Aos 43 anos de idade, Ledir Porto já quebrou paradigmas. Ele saiu das camadas mais simples e humildes da população para exercer a Secretaria de Defesa Social de Vila Velha, cargo que ocupou antes na Serra. Nunca escondeu seu passado e sua única experiência política foi o cargo de vereador que ocupou em Viana por um mandato.
Nesta entrevista exclusiva ao Blog do Elimar Côrtes, Ledir Porto fala de sua disposição de retirar das ruas os dependentes de crack e anuncia novidades. De tanto incomodar traficantes por causa de sua luta contra as drogas, Ledir Porto já foi ameaçado de morte por bandidos de Vila Velha:
“Mas as ameaças não incomodam. Fazem parte do nosso trabalho”, afirma Ledir Porto, em uma entrevista dividida em duas partes. Na segudna, Ledir falará sobre sua história de vida e o livro que pretende lançar.
Blog do Elimar Côrtes – Como o senhor começou a desenvolver o projeto de videomonitoramento na Serra?
Ledir Porto – Quando assumi a Secretaria de Defesa Social na Serra, em 2005, na administração do prefeito Audifax Barcelos (hoje deputado federal), havia o desafio de reduzir a violência. Foi criado, então, o plano denominado de “Serra, Cidade da Paz”.
O plano contava com a presença de todos os segmentos da sociedade civil, como os conselhos Tutelares e Municipal de Segurança, representantes dos empresários, lideranças comunitárias; os órgãos públicos, como Judiciário, Ministério Público Estadual e polícias Civil e Militar, além dos secretários municipais de todas as Pastas.
Portanto, antes mesmo de o Ministério da Justiça estimular os Estados a criarem o Gabinete de Gestão Integrada, nós já tínhamos o nosso GGIM (Gabinete de Gestão Integrada Municipal) na Serra.
Foi aí que surgiu a ideia do videomonitoramento. Logo nas primeiras reuniões, foram elencadas mais de 50 iniciativas, como a fiscalização em bares e casas de show. Visitamos outras cidades no Brasil – e até fora, como Bogotá, na Colômbia – e trouxemos exemplos positivos para a Serra. E uma delas foi o videomonitoramento.
Antes de 2006 o balneário de Jacaraípe era apontado como um dos mais violentos nos períodos de verão. Então, no final de 2005 e início de 2006, iniciamos a reação. Em 20 de dezembro de 2005, instalamos três câmeras na Serra-Sede e, sete dias depois, mais cinco câmeras em Jacaraípe e uma em Manguinhos.
Ao mesmo tempo, adotamos outras estratégias, como a proibição da venda de bebidas destiladas em feiras livres e feiras de artesanatos e nos quiosques dos balneários serranos.
Quando saímos da Secretaria da Serra, deixamos R$ 1,2 milhão para aquisição de mais 30 câmeras e hoje o município está muito bem atendido. O balneário de Jacaraípe passou a ser um dos mais tranquilos.
Vale ressaltar a forte parceria que tivemos todo o tempo com a Polícia Militar. O comandante do 6° Batalhão (Serra) à época, tenente-coronel Edmilson, foi muito importante para o sucesso do plano. Implantamos na ocasião um Centro Integrado de Segurança na orla de Jacaraípe.
– Como o projeto chegou a Vila Velha?
– No dia 17 de janeiro de 2009, dias depois de assumir a Secretaria de Defesa de Vila Velha, o prefeito Neucimar Fraga assinou ordem de serviço para a instalação da primeira câmera de TV para a Praia da Costa. Sete dias depois, já entrou em funcionamento o Centro Integrado de Segurança da Praia da Costa, com 14 câmeras instaladas ao longo da orla, indo de Itaparica até o Clube Libanês.
Aqui foi instalado o GGIM (Gabinete de Gestão Integrada Municipal). E tudo passa por ele. Hoje, já contamos com o Grupo de Fiscalização Permanente, cujo objetivo é realizar a fiscalização de postura municipal, fiscalizando casas de shows, bares, terrenos baldios.
Esse grupo atua também no sentido de não permitir mais invasões no município. Recentemente, o grupo descobriu um terreno que já havia sido invadido por várias pessoas na região de Terra Vermelha. A Prefeitura teve que demolir as casas e descobrimos que as pessoas haviam sido enganadas por supostos estelionatários.
Vila Velha, atualmente, está com 67 câmeras espalhadas pela orla, Centro, principais praças públicas dos bairros, o centro comercial da Glória e principais avenidas. Esse grupo também identifica terrenos abandonados, que costumam servir de novas cracolândias – locais usados por dependentes de crack.
Precisamos deixar bem claro que tudo que o olho digital enxergar de errado na cidade, a Prefeitura de Vila Velha vai agir. O prefeito Neucimar Fraga baixou portaria e assinou decreto dando poderes à Secretaria Municipal de Defesa Social para ter também a tarefa de fiscalização. Temos, portanto, poder de polícia administrativa.
– Em que mais o Grupo de Fiscalização Permanente tem atuado?
– Estamos, neste momento, atuando em Terra Vermelha. Com a ajuda da Polícia Militar, nossos servidores estão notificando bares irregulares, dando prazo para eles se regularem. Caso contrário, vão ser fechados.
Não posso afirmar que o mesmo acontece aqui em Vila Velha, mas, logo que assumimos a Secretaria de Defesa na Serra, fizemos uma pesquisa nas chamadas áreas de conflitos, como os bairros Feu Rosa e Vila Nova de Colares, que nos indicou que mais de 50% dos homicídios ocorridos nessas regiões eram praticados dentro de bares ou nas porta dos bares. A pesquisa apontou também que 90% desses estabelecimentos, onde ocorriam assassinatos, estavam atuando dentro da ilegalidade. Ou seja, estavam irregulares. Hoje, com certeza, a situação na Serra é diferente.
Por isso, estamos indo aos bairros de Vila Velha, começando por Terra Vermelha, onde o “Estado Presente” – programa do governo do Estado de combate à criminalidade em áreas de desigualdades sociais – está atuando. Posteriormente, a fiscalização estará sendo estendida a outros bairros.
– Qual o principal foco do programa?
– O foco é a redução da criminalidade e o combate ao uso e tráfico de drogas. É bom informar que o Grupo de Fiscalização Permanente tem outros focos de ação, como o de impedir a invasão de terrenos; fiscalizar estabelecimentos comerciais, etc. São ações contidas dentro do Programa de Enfrentamento ao Crack e outras drogas.
O principal foco do programa, então, é a vida humana. Para tanto, estamos indo às ruas, inicialmente, fazendo a abordagem policial. Essas abordagens são feitas pelas polícias Militar e Civil, Ministério Público e Juizado da Infância e do Adolescente, através da juíza Patrícia Neves.
As abordagens têm o objetivo de dar uma chance aos usuários de crack. Numa segunda etapa, na mesma ação, são adotadas medidas sócio-jurídicas/protetivas. Depois é feito o atendimento social. Por intermédio do atendimento social, a Prefeitura oferece internação ao doente de crack.
A Prefeitura está estruturando a Casa de Acolhimento e conta também com comunidades terapêuticas em outros municípios. Quando recolhido nas ruas, o dependente de crack vai passar os primeiros 15 dias tendo todo o acompanhamento de médicos, assistentes sociais, psicólogos.
Esse período é necessário porque, depois desse tempo, o usuário de crack volta à lucidez. Após o período de alucinação, ele tem condições de escolher se quer continuar o tratamento ou não.
Se o dependente optar em continuar o tratamento, a Prefeitura vai interná-lo em uma comunidade terapêutica. Para isso, estamos buscando apoio junto às Igrejas (Católica e Evangélicas) para que elas possam apadrinhar os usuários.
Cada depende custa mensalmente em uma comunidade terapêutica, cerca de R$ 800,00. Fizemos o desafio a padres e pastores, para que eles, junto com suas comunidades, possam incentivar o apadrinhamento. Mas não basta só custear as despesas. É preciso que as igrejas, ao apadrinhar um usuário de crack, façam o acompanhamento desse cidadão, levando-o, inclusive, para sua igreja.
– Por enquanto, as ações são voltadas para recuperar o usuário de drogas. E as políticas de prevenção que são responsáveis por impedir que crianças, adolescentes e jovens se envolvam com as drogas?
– Visamos à prevenção também. Tanto que as Secretarias Municipais de Educação e Comunicação já estão planejando ações nas escolas. Hoje, socorremos quem está perdido. Em breve, virá uma campanha maciça e educativa contra o uso de drogas. Para isso, a secretarias de Educação e Comunicação vão desempenhar um papel importante.
– Quais os resultados hoje para a segurança pública das ações que o senhor vem implantando em Vila Velha?
– Depois da instalação das câmeras de TV dentro do projeto de videomonitoramento na orla, a realidade em relação a crimes contra o patrimônio e venda e uso de drogas é outra. Em muitas áreas da cidade, a redução de crimes contra o patrimônio chegou a até 80% com o Policiamento Eletrônico.
Isso significa dizer que simplesmente a instalação de câmeras de televisão não é suficiente para coibir o uso de crack nas ruas ou nas chamadas cracolândias. Geralmente, os dependentes de crack nunca estão lúcidos, não dão bola para a vigilância eletrônica. Por isso, precisamos adotar ações sociais. Não queremos punir o dependente de crack; queremos, curá-lo.
– Quais são os apoios ao enfrentamento ao crack e quais são as fases desse enfrentamento?
– Nossos apoios vêm de instituições públicas – como polícias Militar e Civil, Judiciário, Ministério Público, secretarias municipais e estaduais –, igrejas e de toda sociedade civil organizada. Vamos também buscar apoio da iniciativa privada. Muitas construtoras possuem terrenos em Vila Velha. Se elas não cuidarem dos terrenos, eles se transformarão em cracolândias no futuro. Se cuidarem de seus terrenos, então, as construtoras já estarão nos ajudando.
Quanto às próximas fases, até o segundo semestre de 2012 a meta é acabar com todas as cracolândias. Quem recusar tratamento médico, pode ficar ciente de que não continuará nas cracolândias. O cidadão ou cidadã dependente do crack que estiver pelas cracolândias será alvo de 15 em 15 dias de nossas ações. As instituições policiais, a Justiça e o Ministério Público vão junto conosco para nos dar apoio legal.
– Como o senhor consegue integrar os órgãos de segurança pública para que eles possam agir todos focados na política municipal de segurança?
– Trabalhamos de forma harmoniosa e respeitosa com todos os órgãos. Recebemos apoio e vice-versa. O videomonitoramento, por exemplo, é uma ferramenta que ajuda as polícias. Todos os órgãos executam parceria contínua.
– Quando a Guarda Municipal de Vila Velha vai se tornar uma realidade?
Ainda no primeiro semestre de 2012 a nossa Guarda Municipal começará a trabalhar nas ruas, com 120 agentes.
– A quem a Guarda Municipal de Vila Velha servirá de modo focado?
– Ela será um reforço na articulação de políticas de prevenção do município. Vai atuar para colocar ordem na cidade e terá a tarefa de interagir com as polícias Civil e Militar. A Guarda Municipal terá a missão de proteção ao cidadão.
– Nota-se que o senhor tem ações diferentes na concepção de iluminação pública, limpeza urbana e a busca de integrada das polícias em parceria com a Prefeitura. De onde surgem tais ideias?
– O cuidado com a iluminação pública e a limpeza urbana tem a ver com uma melhor segurança. O crime acontece nas trevas, no escuro. A Bíblia diz que “Jesus é a luz do mundo”. Quem está na luz é visto. O criminoso trabalha de maneira camuflada, em locais escuros, mal iluminados.
Por isso, estamos orientando – porque isso não pode ser uma imposição – aos construtores que, em vez de cercar um terreno ou murar uma residência com muro de concreto, passem a cercá-lo com tela. Esse modelo torna o ambiente mais seguro, pois passa a ter visibilidade.
Quem está passando na rua, tem condições de ver se, dentro do terreno ou da casa, está acontecendo algum crime. Uma casa murada, como é hoje, não permite visibilidade.
– Como é o apoio que o prefeito Neucimar Fraga tem dado ao senhor para a garantia do exercício pleno do cargo?
– O prefeito Neucimar é, na verdade, o grande estrategista para a implantação e desenvolvimento de todos os projetos. Ele nos dá apoio político, técnico e moral. Tanto que baixou um decreto dando poderes de fiscalização à Secretaria de Defesa Social.
Isso não quer dizer que esta é uma super secretaria. Nada disso. Nós trabalhamos com o apoio dos demais secretários e de gestores de outros órgãos da Prefeitura.
– Nota-se que a luta travada pelo senhor é um tiro na contabilidade do tráfico. A cada dependente de crack que o senhor retira das ruas, é um dinheiro a menos que entra na conta bancária dos traficantes, o que, com certeza, incomoda os chefões do tráfico. Em função desse trabalho, o senhor já foi ameaçado?
– Já recebi ameaças, sim. Em uma delas, o chefe de Albergue de Rua de nossa Secretaria foi procurado por uma pessoa que lhe disse que um traficante de Boa Vista estaria articulando passar o facão em mim.
Em Boa Vista, instalamos câmeras de TV do videomonitoramento em dois pontos de vendas de drogas, assim como em Itapoã e no bairro Divino Espírito Santo, atendendo pedido do comando do 4° Batalhão.
Isso incomoda os traficantes. Tanto que, na rua Gameleira, em Itapoã, eles derrubaram um poste e quebraram uma câmera, numa ação que durou apenas 30 segundos. Tudo isso foi filmado. Mas as ameaças não incomodam. Fazem parte do nosso trabalho.
Não persigo traficantes; não persigo pessoas; meu papel é social. Ou seja, reduzir a criminalidade e o sofrimento dos usuários de crack, que, na verdade, são pessoas doentes e que precisam de tratamento.
Nossas ações objetivam uma melhor segurança para a cidade. Por isso, a meta da Prefeitura de Vila Velha é instalar câmeras em todos os bairros e praças. Praças abandonadas são sinônimo de crimes. O traficante ocupa praças abandonadas.
– Quais os próximos passos para a melhoria da segurança pública de Vila Velha?
– A Prefeitura vai construir uma nova Central de Videomonitoramento – hoje já existe uma central na orla – para todo o município. Atualmente, o foco é a segurança pública. Com a nova central, outro foco a ser alvo da Prefeitura é a zeladoria do município.
O setor de zeladoria vai cuidar da ordem pública. Através da central, com mais câmeras de TV instaladas em todo o município, será possível detectar em tempo real onde há lâmpadas quebradas ou queimadas; onde há lixo ou entulho. Ou seja, a nova Central de Videomonitoramento vai traçar o mapa de risco de todo o município, medindo, por exemplo, o nível dos canais; trabalhando com previsão de enchentes.
A nova Central, que deverá funcionar na Rodovia Darly Santos, vai poder prevê tragédias e colocar em prática plano de contingência. Assim, a Prefeitura vai construir abrigo, para onde as pessoas serão orientadas a se deslocar na iminência de uma tragédia.
Dentro da Central, estarão trabalhando em conjunto vários órgãos, como a Defesa Civil, Polícia Militar e Corpo de Bombeiros, para que as tomadas de decisão nos casos de amergência se tornem mais ágeis e céleres.
Ainda este ano, o prefeito Neucimar Fraga deverá lançara ordem de serviço para a construção da nova Central de Videomonitoramento. O setor de zeladoria vai atuar diretamente ligado ao Gabinete do Prefeito. A nossa Secretaria de Defesa Social continuará sendo responsável pela segurança pública.