Joel Lyrio Júnior é o tipo de delegado que foge ao estereótipo de um policial durão e ao lugar-comum. Aberto ao diálogo, ele deixa o interlocutor tranqüilo, com sua voz pausada e serena. Dele, é difícil se ouvir um grito.
Formado na Academia de Polícia de São Paulo, Joel Lyrio tem pós-graduação em Direito Processual Civil e Direito Civil e Especialização em Excelência na Gestão Pública e em Segurança Pública.
Está deixando a titularidade da Secretaria de Defesa Social da Serra, onde chegou em 2009 a convite do prefeito Sérgio Vidigal, e voltando à sua casa, que é a Polícia Civil capixaba, para comandar uma das instituições mais importantes do Estado.
‘‘O Dr. Joel Lyrio, meu pai, é o fio condutor da minha carreira de Delegado de Polícia’’, agradece o novo chefe de Polícia Civil, ao lembrar do pai, que também foi delegado da PC do Espírito Santo.
Joel Lyrio Júnior tem tudo para marcar um novo tempo na história da Polícia Civil. Ele foi convidado para assumir o cargo pelo secretário de Estado da Segurança Pública e Defesa Social, Henrique Herkenhoff, com a missão de modernizar a instituição e contribuir para ajudar o Espírito Santo a reduzir os altos índices de homicídios.
Seus planos visam, sobretudo, aumentar o combate à impunidade, nem que para isso as delegacias passem a ficar abertas durante 24 horas por dia. Também vai valorizar os profissionais de Polícia Civil e pretende melhorar a infraestrutura da Polícia, com investimentos, principalmente, na área de informática.
Uma das ideias, conforme Joel Lyrio diz com exclusividade ao Blog do Elimar, é criar a Central de Flagrante Online.
Confira, abaixo, a entrevista completa dada pelo futuro chefe de Polícia Civil, Joel Lyro Júnior, que toma posse em fevereiro, em substituição ao delegado Júlio César de Oliveira.
– Qual foi a sua reação ao receber o convite para ser o novo chefe de Polícia Civil do Espírito Santo?
– Na verdade havia especulações de nomes de excelentes Delegados de Polícia para ocupar este relevante cargo, e nós ficamos aguardando a definição do nome em razão do planejamento da Secretaria de Defesa Social da Serra para maior aproximação com a Polícia Civil e entender os novos caminhos a serem trilhados.
Quando recebemos o convite tivemos que fazer algumas reflexões, quanto a atender o chamado do governo do Estado ou continuar na Prefeitura da Serra, pois fizemos na Serra um planejamento para os quatro anos do mandato do prefeito Sérgio Vidigal. Estávamos conseguindo diminuir a violência no município a partir de um grande processo de integração entre as organizações sociais e as agências policiais, Ministério Público e Poder Judiciário.
Então pesou o fato do governador (Renato Casagrande) ter colocado a segurança pública como prioridade, conhecermos o perfil do novo governo e tentar mudar o quadro da violência em todo o nosso Estado do Espírito Santo. Enfim, fiquei muito feliz pelo convite e pelo desafio de tentar fazer algo novo na Polícia Civil.
– O pai do senhor foi delegado de Polícia Civil. Vocês dois chegaram a trabalhar juntos ou ele já estava aposentado quando o senhor iniciou a carreira?
– Por incrível que pareça, não chegamos a trabalhar juntos. Quando eu estava cursando a Academia de Polícia, em São Paulo, ele estava se afastando para aposentadoria. O Dr. Joel Lyrio, meu pai, é o fio condutor da minha carreira de Delegado de Polícia.
– A Polícia Civil do Espírito Santo é uma instituição que o senhor conhece profundamente. Sabe de seus problemas, mas conhece, sobretudo, as virtudes da corporação e de seus profissionais. Como o senhor pretende aproveitar o potencial de cada delegado?
– Em virtude da nova lei de promoção, que elevou vários colegas a última categoria de Delegados de Polícia, montamos uma equipe de transição e estamos tentando adequar a experiência dos mais velhos com a força e energia dos Delegados de Polícia mais novos. A Polícia Civil tem que ser administrada para todos os profissionais de polícia e não apenas para um segmento de categoria.
No caso dos Delegados de Polícia, nenhum deles deve se preocupar em qual função vai atuar, pois existem espaços para todos e a competência e perfil de cada um está sendo analisado dentro de um critério de meritocracia. Os nossos Delegados são estudiosos e inteligentes.
– Um dos problemas vividos hoje pela Polícia Civil seria a falta de investimento no setor de informática. Ela tem viaturas, armamento, mas deixa a desejar na informática. Como pretende solucionar essa demanda?
– Pois bem, viaturas e armamento e coletes são equipamentos básicos para todas as polícias e não pode faltar, mas isto apenas não faz a diferença no resultado final! A Polícia Civil possui por força de lei as atribuições investigativas, portanto todos sabem que só possui efetividade se tiver grande volume de informações. Estas informações devem ser sistematizadas, portanto necessitamos avançar no processo de informatização da Polícia Civil, para que os dados de ocorrências policiais e consultas de indivíduos e objetos estejam ao alcance de qualquer policial.
Estamos pensando a polícia dentro de alguns grandes eixos, de acordo com alinhamento a ser feito junto ao Estado que irá trabalhar com 10 eixos que traz como um dos eixos a segurança pública. Para a Polícia Civil, pensamos em eixos voltados para Infraestrutura, Formação e Valorização Profissional e Tecnologia da Informação.
Os investimentos iniciais deverão passar pela área de informática, não se admite que Delegacias de Polícia não tenham sequer acesso à internet, que os dados da Polinter tenham que ser consultados por telefone.
– Quando falo mais investimento no setor de informatização da Polícia Civil me refiro a projetos de alta tecnologia. A nossa Polícia Civil poderia, por exemplo, trabalhar com Policiamento Eletrônico ou Videomonitoramento? Ou essas duas ferramentas cabem mais para o caso de uma polícia preventiva?
– A pergunta é excelente, pois pensamos em alta tecnologia. Por exemplo: consulta online de cadastro de veículo, através de ambiente móvel. Quando se menciona Policiamento Eletrônico, esse sistema engloba vários ramos de TI. A perícia, por exemplo, necessita urgente de equipamentos modernos, e a investigação deve ser pautada por novos produtos de informática que auxiliem o policial na ponta.
O videomonitoramento é uma grande ferramenta que pode ser utilizado também pela Polícia Civil. Um exemplo é o que fizemos na Serra. Montamos a melhor estrutura do Estado em termos de videomonitoramento, com equipamentos digitais com estrutura que comporta vários softwares como o de análise de imagem por caracteres, que deixamos para implementar neste ano de 2011.A ideia e termos Central de Flagrante online por exemplo.
– O senhor assume a Polícia Civil num momento em que o novo governo assume também o compromisso de reduzir os índices de homicídios. Como a instituição poderá contribuir com essa redução?
– Este é um compromisso de Governo, que nos fez aceitar mais este desafio. Os números de homicídios não caem da noite para o dia, tem que ser uma perseguição sistemática pelo resultado, com uma combinação de estratégias e ações de inclusão social.
A Polícia Civil, bem como a Polícia Militar, não possui total responsabilidade pelos números de homicídios, mas no caso da Polícia Civil aumentar a resolutividade dos homicídios, com identificação da autoria e materialidade no prazo de lei é necessário. Portanto, não haveria o acúmulo de inquéritos parados e a sensação de impunidade. Para que isto aconteça teremos que criar um novo modelo de estrutura e uma nova metodologia de apuração.
– O novo governo de Renato Casagrande criou comitês para discutir e resolver os problemas do Estado. Um dos comitês é o da Segurança Pública. É o tipo de gestão democrática que tem o seu perfil, não é mesmo?
– Sem dúvida, as pessoas que me conhecem e já trabalharam comigo reconhecem esta característica de buscar resultados através de uma gestão mais participativa e democrática de todos os segmentos que envolvem segurança pública. Entendo que até agora deu certo, pois temos que fazer uma gestão ouvindo todos os segmentos, independente de qualquer coisa.
Nesta linha já realizei reuniões com alguns colaboradores mais próximos e estamos definindo a forma de atuar. Existe a necessidade da Polícia Civil participar dos Gabinetes de Gestão Integrada Municipais, e isso será exigido daqueles que serão os gerentes de suas áreas.
– Qual vai ser o seu relacionamento com as entidades de classe dos policiais civis?
– Espero uma relação cordial e respeitosa, considerando que sempre estivemos abertos ao diálogo ao longo de nossa carreira. Não queremos evidentemente unanimidade, pois as críticas ajudam no crescimento, mas todos já me ligaram e se colocaram à disposição para ajudar. Isso é de fundamental importância. Como sempre digo, não dá para fazer integração com outras instituições públicas se não conseguirmos integrar dentro de casa. Um dos nosso primeiros atos será recebê-los (dirigentes de entidades de classe) e ouvir atentamente seus projetos e avaliações.
– O senhor assume a Polícia Civil já com uma vantagem em relação aos seus antecessores: o novo secretário da Segurança, Henrique Herkenhoff, acaba de baixar portaria dando ao chefe da PC a responsabilidade de localizar delegados. Até que ponto isso é importante para a gestão da instituição?
– Temos conversado bastante com o nosso secretário Henrique Herkenhoff, que foi nosso professor no curso de Aperfeiçoamento de Delegado de Polícia. Ele conhece a dimensão dos problemas da segurança pública no nosso Estado, e este ato representa um novo momento na gestão pública para a Polícia Civil. É a afirmação de voto de confiança nas decisões da nova Chefia de Polícia.
A Chefia de Polícia Civil não pode e não deve ser centralizadora, nas empresas modernas a descentralização das ações faz a empresa crescer e você têm (imprensa e sociedade) de quem cobrar os resultados. Além disso, o resgate da hierarquia plena na Polícia Civil deve ser contemplado, descentralizar não pode ser sinônimo de descontrole.
– O que o senhor implantou na Secretaria de Defesa Social da Serra e que poderia ser trabalhado também na Polícia Civil?
– Entendo que a gestão no município da Serra foi bem sucedida, daí a importância de levar a forma de Planejamento Estratégico desenvolvido na Secretaria de Defesa Social para a Polícia Civil. Estamos ansiosos para participar do Planejamento Estratégico do governo do Estado que vai acontecer do dia 24 a 26 de fevereiro, para que possamos avançar mais em um planejamento que atenda a Polícia Civil e que traga os resultados.
Não dá para trabalhar a polícia através de formas empíricas. Necessitamos de pesquisas, execuções de ações e avaliação. Assim, a forma de planejar e a visão técnico-financeira como experiência na Serra vai contribuir bastante na condução da gestão na Polícia Civil.
– Para este ano, o governo do Estado prepara um concurso para delegados. Há mais concurso a vista? O senhor pretende pedir ao governo que reforce mais os quadros da Polícia Civil?
– O efetivo da Polícia Civil, apesar dos últimos concursos, ainda está aquém de suas necessidades e demandas. Portanto, a continuidade na recomposição do quadro de servidores é altamente relevante, inclusive pelo fato de que queremos um novo modelo de atendimento das delegacias distritais e dos plantões policiais.
Mas temos que ter consciência que é importante otimizar no primeiro momento os recursos disponíveis e mostrar resultado. O grande desafio de todo gestor é fazer o mais com menos e ao final conseguir êxito para obter mais.
– Segundo o Conselho Nacional do Ministério Público, existem na nossa Polícia Civil quase 14 mil inquéritos relativos a homicídios sem solução, com data até 31 de dezembro de 2007. Na DHPP, já está sendo formada uma Força Tarefa, junto o com o Ministério Público, para investigar os 13.610 inquéritos. O que fazer para evitar que essa situação não se repita? Existe plano para se fazer um levantamento de inquéritos sem solução nas divisões, delegacias e DPJs? Dependendo desse levantamento, pode acontecer um futuro mutirão para se tentar solucionar os casos?
– Estamos trabalhando há bastante tempo em uma solução viável para conclusão de tantos inquéritos paralisados, que geram tanta impunidade. Assim, temos duas preocupações: a primeira é dar andamento e concluir este quantitativo de inquéritos paralisados; a segunda é evitar que ocorra com os casos mais recentes.
A iniciativa do Ministério Público está sendo fundamental para trilharmos um caminho, mas a Polícia Civil tem que contribuir mais. Por isso, a primeira iniciativa é interessante e demonstra a parceria com o Ministério Público e o Poder Judiciário. Para se chegar à segunda ação, não se pode admitir que Delegacias de Polícia fechem à noite, enquanto o crime ocorre durante as 24 horas do dia. É imaginar um hospital funcionando só com o pronto socorro aberto e a UTI e CTI fechados. O crime é dinâmico e a polícia não pode ser diferente. Assim, estamos desenhando com o secretário Henrique (Henrique Herkenhoff, secretário de Estado da Segurança Pública) uma nova forma e novo modelo de atuação, pois os homicídios no Estado têm que diminuir em uma razão espacial e científica.
Por fim, gostaria de agradecer a oportunidade dada pelo jornalista Elimar Côrtes que vem acompanhando há anos o desempenho do trabalho policial no Espírito Santo, e cumprimentar toda a imprensa capixaba pelo carinho à nossa pessoa e a todos os nossos policiais civis e amigos, que nos auxiliaram nessa trajetória profissional, e finalizar dizendo que o homem não conquista nada sozinho, necessita do apoio de todos.
Agradecer ao Governador Renato Casagrande pelo convite, extensivo ao Secretário Henrique Herkenhoff e ao Prefeito Sérgio Vidigal que entendeu a importância de nossa decisão de voltar à Polícia Civil.