O juiz Alcemir dos Santos Pimentel, da Vara Única da Comarca de Fundão, acolheu denúncia do Ministério Público do Estado do Espírito Santo e transformou em réu o desocupado Felipe Cavalini Pedroso, 46 anos, pelas acusações de maus tratos a animais e desacato à autoridade. Felipe chegou a ser preso, no dia 18 de janeiro de 2023, quando representantes da CPI dos Maus Tratos aos Animais da Assembleia Legislativa do Espírito Santo e da “ONG SOS Resgate de Animais Carentes” foram até seu imóvel, situado na Avenida Atlântica, checar denúncias feitas por moradores de Praia Grande. No entanto, pagou fiança e foi solto. No mesmo despacho, proferido na tarde de quinta-feira (02/03), o juiz Alcemir Pimentel decidiu também que Felipe está proibido de manter a atividade de criação e comercialização de animais e determinou que os cães apreendidos e resgatados sejam entregues à ONG SOS Resgate de Animais Carentes.
De acordo com a Ação Penal 0000055-66.2023.8.08.0059, Felipe fora autuado em flagrante delito por manter um canil clandestino destinado à reprodução e comercialização de cachorros da raça “American Extreme Pit Monster” com “American Bully”, no decorrer dos meses de dezembro de 2022 a janeiro de 2023. De acordo com a peça acusatória, assinada pelo promotor de Justiça Egino Gomes Rios da Silva, “o cerne da acusação se volta à prática de abusos e maus tratos aos animais, inclusive com a morte de alguns deles”. A situação começou a atrair a atenção de vizinhos, que ficaram incomodados com o mau cheiro e revoltados com as cenas chocantes de maus tratos e passaram a realizar postagens em redes sociais e denúncias junto às autoridades competentes, clamando por providências.
Os fatos chegaram ao conhecimento da CPI dos Maus Tratos aos Animais da Ales e da “ONG SOS Resgate de Animais Carentes”, que conseguiram acionar a polícia e a fiscalização ambiental da Prefeitura Municipal de Fundão. Em uma primeira diligência de averiguação, realizada no dia 18 de janeiro de 2023, a equipe pode constatar a procedência dos relatos de maus tratos, constatando, ainda, a presença de um cachorro morto e cheios de lesões, que estava jogado em frente ao imóvel de responsabilidade do denunciado.
Segundo apurado, o cachorro em questão estava em situação de rua. Felipe pegou o animal na noite anterior e o colocou junto com sua criação, passando a estimular, aos gritos, que seus cachorros atacassem e matassem o cão. Durante o evento, os vizinhos ouviram barulho de pauladas e gritos de “bate, bate”. Vale registrar que, por ocasião da prisão em flagrante, Felipe desacatou os policiais militares atuantes (SD Cirilo, SD Scopel e SD Silvana), chamando-os de “porcos e safados”, além de proferir falas intimidatórias, dizendo que “só estão protegidos enquanto estiverem de farda, pois é autor de 36 homicídios e vou pegar vocês quando estiver na rua solto”.
Não satisfeito, descreve a denúncia do MPES, Felipe também proferiu ameaças de morte contra o assessor parlamentar Juarez Rodrigues de Lima Filho, que estava acompanhando a diligência, dizendo que “iria atrás dele (Gordinho) e o mataria aonde o encontrasse”.
Consta ainda que Felipe foi inicialmente conduzido à presença da autoridade policial e autuado em flagrante delito. Os cachorros foram mantidos no local, apontando-se como depositária a esposa do próprio agressor. O denunciado, então, foi submetido à Audiência de Custódia no dia 19 de janeiro e posto em liberdade, tendo prontamente retornado ao local e dado continuidade aos atos de abuso e maus tratos aos animais. O desfecho causou revolta de moradores de Praia Grande, que começaram a se mobilizar para promover justiça com as próprias mãos.
Continua o promotor de Justiça Egino Rio na denúncia, afirmando que, diante “do agravamento da situação e perpetuação da prática do crime”, foi realizada uma segunda diligência, agora destinada ao resgate dos animais, que ocorreu no dia 20 de janeiro de 2023, em uma ação conjunta dos órgãos competentes. Foram resgatados, ao todo, 10 cães, que foram retirados do canil clandestino de responsabilidade de Felipe e encaminhados para clínica veterinária para tratamento. Assim que tiveram alta, os animais foram colocados em lares temporários para fins de adoção responsável, por meio da atuação da “ONG SOS Resgate de Animais Carentes”.
Conforme atestado elaborado por médica veterinária que acompanhou a operação de resgate, todos os animais apresentavam indicativos notórios de maus tratos, com lesões de pele, ocular e escoriações por todo o corpo, presença de ectoparasitas e secreções, score corporal baixo, sintomas de diarreia e vômitos, dentre outros achados relevantes.
Diante da gravidade dos crimes, o MPES requereu a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, posto que Felipe, preso em flagrante, pagou fiança e responde solto à Ação Penal. “No caso vertente, há indícios de crueldade contra dezenas de cachorros da raça ‘American Extreme Pit Monster’ com ‘American Bully’, mantidos em situação de penúria, sem qualquer tipo de higiene, sem água, sem energia elétrica, sem bebedouros e sem comedouros, trancafiados em meio a fezes, urina e lixo. Segundo consta da Denúncia e dos elementos coligidos ao Inquérito Policial, os animais, em disputa por comida, brigavam entre si e praticavam canibalismo, tendo a situação atraído diversas denúncias por parte de populares, que culminaram com a intervenção da ‘CPI dos Maus Tratos aos Animais’ da Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo e, também, da ‘ONG SOS Resgate de Animais Carentes’, que interviram no caso, junto as polícias e à fiscalização ambiental da Prefeitura de Fundão”, pontuou o juiz Alcemir dos Santos Pimentel.
Em razão desses fatos graves de maus tratos, requer o Ministério Público solicitou que Felipe seja proibido, por força de ordem judicial, a manter a atividade de criação e comercialização de animais, o que foi deferido pelo magistrado, “uma vez que as provas até então carreadas indicam que o Denunciado, com propósito comercial, mantinha os animais de sua custódia em condição de penúria.”
Sendo assim, prossegue a decisão judicial, Felipe fica proibido de manter a atividade de criação e comercialização de animais, por si e por interposta pessoa, cabendo às Policias Militar e Cível e à Prefeitura de Fundão, através da Secretaria de Meio Ambiente, a fiscalização da presente ordem.
“Saliento ao Denunciado que, a presente medida poderá perdurar enquanto presentes os requisitos do art. 282 do Código de Processo Penal e, eventual desobediência, poderá servir como requisito para a decretação de sua prisão preventiva, no decorrer de todo o processo”, escreveu o juiz Alcemir Pimentel.
O magistrado entendeu ainda que Felipe não reúne condições mínimas de criar cães, o que inviabiliza eventual pretensão de restituição. “Nessa senda, de rigor o deferimento do pleito para salvaguarda dos animais resgatados. Assim sendo, confirmo a entrega dos cães apreendidos e resgatados em poder do Denunciado, em favor da ONG SOS Resgate de Animais Carentes, por meio de sua representante, ficando a entidade responsável pela guarda temporária, cuidados e destinação dos animais para novos tutores. Defiro, ainda, o pleito Ministerial para que o MUNICÍPIO DE FUNDÃO, por meio da Secretaria de Meio Ambiente, promova o custeio do tratamento das intervenções de segurança e bem-estar animal, até o desfecho do processo”, conclui o juiz.