A juíza Heloisa Cariello, da 2ª Vara da Fazenda Pública Estadual, Municipal, Registros Públicos, Meio Ambiente e Saúde de Vitória, determinou o Estado a fazer a atualização do valor contingenciamento dos salários de mais de 2.300 policiais civis. A atualização tem de ser feita com correção monetária e juros de mora incidentes sobre os valores ilegalmente descontados e posteriormente pagos pelo Estado do Espirito Santo. A decisão da magistrada, relativa aos autos número 0003678-55.2000.8.08.0024, foi assinada no dia 2 deste mês e determina o imediato pagamento aos policiais que, há 17 anos, lutam na Justiça para ter de volta o que foi retirado pelo governo do Estado. O processo já transitou em julgado e o Estado perdeu em todas as instâncias.
A decisão atende a um pleito do Sindicato dos Servidores Policiais Civis do Estado do Espírito Santo (Sindipol/ES). Pelo cálculo realizado pela entidade, mais de R$ 18 milhões terão de ser devolvidos aos 2.300 policiais civis prejudicados pelo governo em 1999.
Os policiais vão começar receber juros e correções monetárias relativos à retenção de seus salários promovida pelo ex-governador José Ignácio Ferreira, entre janeiro a agosto de 1999, no primeiro ano de seu governo. O chamado contingenciamento foi a forma que José Ignácio encontrou para pagar em dia o funcionalismo público estadual. O antecessor dele, o petista Vitor Buaiz, já havia deixado de pagar os meses de outubro, novembro e dezembro de 1998, último ano de seu governo.
Em março de 2000, o Sindipol entrou com duas ações na Justiça: uma para pagamento integral dos salários (acabar com a retenção) e outra para cobrar do Estado os valores contingenciados, com juros e correções monetárias.
Tão logo se encerrou o decreto do contingenciamento, que atingiu todos os servidores públicos do Executivo Estadual, o governador José Ignácio pagou os valores retidos, mas “esqueceu” dos juros e das correções monetárias, uma exigência legal e prevista no Regime Jurídico Único dos Servidores.
O Sindipol manteve a ação na Justiça, que transitou na 2ª Vara dos Feitos da Fazenda Púbica Estadual de Vitória. Em sentença proferida no dia 23 de setembro de 2009, o juiz Rodrigo Cardoso Freitas julgou procedente o pleito do Sindipol, condenando o Estado do Espírito Santo “ao pagamento dos valores ilegalmente descontados dos vencimentos dos autores (policiais) correspondentes aos meses de outubro a dezembro de 1998, inclusive 13º salário, bem como da diferença de 20% descontados no período de janeiro a agosto de 1999, caso alguma das parcelas não tenham sedo pagas à integralidade”.
Na mesma sentença, o juiz Rodrigo Cardoso Freitas condenou o Estado a fazer o pagamento com juros de mora e decidiu ainda que “haverá o acréscimo às referidas condenações de correção monetária na forma da Lei nº 6.899/81, contada da época do respectivo vencimento.”
O Estado recorreu e, em 13 de dezembro de 2011, o Tribunal de Justiça publicou acórdão, em que prevaleceu o voto do relator da apelação, desembargador Ronaldo Gonçalves de Sousa, da 3ª Câmara Cível:
“Não há como agasalhar o que deseja o apelante (Estado do Espírito Santo) pelos fundamentos que passo a aduzir, que é parágrafo VI do Artigo 7º da Constituição Federa: são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo”.
Depois que a sentença transitou em julgado – quando não cabem mais recursos –, os advogados Rodrigo Santos Nascimento e Gustavo Bragatto Dal Piaz, que são do Sindipol, entraram com uma ação de “Cumprimento de Sentença”, que é a execução para o pagamento que o Estado deve aos policiais e tramita na 2ª Vara dos Feitos da Fazenda Púbica Estadual de Vitória.
O valor de ressarcimento varia de R$ 6 mil a 25 mil – é de acordo com cargos e salários dos policiais na época do contingenciamento. A ação é em favor de associados do Sindipol e beneficia investigadores, delegados, agentes de Polícia, escrivães, peritos, médicos-legistas e demais servidores da instituição policial.
No entanto, o Estado deixou de cumprir o que determinava a sentença já transitada em julgado. Por isso, o Sindipol/ES entrou com novo pedido de “Cumprimento de sentença”, objetivando o recebimento da obrigação de pagar quantia certa pela Fazenda Pública.
O Departamento Jurídico do Sindipol apresentou à Justiça documentos, como fichas financeiras, planilha e cálculos. Intimado, o Estado, em impugnação apresentada, alegou: a) a execução deve ser extinta, dada ausência de memorial de cálculo discriminado; b) o valor principal da presente execução já foi adimplido; c) indispensável a produção de prova pericial técnica; e por fim, d) a atualização dos valores da execução deverão observar os critérios de correção monetária e juros de mora aplicáveis a Fazenda Pública. O Sindipol combateu as teses do Estado.
Em sua decisão, a juíza Heloisa Cariello lembra da sentença favorável ao Sindipol proferida em 23 de setembro de 2009 e mantida pelo Tribunal de Justiça. Feitas estas considerações preliminares, passa-se a análise da impugnação. A magistrada analisou e rebateu cada preliminar arguida pela Procuradoria Geral do Estado:
1)DA EXTINÇÃO DO
PROCESSO DE EXECUÇÃO
Suscita a Parte Executada (Estado) que a execução deveria ser extinta, ante a ausência de memória de cálculo discriminada. Compulsando os autos, verifica-se que o Exequente (Sindipol) colacionou memória de cálculos, planilha dos valores individuais. Ademais, apontou os índices de correção e juros de mora aplicados no cálculo.
Desta feita, presentes a memória de cálculos, os termos iniciais da correção monetária e juros de mora, os índices aplicados, bem como a indicação do valor que entenderia devido, rejeito a preliminar.
2) DO ADIMPLEMENTO
DO VALOR PRINCIPAL
Arguiu o Estado do Espírito Santo que o valor principal da presente execução, correspondente aos valores indevidamente descontados já foram devidamente adimplidos. À fl. 365, a Secretaria de Estado de Gestão e Recursos Humanos – SEGER informa que “o Governo do Estado já quitou todos os débitos relativos aos meses de outubro, novembro e dezembro/98 e os valores contingenciados, entretanto sem correção monetária”.
Analisando os autos, verifica-se que consta no título executivo judicial, que os valores pagos não foram contabilizados juros de mora e correção monetária (fls. 384/385), logo, o cumprimento de sentença refere-se tão-somente a correção monetária e os juros de mora sobre os valores pagos.
Dessa forma, por tratar-se de cumprimento de sentença referente à correção monetária e os juros de mora incidentes sobre os valores pagos, rejeito a preliminar arguida.
3)DA PRODUÇÃO DE PROVA
PERICIAL TÉCNICA
Alega que seria indispensável à produção de prova pericial técnica, a fim de se apurar corretamente os valores devidos na presente execução.
Na hipótese vertente, repito, executa-se o comando sentencial referente tão-somente quanto à correção monetária e os juros de mora dos valores ilegalmente descontados e posteriormente pagos pelo Estado do Espirito Santo, sem atualização.
Logo, no presente caso, o montante a ser alcançado da condenação envolve apenas cálculos aritméticos, sendo desnecessária a produção de prova pericial.
Assim, dada a possibilidade de definição do valor da condenação por cálculo aritmético, não merece guarida a pretensão do Estado.
4)DOS ÍNDICES DA CORREÇÃO MONETÁRIA
E DOS JUROS DE MORA
NO DÉBITO PRINCIPAL
Sustenta o ESTADO DO ESPÍRITO SANTO que deveriam incidir correção monetária pela taxa TR, a partir de 30/06/2009, por força da Lei n. 9.494/97, com a redação dada pela Lei n. 11.960/2009, e no período anterior o índice utilizado pela tabela da CGJ-INPC/IBGE e os juros de mora no percentual de 0,5% ao mês, nos termos do art.1º-F da citada lei.
Relativamente à correção monetária, a questão é singela, pois no período anterior a entrada em vigor da Lei n. 11.960/90, deverão seguir os parâmetros definidos na legislação vigente, isto é, o fator de correção da CGJ/ES (INPC/IBGE) e, após a entrada em vigor da Lei em referência, devem observar os critérios de atualização nela disciplinados, enquanto vigorarem. Portanto, a partir de 30/06/2009, com a vigência da Lei n. 11.960/09, devem ser observados os critérios de atualização (correção monetária e juros) nela disciplinados.
Diante de todo exposto, REJEITO a impugnação do executado, e subsequentemente DETERMINO a atualização do valor exequendo- correção monetária e juros de mora incidentes sobre os valores ilegalmente descontados e posteriormente pagos pelo Estado do Espirito Santo.”
Condeno a Parte Executada (Estado) em honorários advocatícios, os quais fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), considerando a natureza da causa, o trabalho realizado, o local da prestação dos serviços e o grau de zelo profissional, nos termos do artigo 85, §1º, 8º, do CPC, que deverão ser atualizados desde seu arbitramento, devendo ser utilizada a Taxa Referencial, na forma do art. 1º-F da Lei n.9.494/97, com a redação da Lei n. 11.960/2009, sem incidência de juros de mora.
Remetam-se os autos à Contadoria para atualização do valor executado. Prossiga-se a execução, com a expedição da Requisição de Pequeno Valor, a fim de que instruam e providenciem o respectivo processo administrativo para pagamento do débito em questão.
Intimem-se.
Tudo feito, e não havendo outras postulações, AGUARDEM-SE
informações acerca do pagamento.
Sobrevindo informações do pagamento e, não havendo outras postulações, retornem os autos conclusos para sentença de extinção do crédito exequendo.
Policiais estimulados por “velhas lideranças” tentaram atrapalhar o Sindicato e atrasaram cumprimento de sentença
A execução é em nome do Sindipol/ES e o cálculo é individualizado para cada um dos mais de 2.300 policiais civis. De acordo com o presidente do Sindipol, Jorge Emílio Leal, o que provocou dificuldade e demora na ação é que foram movidos cumprimentos de sentenças para pequenos grupos de policiais e com cálculo e metodologia divergentes do Sindicato.
No passado, pelo menos cinco policiais, estimulados por um antigos dirigentes de associações de classe dos policiais civis, se anteciparam e fizeram seus próprios cálculos e, de maneira atabalhoada, entraram na Justiça com ação para Cumprimento de Sentença.
Pelos cálculos do perito contábil contratado pelo Sindipol, um desses policiais sindicalizados teria direito a receber R$ 8.113,89 de ressarcimento. Pelo seu próprio cálculo, receberia apenas R$ 1.542,69. Ou seja, uma diferença de R$ 6.571,20.
“Essa divergência gerou atraso na prestação jurisdicional, ou seja, esses cálculos realizados por pequenos grupos foram apreciados primeiro que os nossos. Também houve problema relativo a metodologia que foi utilizada que trouxe risco para os nossos cálculos. Alguns pouquíssimos policiais apresentaram um cálculo e a PGE outro. Daí, eles (policiais) abdicaram do cálculo que eles tiveram e falaram que o da PGE estava certo e receberam os valores que a PGE indicou, muito abaixo do que os nossos. Nós tivemos que fazer o cumprimento de sentença para 2.300 pessoas e agora a nossa expectativa é de que não existam mais pedidos de ‘aventureiros’ que colocam em risco o direito da categoria como um todo em prol de benefícios próprios”, salientou Jorge Emílio.