Ao participar, na terça-feira (29/10), em Brasília, do seminário “Reforma Tributária e os Riscos para a Universalização do Saneamento”, o presidente da Companhia Espírito-Santense de Saneamento e vice-presidente Regional Sudeste da Associação Brasileira das Empresas Estaduais de Saneamento (Aesbe), Munir Abud, afirmou que os desafios que a Reforma Tributária pode trazer para o setor de saneamento básico, especialmente no que se refere às metas de universalização até 2033, poderá afastar investimentos privados e atrapalhar a possibilidade de universalização do saneamento até 2033, conforme determina regulamentação federal. Ele lembrou que o saneamento é alicerce para a saúde. O seminário foi realizado em parceria com os jornais O Globo, Valor Econômico e Rádio CBN:
“Do modo que está, a Reforma Tributária falha ao atingir um setor tão vital para a saúde da população”, defendeu Munir Abud. Em sua fala, Abud enfatizou o impacto direto da carga tributária no setor, afirmando que “em um momento em que as companhias começam a se estruturar para a desestatização de alguns ativos, se deparam com o aumento da carga tributária diante de um recurso que não está disponível. Isso criará um embaraço para o alcance das metas. A Reforma [Tributária] atrapalha a possibilidade de universalização em 2033”.
O presidente da Cesan apontou ainda que o aumento dos tributos pode comprometer a capacidade de investimento das empresas, essencial para ampliar o acesso da população aos serviços de qualidade, especialmente em regiões carentes. O painel, intitulado “Impacto da nova tributação no saneamento: universalização em risco e contas mais altas”, trouxe à tona o receio de que, além de atrasar as metas de universalização, a Reforma Tributária provoque aumento nas tarifas, afetando o orçamento de famílias de baixa renda sobretudo.
O encontro teve a presença dos senadores Eduardo Gomes (PL) e Randolfe Rodrigues (PT), e do deputado Fernando Marangoni (União Brasil), além da governadora em exercício do Distrito Federal, Celina Leão (Progressistas), que fez a abertura do evento, mediado pela jornalista Giuliana Morrone.
O presidente do Conselho de Administração da ABCON SINDCON, Roberto Barbuti, disse que o saneamento é saúde e tem sido a principal reivindicação do setor na reforma tributária, em manifestação apoiada pelo vice-presidente da AESBE, Ricardo Slavinski. Com a equiparação ao regime da saúde na reforma, seriam minimizados impactos graves e negativos sobre o setor. “Essa oneração, se aprovada pelo Congresso nesses termos, ou seja, passando de 9,25% para 27% ou 28%, será um erro histórico, com reflexos em toda a sociedade. O debate que se inicia no Senado é uma oportunidade de o Brasil corrigir esse erro”, alertou Barbuti.
O Projeto de Lei Complementar 68/24 de regulamentação do IVA da Reforma Tributária que tramita no Senado mantém a princípio a alíquota padrão do novo IVA da reforma – estimada entre 26% e 28% – sobre o saneamento. Hoje, o setor recolhe apenas 9,25% de impostos, referentes a PIS e Cofins. Essa drástica mudança de alíquota trará um aumento de 18% na conta de água.
Os senadores Gomes e Randolfe comentaram sobre impacto de uma elevação da oneração na Reforma Tributária, que é motivo de preocupação para todos os parlamentares, independente de filiação política. “Existe um consenso de que saneamento é saúde no Congresso. Não podemos onerar um setor com tamanho impacto social”, disse o senador Eduardo Gomes, que já apresentou emenda para equiparar o saneamento à saúde na reforma tributária.
Durante o seminário, foi anunciado que o relatório do grupo de trabalho da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado trazia a consideração de que o saneamento precisa ser equipado à saúde na reforma tributária, aceitando o pleito do setor. A CAE considerou 21 audiências com representantes da sociedade para chegar ao texto final do relatório. “Nós já temos o relatório da CAE e existe um comprometimento do governo e do Senado com essa agenda do saneamento como saúde na reforma tributária. Após aprovarmos a mudança no Senado, vamos costurar um entendimento com a Câmara para eliminar essa inadequação e termos as devidas retificações para não prejudicar o saneamento”, ressaltou o senador Randolfe.
Ele, que é líder do governo no Senado, lembrou que já existem resultados positivos do saneamento nos últimos anos, após a vigência do marco legal do setor. Segundo a ABCON SINDCON, com o marco legal, foram realizados 51 leilões em diversas modalidades de parceria com o setor privado com a contratação em andamento de R$ 151,7 bilhões em investimentos. Tais projetos contratualizam a universalização em 1.158 municípios. Atualmente, há 40 projetos em estruturação com investimentos estimados em R$ 113 bilhões.
Todo esse investimento pode ser comprometido com a Reforma Tributária, uma vez que a alta na tributação demandará reequilíbrio econômico de todos os contratos do setor, em um processo que será apreciado por cerca de 100 agências regulatórias. A governadora em exercício do Distrito Federal abriu os trabalhos do seminário ressaltando a oportunidade de discutir um tema tão relevante. “Saneamento é uma área essencial, é um direito básico”, resumiu Celina Leão.
Presidente da Frente Parlamentar do Saneamento, Marangoni disse que 70% das mortes de crianças até cinco anos ainda são causadas por doenças diarreicas. “Entre os enormes benefícios do saneamento na saúde estão a redução de custos do SUS com doenças que já poderiam ser prevenidas com água e esgoto tratados. Aumentar a alíquota do setor é um anacronismo”, afirmou.
Atualmente, as despesas relacionadas a essas internações somam aproximadamente R$ 2,2 bilhões, recursos que poderiam ser poupados com investimentos adequados em saneamento. Segundo os dados do Sistema Único de Saúde (SUS), as doenças relacionadas à falta de saneamento foram responsáveis por cerca de 1 milhão de internações e mais de 200 mil óbitos no último triênio. “A parceria de operadores públicos e privados tem sido fundamental para trazer essa discussão à tona. Saneamento é um direito humano essencial. Investir em saneamento é investir em saúde pública”, acrescentou Slavinski.
O médico Nelson Arns disse que os efeitos da falta de saneamento na infância serão sentidos por toda a vida. “Há efeitos em cascata que vão muito além da saúde. Sem água, não há dignidade. Não é possível nem mesmo preparar comida. A falta de saneamento afeta a escola, afeta a educação. Ele afeta principalmente os mais frágeis”, afirmou ele.