A condenação do ex-prefeito da Serra Adalto Martinelli a 23 anos de prisão pela acusação de ser um dos mandantes do assassinato do advogado Carlos Batista de Freitas serve para se fazer um tributo a um dos advogados mais injustiçados do Espírito Santo, que foi Marcelo Joaquim Denaday.
Assassinado a tiros em 2002, na Praia da Costa, Vila Velha, quando voltava de uma caminhada, Marcelo Denaday foi um dos maiores responsáveis pelo processo que levou os assassinos de Carlos Batista ao banco dos réus e agora pela condenação de um dos mandantes – o outro acusado de ser mandante é o empresário Alberto Santos Ceolin, cujo julgamento está previsto para terça-feira (15/12).
Logo após o desaparecimento de Carlos Batista – o corpo, que teria sido carbonizado pelos pistoleiros, até hoje não foi encontrado –, Marcelo Denaday iniciou uma luta árdua e, quase que solitária, para fazer com que a Polícia Civil chegasse aos assassinos e mandantes. Carlos Batista sumiu em janeiro de 1992.
Vários foram os delegados que trabalharam no caso; várias foram as versões para justificar o desaparecimento de Carlos Batista. Mas ninguém, naquela ocasião, tinha a coragem de desafiar os poderosos que estavam por trás da morte do advogado, que foi assassinado porque sabia demais.
Marcelo Denaday fez trabalho de investigador. Fez o que a Polícia Civil capixaba até então não tinha coragem de fazer: ligou o assassinato de Carlos Batista ao do ex-prefeito da Serra José Maria Miguel Feu Rosa, morto a tiros, junto com seu motorista, quatro anos antes numa cidade do Sul da Bahia.
Os mesmos Adalto Martinelli e Alberto Ceolin constam como acusados de serem os mandantes da morte de José Maria Miguel Feu Rosa. Quando ele morreu, Martinelli assumiu a Prefeitura da Serra.
Feita a ligação entre os dois crimes, Marcelo Denaday passou a contar então, com outros dois incansáveis companheiros: o delegado Francisco Vicente Badenes Júnior, que hoje é delegado federal, e o promotor de Justiça Luiz Renato da Silveira.
Outro delegado teve também contribuição importante na penúltima fase de inquérito do caso, que foi o hoje aposentado Ismael Foratini.
Marcelo Denaday, às vezes, usava seu próprio escritório para ajudar Badenes e o promotor Luiz Renato a trabalharem no inquérito policial.
Ismael Foratini chegou a concluir o inquérito, mas Badenes achou que deveria indiciar mais pessoas, inclusive autoridades policiais, que nada tinham a ver com o assassinato de Carlos Batista. Badenes, porém, entendia que essas autoridades teriam cometido o crime de prevaricação.
Como bom criminalista, Marcelo Denaday fez o delegado enxergar que estaria cometendo “uma loucura”, o que, posteriormente, prejudicaria o inquérito quando chegasse à fase processual.
Marcelo Denaday, que foi um dos poucos a ajudar Francisco Badenes em terras capixabas, assim que o delegado chegou do Rio trazendo na bagagem a intenção de “acabar com o crime organizado”, tornou-se “inimigo” de Badenes.
E, quando um advogado da competência de um Marcelo Denaday se torna inimigo de um delegado, sai de baixo, porque está sujeito a sofrer represálias. E foi isso que aconteceu: Marcelo Denaday acabou sendo vítima da injustiça dos políticos que controlavam a então CPI do Narcotráfico, presidida pelo hoje senador capixaba Magno Malta.
Marcelo foi injustiçado porque, mais tarde, foi ser advogado do então prefeito de Cariacica, Cabo Camata – morto em um acidente de carro – e, por isso, teve seu nome citado no relatório final da CPI do Narcotráfico, em 2001. É bom lembrar que o delegado Badenes, na ocasião, foi uma das autoridades a ajudar a CPI no tópico do Espírito Santo.
Não só Marcelo, mas qualquer advogado que defendia quem os donos da CPI achavam que eram “bandidos”, eram citados na CPI. Quem era amigo de delegados que os donos da CPI consideravam “bandidos” também era citado na CPI do Narcotráfico. Mais tarde, o Brasil viu, de fato, quem era bandido nessa jogada toda…Mas isso é outra história.
Esta foi, portanto, uma das injustiças cometidas contra um homem de bem, um advogado que vivia para sua família – esposa e dois filhos –, que era dono de um escritório simples, no Centro de Vitória, mas que cresceu, com coragem e disposição quando teve que ajudar a polícia e o Ministério Público Estadual a desvendar dois assassinatos: a do ex-prefeito José Maria Miguel Feu Rosa e do advogado Carlos Batista.
Se hoje a família de Carlos Batista agradece a Deus pela condenação de Adalto Martinelli, muito se deve a Marcelo Denanday – e, porque não, ao promotor Luiz Renato e aos delegados Francisco Badenes e Ismael Foratini.
Pena que o assassinato e Marcelo Denaday, apesar de já ter sido desvendado, tenha caído no esquecimento: os acusados de serem os assassinos, intermediários e mandantes estão soltos à espera de julgamento.
Marcelo Denaday passou a sofrer. Não era de reclamar, mas seus amigos sabiam que ele estava bastante magoado. Mesmo assim, seu senso de justiça nunca o abandonou: foi morto, segundo a Polícia Federal, porque denunciou uma empresa que prestava serviços à Prefeitura de Vitória de irregularidades.