicialmente, a assessoria alegou que o órgão possui um sistema chamado de Linha Verde, em que qualquer pessoa pode denunciar crimes ambientais pelos telefones 3089-1065 e 0800618080.
Sobre Jorge de Araújo, a assessoria disse que “se ele tem ligação com o Ibama, é como informante”.
Mais tarde, a assessoria de imprensa deu nova ligação para o blogueiro, dizendo que o coordenador de Fiscalização do Ibama já esteve pessoalmente com Jorge de Araújo, “mas somente nas operações, quando Jorge chegava, se passava por pastor e fazia oração para os policiais da Ambiental e para os fiscais do Ibama”.