A juíza Sayonara Couto Bittencourt, da 4ª Vara da Fazenda Pública Estadual e Municipal, indeferiu pedido de liminar, em um mandado de segurança impetrado pelo delegado de Polícia Civil e vereador Leandro Piquet de Azeredo Bastos (Vitória/Republicanos), que pleiteava suspender o ato que o transferiu da Delegacia de Pessoas Desaparecidas, onde ocupava o cargo de delegado-adjunto, para a Delegacia de Plantão de Homicídios, ambas localizadas na sede do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), no bairro Barro Vermelho, na Capital capixaba. Piquet já recorreu da decisão por meio de Agravo de Instrumento junto ao Tribunal de Justiça.
Conforme o Blog do Elimar Côrtes informou no dia 8 de outubro de 2021, naquela data o delegado-geral da Polícia Civil, José Darcy Arruda, promoveu a transferência de três delegados para outras unidades operacionais. Afirmou que a transferência dos profissionais foi realizada por motivos estritamente operacionais em decorrência da necessidade de otimizar a distribuição de efetivo policial, visando o melhor atendimento à população”.
Um dos transferidos foi justamente Leandro Piquet. Ao tomar conhecimento da transferência pelo Diário Oficial do Estado, Piquet usou suas redes sociais para criticar a mudança, alegando estar sendo vítima de “perseguição”. Leandro Piquet foi transferido para a Delegacia de Plantão de Homicídios, em Vitória.
Piquet alega que a sua transferência para uma unidade onde tem que trabalhar em regime de plantão prejudica o seu trabalho como vereador na Câmara Municipal de Vitória. Na decisão, porém, a juíza Sayonara Bittencourt cita a Constituição Federal e afirma que, neste caso, o vereador Leandro Piquet tem que optar em se licenciar do cargo efetivo, que é o de Delegado de Polícia, optando, no entanto, pela melhor remuneração salarial.
Indignado, no dia 8 de novembro Leandro Piquet entrou na Justiça com mandado de segurança, por meio dos advogados Renan Gouveia Furtado e Edmar Lorencini dos Anjos, o Mazinho, que é ex-vereador da Capital capixaba. O mandado de segurança foi impetrado em face de ato tido como coator perpetrado pelo chefe da Polícia Civil, delegado José Darcy Arruda.
Na ação, Leandro Piquet alegou, em suma, que: 1) ocupa o cargo de Delegado de Polícia deste Estado e, desde 1º de janeiro de 2021, exerce o mandato de vereador no município de Vitória; 2) acumula o exercício do seu cargo efetivo com o mandato eletivo de vereador, visto que presente o requisito de compatibilidade de horários; 3) desde o final de 2019, se encontrava localizado na Delegacia de Pessoas Desaparecidas, exercendo seu múnus público de forma regular, como Delegado Adjunto, em horário e expediente administrativo (de segunda a sexta com carga horária de 40 horas semanais) e, ainda, o mandato eletivo de vereador, comparecendo às atividades do parlamento de forma regular; 4) no dia 08 de outubro de 2021, foi publicada a Instrução de Serviço nº 221-D, de 07.10.2021, localizando-o na Delegacia de Plantão-Homicídios, subordinada à SPE, sem que, para tanto, houvesse prévia motivação e fundamentação idônea e suficiente para tal; 5) o referido ato, além de ilegal e arbitrário, inviabilizará o exercício do seu mandato eletivo de vereador, tendo em vista que as atividades diuturnas exercidas em regime de plantão frustrarão o seu comparecimento no legislativo municipal; e 6) houve violação ao seu direito líquido e certo.
Em sede de medida liminar, o vereador-delegado requereu a suspensão do ato de sua remoção e localização, até o julgamento final da presente ação. Na decisão, a juíza Sayonara Couto Bittencourt explica que o sistema jurídico brasileiro adotou a Teoria da Substanciação, de modo que a causa de pedir deve narrar fatos e fundamentos jurídicos, mas, especificamente, com relação ao Mandado de Segurança, criou uma particularidade: o fato narrado tem de ser incontroverso, exigindo-se prova pré-constituída.
“Nessa esteira, é cediço que para a concessão de tutelas de urgência em mandado de segurança é imprescindível que sejam demonstrados tanto o fumus boni iuris quanto o periculum in mora. Em sede de cognição sumária, a qual comporta à espécie, entendo que o impetrante (Leandro Piquet) não tem direito a liminar pretendida, uma vez que ausentes os requisitos legais do artigo 1º, da Lei nº 12.016/09, especificamente, a prova pré-constituída do direito alegado”.
Isso porque, pondera a magistrada, o Estatuto dos Servidores Públicos do Estado (LC n° 46/94), que dispõe sobre a lotação e localização dos servidores, “tendo em vista que a LC n° 3.400/81 é omissa quanto aos critérios sobre a remoção ex-offício, vê-se que o procedimento em questão balizar-se-á, preferencialmente, pelos parâmetros ali dispostos, faculdade essa que por si só prejudica a pretensão liminar do impetrante, vejamos:
“Art. 33 Os servidores públicos dos Poderes Legislativo e Judiciário e das autarquias e fundações públicas serão lotados nos referidos órgãos ou entidades, e a localização caberá à autoridade competente de cada órgão ou entidade.
Art. 35. A localização do servidor público dar-se-á:
I – a pedido;
II – de ofício.(…)
- 2º Se de ofício e fundada na necessidade de pessoal, a escolha da localização recairá, preferencialmente, sobre o servidor público:
- a) de menor tempo de serviço;
- b) residente em localidade mais próxima;
- c) menos idoso.”
De acordo com Sayonara Bittencourt, “assim, sendo concedido o atributo da facultatividade pela adoção de tais critérios, até mesmo para não criar engessamento da organização estatal, a princípio não há que se falar em ilegalidade, salvo em caso de demonstração de desvio de finalidade do ato ou abuso de poder, o que, contudo, aparentemente não é o caso dos autos”.
No caso, a transferência do delegado Leandro Piquet para a Delegacia de Plantão-Homicídios se deu para fins de “fortalecer a capacidade investigativa da DHPP em virtude dos recentes homicídios ocorridos na capital”. Portanto, neste momento, “não havendo prova ou indício de mácula entre fundamentação adotada pela autoridade coatora e a transferência em questão, não há que se falar em infringência à teoria dos motivos determinantes do ato administrativo, razão pela qual resta prejudicada a demonstração do fumus boni iuris invocado na inicial”.
Sobre “a alegação de que a transferência inviabilizaria o exercício do seu mandato eletivo de vereador”, salienta a magistrada, “observa-se que o impetrante (Leandro Piquet) não trouxe qualquer prova quanto ao suposto prejuízo – compatibilidade de horário/agenda política, ônus que lhe incumbia, eis que se trata de ação mandamental, onde se exige a demonstração de prova pré-constituída”.
Ademais, ensina Soraya Bittencourt, conforme determina o inciso III do art.38 da Constituição Federal, “se não houver conciliação da carga horária dos cargos que exerce, tal acumulação deverá ser declarada ilícita, devendo o servidor ser instado a se afastar do seu cargo efetivo, facultando-lhe optar pela remuneração desse cargo”.
Desta feita, “a priori, não vislumbro qualquer ilegalidade no ato de remoção, restando, portanto, ausente a demonstração dos requisitos legais, razão pela qual INDEFIRO o pedido liminar postulado”, decidiu a juíza.
No dia 11 de novembro, a juíza Sayonara Bittencourt, ratificou a decisão, ao analisar Recurso de Agravo de Instrumento interposto pela defesa do delegado-vereador Leandro Piquet: “A parte impetrante apresentou petição (ID 10349809) informando que interpôs recurso de agravo de instrumento face a decisão supramencionada. Na ocasião, requereu o exercício do juízo de retratação. Em que pese os argumentos expendidos, mantenho o decisum outrora proferido pelos fatos e razões ali expostos”.
Em nota, o vereador Leandro Piquet se manifestou sobre a decisão judicial:
1 – A decisão de primeira instância que rejeitou minha liminar levou em conta um ato de remoção ocorrido em 2019. Ato que não foi contestado na ação. Nos insurgimos contra o ato de remoção do dia 8/10/2021. Tal decisão já se encontra sob análise do Tribunal de Justiça.
2 – Vamos deixar claro: não sou político de carreira, sou delegado concursado e mandato não é emprego, é um munus público temporário a favor da população.
3 – O ato questionado afronta a Lei nacional 12.830/2013, que proíbe a remoção de delegados sem fundamentação plausível e específica. Tal lei não foi considerada na decisão de primeiro grau. Aplicou-se o Estatuto dos servidores públicos, uma norma geral que não serve para o meu caso.
4 – Esta minha luta constitucional de acumular as funções é um esforço para manter a eficiência da segurança pública que, como você bem sabe, está respirando por aparelhos e carente de delegados.
O delegado-vereador Leandro Piquet já recorreu junto ao Tribunal de Justiça por meio de um Agravo de Instrumento, contra a decisão da juíza Sayonara Bittencourt, em que pede:
a) Nos termos do art. 1.019, I, do CPC/15, seja atribuído imediato efeito suspensivo ativo ao presente recurso, a fim de suspender o ato oriundo da instrução de serviço nº. 221-D de 07/10/2021, retornando o impetrante para o período administrativo de 40 horas semanais na delegacia de pessoas desaparecidas, possibilitando o agravante de exercer, com plenitude, o mandato de vereador e a atividade de delegado de polícia;
b) Seja anulada/reformada a decisão agravada, sendo, por conseguinte concedida/confirmada a tutela de urgência, para suspender o ato oriundo da instrução de serviço nº. 221-D de 07/10/2021, retornando o impetrante para o período administrativo de 40 horas semanais na delegacia de pessoas desaparecidas, o agravante de exercer, com plenitude, o mandato de vereador e a atividade de delegado de polícia.