A sociedade organizada deve ficar atenta para uma Proposta de Emenda à Constituição que acaba de ser aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados. A PEC 37/2011, de autoria do deputado federal Lourival Mendes (PTdoB-MA), atribui exclusivamente às polícias Federal e Civil a competência para a investigação criminal.
O mais grave: o texto deixa claro que o Ministério Público não tem a atribuição de conduzir esse tipo de investigação e deve atuar apenas como titular da ação penal. A proposta será agora examinada por uma comissão especial e votada em dois turnos pelo Plenário. Detalhe: o deputado federal Lourival Mendes é delegado de classe especial da Polícia Civil do Maranhão.
De acordo com o site da Câmara Federal, o relator da PEC, deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), defendeu a medida e destacou que a falta de regras claras na Constituição vem levando esse assunto para o Judiciário.
Segundo Faria de Sá, o texto deverá reconhecer a importância dos delegados de Polícia e impedir qualquer eventual contestação do trabalho policial. “Se a PEC for aprovada, o Ministério Público continuará com o seu papel. O objetivo é somente garantir que os delegados de Polícia tenham autonomia e liberdade”, argumentou Faria de Sá
Há, no entanto, vozes contrárias à PEC 37/2011 dentro da Câmara. O deputado Vieira da Cunha (PDT-RS) disse que, na maioria dos casos, o Judiciário vem reconhecendo a competência do Ministério Público para conduzir investigações criminais.
Segundo ele, a colaboração entre MP e polícias favorece as investigações, “evitando assim que, por falta de um trabalho completo, a impunidade reine no País”. Cunha avaliou que a mudança, se aprovada, poderá prejudicar a qualidade das investigações criminais.
“O controle de qualidade, que deve ser exercido pelo titular exclusivo da ação penal, que é o Ministério Público, terá prejuízo porque tudo ficará ao exclusivo critério da polícia. Isso é nocivo à sociedade”, assegurou o parlamentar gaúcho.
Vieira da Cunha e outros dois deputados – Luiz Couto (PT-PB) e Onyx Lorenzoni (DEM-RS) – apresentaram voto em separado contra a PEC 37/11. A admissibilidade da proposta foi aprovada por 31 votos a oito.
O autor da PEC, Lourival Mendes, afirmou ao site da Câmara Federal que muitas das provas colhidas na fase de investigação “são insuscetíveis de repetição em juízo, razão pela qual este procedimento compete aos profissionais devidamente habilitados e investidos para o feito”.
“Na minha avaliação, a restrição da investigação às polícias Civil e Federal será capaz de propiciar à acusação e à defesa os elementos necessários à efetiva realização da justiça”, acredita Lourival Mendes.
O Brasil já vive uma sensação de impunidade. Se não fosse o Ministério Público – seja o Federal ou Estadual –, poucos seriam os processos que estariam tramitando hoje na Justiça contra políticos acusados de corrupção no Brasil.
A Polícia Federal vem atuando com afinco dentro desse aspecto, mas, se depender da vontade da classe política – pelo menos os detentores de mandato, em sua maioria –, ela deixaria de ser uma polícia de Estado para voltar a ser uma polícia de governo. Ou seja, só faria o que o Ministério da Justiça ou a Presidência da República determinar.
No Espírito Santo alguns exemplos: se a investigação de denúncias de corrupção fosse exclusivamente uma atribuição da Polícia Civil, o ex-presidente da Assembleia Legislativa José Carlos Gratz e seus colegas parlamentares seriam, um dia, denunciados à Justiça? Claro que não, porque os governadores da era Gratz jamais permitiram a Polícia Civil a investigar a classe política.
Quando o delegado Francisco Badenes Vicente Júnior – que era da Polícia Civil e hoje está na Polícia Federal – decidiu prender, com a ajuda do Ministério Público Estadual, o então prefeito de Cariacica, Dejair Camata, todo mundo caiu de críticas em cima dele.
Na época, coube ao então senador Élcio Álvares, hoje deputado estadual pelo DEM, procurar pessoalmente um desembargador (já falecido), em plena madrugada, para conseguir hábeas corpus para soltar Cabo Camata.
Para conseguir colocar Cabo Camata atrás das grades, Badenes teve que “criar” uma blitz no posto da Polícia Rodoviária Federal da Serra e parar o carro em que estava o prefeito. Como sabia que Cabo Camata andava com armas clandestinas dentro do veículo, o delegado o prendeu por porte e tráfico de armas.
O caso mais recente de denúncias de irregularidades administrativas que o jornal A Gazeta trouxe à tona está dentro da Prefeitura Municipal de Vitória.
O autor das denúncias contra o prefeito João Coser (PT), acusado de praticar irregularidades nas desapropriações, chegou a procurar a Polícia Civil, mas foi orientado por um delegado a pedir ajuda ao Ministério Público Estadual, que reuniu farta documentação, fez as devidas investigações e agora está denunciando o prefeito Coser. Antes, a Procuradoria Regional da República também já havia denunciado o prefeito da capital, que está com seus bens bloqueados pela Justiça Federal.
A sociedade deve ficar atenta. Se depender da maioria dos parlamentares em Brasília, o Ministério Público vai ficar mesmo com suas atribuições travadas e impedido de conduzir investigação criminal.
Se a PEC 37/2011 for aprovada, o Estado brasileiro terá uma ferramenta a menos na sua árdua tarefa de combater qualquer tipo de criminalidade – seja ela organizada ou não. E o País poderá mergulhar de vez na onda da impunidade!