O Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) lançou na tarde desta quarta-feira (20/09) o aplicativo Infância Segura, idealizado pelo desembargador Raphael Americano Câmara e doado ao Judicipário capixaba. O lançamento, que reuniu autoridades e servidores de todos os Poderes e principais órgãos do Estado, aconteceu no plenário da Assembleia Legislativa (Ales), na Enseada do Suá, em Vitória, durante reunião extraordinária da Comissão Parlamentar de Inquérito do Abuso Sexual e Violência contra a Criança e Adolescente. Veja aqui o app.
O desembargador Raphael Câmara explicou que o Infância Segura surge para acabar com as desculpas em um País com tantos canais de denúncias contra esse tipo de crime, mas baixa punição ou resolução diante de uma “pandemia de abuso de crianças”: “Hoje no Brasil, por dia, morrem assassinadas 110 pessoas. No Brasil são estupradas 100 crianças por dia. Não sei se vivemos no País do assassinato ou no dos estupros. Não sei se nossas forças de segurança estão nos lugares certos. Não sei se a vida humana só se resume aos crimes contra a vida e se não merecem atenção também os crimes contra a dignidade sexual”, refletiu o desembargador.
Ele considera sintomático a maioria das denúncias só aparecer nas unidades de saúde. “É preciso mudar isso, é preciso enfrentar isso, é preciso mudar a cultura da subnotificação. Pesquisa recente do Ipea indica que apenas 7% dos casos são notificados. 93% dos casos de estupro essas crianças vão ter que resolver por elas mesmas”, lamentou o desembargador.
Pensando na eficiência da rede de proteção, o aplicativo condensa diversos canais de denúncias e contato dos órgãos competentes, além dos endereços e telefones de todos os conselhos tutelares do Espírito Santo. Dispõe também de uma cartilha com informações que esclarecem o que é a violência sexual infantojuvenil. “Esse aplicativo tem que estar no celular das crianças, tem que chegar nas escolas. Que ninguém ouse mais calar uma criança abusada”, conclamou o idealizador do sistema, Raphael Câmara.
O magistrado completou: “O aplicativo Infância Segura é uma ferramenta simples, gratuita e acessível que incluiu os principais canais de denúncia que compõem a rede de proteção à infância e à adolescência. Tudo no celular! Isso garante o acesso, principalmente das vítimas, de forma intuitiva e muito rápida”.
O presidente do Comitê Gestor de Tecnologia da Informação e da Comunicação do Tribunal de Justiça, desembargador Pedro Valls Feu Rosa, lembrou “a triste estatística” brasileira de que “apenas 2% de tudo o que acontece nas ruas acabam no mundo das leis”. Feu Rosa vê na ferramenta um canal para que “qualquer um do povo, de forma ágil, simples, possa fazer valer o mundo das leis para defender aquela criança vítima de exploração sexual”. E Feu Rosa acrescentou:
“Lutar contra essa realidade é o dever de cada um de nós, de cada cidadão, de cada policial, de cada juiz, de cada promotor de Justiça, de cada advogado. “E hoje aqui vem o desembargador Raphael Câmara fazer a sua parte. Ele nos traz uma ferramenta que tornará possível a qualquer um, de uma forma ágil, simples, segura, fazer valer o mundo das leis, fazer valer a justiça dos homens, diante daquelas crianças que estejam sendo ou que estejam sob risco de ser vítimas de violência sexual”.
A procuradora-geral de Justiça do Estado, Luciana Andrade, apontou as obrigações e algumas ações do Ministério Público do Estado do Espírito Santo (MPES) no combate à violência contra crianças e adolescentes e destacou a importância da integração entre os atores responsáveis. “Temos que trabalhar muito, mas os números vêm demonstrando melhoras, por conta dessa união institucional, interinstitucional e da própria sociedade civil”, afirmou a chefe do MPES.
Citando uma realidade “pós-pandemia” da Covid/19, Luciana Andrade lembrou que muitas vezes os “algozes são as pessoas mais próximas da criança, que estão dentro de suas casas.” Sobre o alto índice de casos que chegam às delegacias, a procuradora-geral de Justiça citou uma força-tarefa do MPES para analisar procedimentos e viabilidade das investigações. “Os números das delegacias são assustadores, mas nós vamos dar conta deles!”, garantiu Luciana Andrade. “E o aplicativo vem ser um apoio de tecnologia muito importante, e não poderia ser diferente neste mundo moderno e mais digital, para que a gente possa então proteger mais e mais as nossas crianças e adolescentes”, realçou a chefe do MPES.
Proteção às crianças
A sessão foi presidida pelo deputado estadual Dary Pagung (PSB) e o lançamento do app Infância Segura contou também com a presença do desembargador Jorge Henrique Valle dos Santos, supervisor das Varas da Infância e da Juventude do TJES, bem como dos desembargadores Samuel Meira Brasil Júnior e Arthur José Neiva de Almeida.
Pagung agradeceu pela deferência com o Legislativo. “É um aplicativo muito significativo. Isso mostra união entre os Poderes. E quero aqui agradecer ao doutor Pedro Valls e ao doutor Raphael Câmara por fazer o lançamento desse aplicativo, que é tão importante, principalmente, para as crianças e os adolescentes do nosso Estado do Espírito Santo, aqui na Casa de Leis”, destacou o deputado, que é também o líder do Governo na Assembleia Legislativa.
Já o deputado Tyago Hoffmann (PSB) parabenizou o “entrosamento” da CPI do Abuso Sexual e Violência contra a Criança e do Adolescente com o Tribunal de Justiça e disse que o lançamento coloca o Espírito Santo na vanguarda, de um Estado que conta com Poderes em completa independência, mas que não se furtam ao diálogo. “Importante entrelaçar cada vez mais o esforço institucional para a promoção de políticas públicas que melhorem a vida das pessoas”, defendeu Tyago Hoffmann.
Os deputados Coronel Weliton (PTB), Danilo Bahiense (PL) e Mazinho dos Anjos (PSDB) também comemoraram a chegada do aplicativo Infância Segura, mas também fizeram apontamentos de gargalos que precisam desaparecer a favor de tal combate na sociedade capixaba. Coronel Weliton disse acreditar que o app será modelo para outros Estados, mas que um fator dificultador é a qualidade dos sinais de telefonia móvel no Espírito Santo, defendendo que o Judiciário deveria fazer um chamamento com as operadoras sobre esse problema. O deputado Mazinho dos Anjos concordou com o colega e afirmou que cidades do interior com índice altíssimo de violência contra mulheres e crianças são as que também apresentam enorme dificuldade de telefonia.
Prestigiaram ainda o evento o subprocurador geral do Estado do Espírito Santo, Rafael Drews, representando o governador Renato Casagrande, que se encontra em viagem aos Estados Unidos e Canadá; o juiz assessor especial da Presidência do Tribunal de Justiça, Daniel Peçanha Moreira; o coordenador das Varas da Infância e Juventude do TJES, juiz Arion Mergar; a presidente da Associação dos Magistrados do Espírito Santo (Amages), juíza Glícia Mônica Dornela Alves Ribeiro; e a presidente da Comissão da Infância e Juventude da OAB-ES, advogada Vanessa Brasil da Silva.