Dono de uma padaria e dois restaurantes na Praia do Canto, o empresário João (nome fictício, por motivo de segurança) vai duas vezes por semana na Centrais de Abastecimento do Espírito Santo (Ceasa), em Vila Capixaba, Cariacica, fazer compras para seus estabelecimentos. Sai de casa às 3 horas da manhã, dirigindo seu caminhão. Gosta de chegar no máximo até 3h30 na porta da Ceasa, onde aguarda até às 5 horas para poder entrar no maior mercado do Espírito Santo para conseguir comprar produtos hortifrutigranjeiros, cereais e outros. O que antes era uma atividade prazerosa para João, agora está se tornando motivo de terror e pânico, que provocam estresse. Na última quinta-feira (22/03) ele foi mais uma vítima de ladrões e fez um desabafa: “Antes do assalto, eu separei o dinheiro para os bandidos”
A história de medo do empresário João e de outras pessoas – empresárias e ou comerciantes – que se deslocam de madrugada até a Ceasa tem dois motivos: a falta de policiamento na porta da Ceasa e o excesso de zelo por parte da direção do órgão.
Do lado de fora da Ceasa, não há policiamento. O local é cercado por vários bairros periféricos de Cariacica, como Vila Capixaba, São Francisco, Morro dos Gamas – onde se escondem quadrilhas de traficantes, assaltantes e de ladrões de cargas –, Vila Independência e outros.
Do lado de dentro, há um aparato melhor de segurança, com vigilantes privados e 42 câmeras de circuito interno de TV. O problema é que a direção da Ceasa, empresa vinculada à Secretaria de Estado da Agricultura, permite, antes das 5 horas, a entrada somente de veículos dos fornecedores (produtores rurais), donos de lojas e atravessadores ao local de venda e compra de mercadorias.
“Eu e a maioria dos outros compradores chegamos ainda de madrugada para sair da Ceasa também mais cedo. Se sairmos de lá após as 6h30 da manhã, pegaremos trânsito congestionado na BR-262, em Campo Grande, Jardim América, na Segunda Ponte e na Vila Rubim. No meu caso, com trânsito congestionado, vou chegar aos meus estabelecimentos somente uma hora e maia depois que sair da Ceasa”, diz João.
Por isso, ele e os demais compradores têm que ficar do lado de fora, em duas pistas paralelas à rodovia BR-262, encostadas às lojas da Ceasa. Os comerciantes compradores já detectaram que os assaltos à mão armada, geralmente, são praticados por dois rapazes, que fogem em uma moto pela VR-262 e depois entram em uma das ruas de acesso a Vila Capixaba.
Os bandidos também conhecem as vítimas e sabem que elas, normalmente, trabalham com dinheiro em espécie quando vão à Ceasa fazer compras. E os assaltos, segundo João, tornaram-se quase que diários:
“Tomei conhecimento que na semana passada houve assaltos na segunda, terça, quinta e sexta-feira. Nesta segunda-feira (26/03), um comerciante de Montanha foi a vítima da vez. Os ladrões colocaram um revólver na cabeça dele e roubaram R$ 4 mil em espécie, celular, carteira com documentos, cartões de crédito e até o boné”, relata João.
O comerciante de Montanha foi rendido pelos criminosos com o seu caminhão ainda em movimento: “Quando ele passou pelo quebra-mola, um dos bandidos pulou em cima da porta e o rendeu.
Dentro da Ceasa, fica um quiosque da Polícia Militar. Até semana passada trabalhavam dois policiais militares no local. Um deles era justamente o sargento José Cláudio Falcão, que morreu de câncer no final de semana.
João relata como foi rendido, depois de quase se livrar do assalto
João relata, com riquezas de detalhes, sobre como foi o assalto do qual foi vítima. Do momento em que ele avistou – ainda de dentro de seu caminhão – dois suspeitos e a sua rendição, se passaram menos de 40 segundos:
“Eu já estava com o caminhão estacionado e olhei para a frente. Vi dois camaradas vindo na direção de meu veículo. Um deles vestia jaqueta e outro estava com camisa branca. Ambos são brancos. Eles vieram andando. Bati os olhos neles e pensei: ‘São assaltantes’! Olhei para o lado esquerdo, onde ficam as lojas da Ceasa, e todas ainda estavam fechadas. Ao olhar de novo para a frente, vi uma moto parada. Era uma moto verde musgo, que parecia estar sem sua pintura original. De imediato, retirei R$ 200,00 em dinheiro vivo de minha mochila e escondi no lixo do caminhão. Quando olhei de novo a mochila,lembrei que nelas havia objetos de valor, como óculos de grau e escuros, as chaves de minha casa e documentos pessoais. Pensei que, se eu entregasse a mochila aos bandidos, meu prejuízo seria maior. Deixei, então, a mochila no caminhão, peguei o dinheiro de volta no lixo do veículo e saltei. Por isso, eu separei o dinheiro para os bandidos. Do meu lado estava um Gol, de um outro comerciante. Nossos horários de chegada à Ceasa são padronizados. Esse comerciante também saiu do Gol. Outro colega comprador parou seu caminhão atrás do meu. Quando eu pisei no chão, ao descer do caminhão, o outro colega que parou seu caminhão atrás de mim passou do lado da porta do carona de meu veículo. Foi neste momento que um dos dois rapazes anunciou o assalto. Ele sacou o revólver calibre 38 e pediu que o comerciante lhe entregasse dinheiro, celular e carteira. Esse mesmo assaltante virou para mim e disse: ‘Segue que não é com você, não, branquinho!’ Pensei em voltar, mas aí o comparsa do primeiro assaltante me rendeu e me deu uma geral. Me colocou na mesma posição em que policiais colocam as pessoas quando fazem revista na rua. Entreguei a ele os R$ 200,00 que havia reservado para o assalto. O rapaz ainda enfiou a mão em meu bolso e pegou meu celular. Tudo isso que acabo de te contar se passou em menos de 40 segundos”.
Empresário faz apelo à direção da Ceasa
O empresário João faz um apelo à direção da Ceasa, que, caso fosse atendido, poderia, em sue entender, reduzir os assaltos do lado de fora:
“Nós pagamos, no mínimo, 6 reais de pedágio para entrar na Ceasa. Porque, então, a direção da Ceasa não permite a entrada dos compradores, com seus veículos, mais cedo? Isso não vai trazer custo para o governo, mas vai proporcionar benefícios para nós, comerciantes, ao mesmo tempo em que poderá reduzir os assaltos do lado de fora, reduzir o risco de morte – porque a qualquer momento os assaltantes poderão matar uma vítima – e reduzir nosso estresse”.
O empresário João, talvez, tenha cometido um “erro” por conta da inexperiência: ele, assim como as demais vítimas, não têm procurado a Polícia Civil para registrar os ocorrências de assaltos. Informam apenas os casos à direção da Ceasa:
“Saio de casa, duas vezes por semana, 3 horas da manhã. Altero toda minha rotina. Tenho que voltar logo para os nossos estabelecimentos comerciais para entregar as mercadorias. Depois, preciso ir para o escritório central de nossas empresas, para planejar e administrar nossas firmas, porque temos compromisso com nossos clientes. Não sobra tempo. Já pagamos nossos impostos normalmente. O que pedimos é só um pouco de atenção”, disse João.;
E os pedidos dele são simples, em seu entender, de serem atendidos pelo governo do Estado: que a Ceasa tenha um livro para registro de ocorrências de delitos, para que depois seja envaido à Polícia Civil, com todos os dados das vítimas; e permita a entrada dos veículos dos compradores a qualquer hora da madrugada.
Diretor da Ceasa já solicitou à PM ronda da polícia do lado de fora
O diretor da Ceasa, Luiz Carlos Prezoti Rocha, ouvido pelo Blog do Elimar Côrtes, informou que já enviou dois ofícios ao Comando do 7° Batalhão da Polícia Militar, responsável pelo policiamento em Cariacica, solicitando que a PM faça uma ronda de madrugada também pela portaria da Ceasa, onde centenas de comerciante aguardam, diariamente, a abertura dos portões para que possam fazer suas compras.
“Fiz os pedidos no sentido de dar maior segurança aos compradores que ficam do lado de fora”, garantiu Luiz Carlos. “Dentro da Ceasa temos segurança absoluta. Contamos com 42 câmeras de TV que monitoram toda a área interna e postos externos. Pela Ceasa, circulam diariamente mais de 5 mil pessoas”, completou.
Ele explicou que não pode atender aos pedidos dos comerciantes, de registrar os assaltos em um livro – o que é uma atribuição legal da polícia – e abrir os portões para a entrada dos compradores junto com os vendedores:
“Não há espaço. O espaço dos compradores é o mesmo dos vendedores. Quando chega o horário estabelecido para as compras, os vendedores vão para outros locais”, disse José Carlos Prezoti.