O juiz Maurício Ferreira Fontes, da Vara do Juizado Especial Cível e Criminal da Comarca de Fernandópolis, município situado na Região Noroeste do Estado de São Paulo, condenou o governo paulista a indenizar a cabo da Polícia Militar Renilde Fátima Pereira Padilha, por deixar de conceder reajuste salarial desde janeiro de 2015. A policial Renilde (na foto, ao lado com o marido e o filho) foi representada pelos advogados João Lucas Delgado de Avellar Pires e Marco Antonio Bronzatto Paixão, da Delgado & Paixão da Sociedade Advogados.
A decisão abre uma brecha no judiciário, pois a maioria dos Estados brasileiros – incluindo o Espírito Santo – vem se negando a repassar para os servidores públicos civis e militares sequer a reposição inflacionária dos últimos anos. Alegando “crise econômica”, os governadores, em sua maioria, descumprem em relação aos servidores ligados aos Executivos Estaduais o que reza a Constituição Federal.
Na sentença proferida no dia 25 de setembro deste ano, nos autos de número 1004836-24.2017.8.26.0189, o juiz Maurício Ferreira Fontes julga procedente o pedido da policial Renilde a fim de condenar a ré (Fazenda Pública do Estado de São Paulo) a pagar à parte autora indenização por danos materiais consubstanciada:
a) Na variação percentual do INPC de 01/03/2014 a 01/03/2015, calculada sobre o salário-base ou vencimento padrão da parte autora (Renilde) de março de 2015 a fevereiro de 2016, e respectivos reflexos;
b) Na variação percentual do INPC de 01/03/2014 a 01/03/2016, calculada sobre o salário-base ou vencimento padrão da parte autora de março de 2016 a fevereiro de 2017, e respectivos reflexos;
c) Na variação percentual do INPC de 01/03/2014 a 01/03/2017, calculada sobre o salário-base ou vencimento padrão da parte autora de março de 2017 a fevereiro de 2018, e respectivos reflexos.
Os valores, descreve o magistrado, deverão ser atualizados a partir da data de cada vencimento e acrescidos de juros moratórios desde a data da citação. O pedido de indenização feita na inicial é de R$ 14 mil, mas os cálculos finais serão feitos.
O juiz Maurício Ferreira Fontes é bem didático na sentença. Afirma logo de prontidão que, no mérito, “o pedido é procedente”. Informa que, resumidamente, a policial militar Renilde Padilha busca indenização por omissão estatal, ao argumento de que o Estado ignorou o artigo 37, X da Constituição Federal, e o artigo 115, XI, da Constituição do Estado de São Paulo, “que asseguram o direito a revisão geral e anual da remuneração dos servidores públicos, relativamente aos anos de 2015, 2016 e 2017”
Ensina o magistrado que, regulamentando ambos os dispositivos constitucionais, a Lei Estadual nº 12.391/2006 fixou em 1º de março de cada ano a data-base para fins de revisão da remuneração dos servidores públicos do Estado de São Paulo, relegando a lei específica a definição do índice de reajuste (arts. 1º e 2º, II, da mencionada lei).
“Portanto, não há a menor dúvida quanto ao direito do servidor público à revisão anual e geral de sua remuneração, pois só assim se assegura a irredutibilidade de vencimentos prevista no art. 37, XV, da Constituição Federal. No caso em apreço, é fato notório e incontroverso que, na data-base legal dos anos de 2015, 2016 e 2017, a ré (Fazenda Pública do Estado de São Paulo) ignorou o comando constitucional, deixando de editar lei versando sobre a revisão anual da remuneração da parte autora”, diz Maurício Fontes.
Segundo ele, a jurisprudência já pacificou o entendimento de que o Poder Judiciário não pode substituir o Poder Executivo, estabelecendo reajustes salariais que dependem de lei de iniciativa privativa do Chefe do Executivo, conforme o disposto no artigo 37, X, da Constituição Federal.
“Isto não impede, porém, a análise da questão sob o prisma da responsabilidade civil do Estado. A omissão da ré e a consequente ilicitude de sua conduta são inequívocas. Neste ponto, aliás, o próprio Supremo Tribunal Federal já reconheceu a ilegal omissão da ré nos autos da ADI nº 2492, julgando procedente o pedido formulado naquela ação para assentar a omissão do Chefe do Poder Executivo do Estado de São Paulo quanto ao encaminhamento de projeto de lei visando a revisão geral dos vencimentos do funcionalismo estadual. Esta omissão também causa claro prejuízo aos servidores. Ninguém ignora os efeitos nocivos da inflação, sendo certo que a ausência de revisão anual da remuneração do funcionalismo implica, na prática, em redução salarial, ante a perda do poder de compra por parte dos servidores. Daí o inegável dano à parte autora. Assim, presente o ato ilícito por omissão e o dano dele decorrente, subsiste o dever de indenizar por parte da ré”, sustenta o juiz Maurício Fontes que apresenta, na sentença, julgados do próprio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
Segundo o magistrado paulista, o prejuízo se consubstancia na perda do poder de compra por parte do servidor, de modo que respectiva reparação deve guardar relação com índice oficial de inflação, adotando-se, para este fim, o INPC divulgado pelo IBGE.
Governo paulista deixa de cumprir lei criada em 2014 que estabelece reajuste salarial na área de segurança pública
Na ação movida em favor da policial Renilde, os advogados João Lucas Delgado de Avellar Pires e Marco Antonio Bronzatto Paixão demonstraram a intenção de condenar a Fazenda Pública do Estado de São Paulo a reparar os prejuízos causados aos servidores públicos integrantes das carreiras policiais civis e militares, da Secretaria de Segurança Pública e da Secretaria da Administração Penitenciária, “ante a inércia da mesma em proceder à revisão anual dos vencimentos, que se encontram sem reajuste ou revisão desde julho de 2014, ou seja, há quase três anos, contrariando disposto na Emenda Constitucional nº 19/98, que deu nova redação ao inciso X do art. 37 da CF”.
Eles salientam que a Lei Complementar 1249/2014 dispõe sobre a reclassificação dos vencimentos dos integrantes das carreiras policiais civis e militares. Esta lei reajustou os valores dos vencimentos dos servidores públicos estaduais ligados à Secretaria de Segurança Pública, que estavam previstos na Lei Complementar n.º 1.223/2013, penúltima Lei Complementar que efetuou o referido reajuste.
“Desta forma, desde o advento da LC 1249/14, os servidores públicos ligados à Secretaria de Segurança Pública não mais receberam qualquer reajuste ou revisão geral anual de seus vencimentos, estando em defasagem desde o ano de 2015, tomando-se como a data base o mês de março. Tratando-se de mero reajuste, o valor das despesas com pessoal não se eleva de um exercício para o outro, mas as receitas sobem, o que sempre irá permitir o reajuste. Observe-se, então, que uma decisão favorável não vulnera ou agride a Lei de Responsabilidade Fiscal pelo simples motivo de se tratar de reajuste indenizado, não de aumento de salário, além de ter sido concedido por ordem judicial”, explicam os advogados na ação.
“A briga contra o Estado de São Paulo é árdua. Não é fácil brigar contra a máquina. Foi uma decisão boa e interessante, que pode abrir um precedente para outros magistrados”, disse o advogado João Lucas Delgado ao Blog do Elimar Côrtes.
No Espírito Santo, as idas e vindas da Justiça retardam julgamento de ação movida pelo Sindipol
No dia 12 de setembro, relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão nº 0016538-67.2017.8.08.0000, em que a Federação dos Servidores Públicos Federais, Estaduais e Municipais do Espírito Santo (FESPUFEMES) requer a reposição da inflação aos policiais civis capixabas e demais servidores públicos, intimou a FESPUFEMES a se manifestar a respeito da preliminar de ilegitimidade suscitada pelo Estado.
A FESPUFEMES entrou com a ADI atendendo pedido do Sindicato dos Servidores Policiais Civis do Estado do Espírito Santo (Sindipol/ES). A atual gestão assumiu o governo no início de 2015 e não conferiu um único reajuste ao funcionalismo público nestes três anos de governo.
“Essa situação reverbera como desrespeito a lei, na medida em que a recomposição salarial é um direito de todo o trabalhador, inclusive dos servidores públicos”, disse o presidente do Sindipol, Jorge Emílio Leal.
Por causa desse quadro, o Sindipol/ES, “como única, legítima e legalmente constituída organização sindical representativa de todos os cargos da Polícia Civil, ingressou com Mandado de Injunção, com o objetivo de que o direito fosse reconstituído”, acrescenta o presidente da entidade.
Só que a ação não foi acolhida pelo Tribunal de Justiça, sendo alegado que não seria a medida judicial pertinente e sim a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão.
“Não entendendo desta forma, o Sindipol/ES interpôs o pertinente recurso extraordinário, o qual se encontra suspenso com repercussão geral”, completa o presidente Jorge Emílio.
Diante da negativa do Tribunal de Justiça, foi interposta Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, sendo que nesta ingressou como terceiro interessado a FESPUFEMES. Novamente a ação foi negada, agora sob dois argumentos: o primeiro de que o Sindipol/es não representa todos os servidores públicos estaduais e, sim, somente os servidores policiais civis; e, o segundo, de que ainda que a FESPUFEMES esteja no polo ativo da demanda, não é pertinente a intervenção de terceiros em demandas desta natureza.
Diante de mais uma negativa do Tribunal de Justiça, porém, a FESPUFEMS ajuizou ADIN por Omissão, onde pleiteia, em nome próprio, a revisão da remuneração dos servidores públicos.