Maior estrutura prisional do Espírito Santo, o Complexo Penitenciário de Viana recebeu na segunda-feira (22/02) a visita do presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski. Além de lançar a interiorização das audiências de custódia e o programa Cidadania nos Presídios, o ministro teve a oportunidade de conversar com detentos que receberam benefícios a que tinham direito de acordo com a legislação nacional. A visita foi acompanhada pelo governador Paulo Hartung e pelo presidente do Tribunal de Justiça do Espírito Santo, desembargador Annibal de Rezende Lima.
Depois de passar mais de um quarto de sua vida dentro de uma cela, João, 42 anos, decidiu que era hora de mudar. “Já perdi o crescimento da minha filha, o contato com a família, chega uma idade que a gente percebe as coisas de um jeito diferente”, disse.
Destacado pelo bom comportamento, ele foi o primeiro preso do País a participar de uma audiência concentrada do programa Cidadania nos Presídios, que altera dinâmicas nas varas de execução penal para garantir mais agilidade na análise dos benefícios da comutação, indulto, progressão de regime e livramento condicional. Um dos focos do programa é combater a superlotação, e somente no Espírito Santo, espera-se liberar cerca de cinco mil vagas até setembro.
Preso duas vezes, uma por roubo e outra por homicídio, João deveria ter sido contemplado por diversos benefícios de comutação por se enquadrar nos critérios previstos em decretos presidenciais editados entre 2010 e 2015, revisão que nunca ocorreu devido ao excesso de trabalho nas varas criminais.
Com o Cidadania nos Presídios, a revisão tornou-se possível com o rearranjo de métodos para tornar as rotinas de execução penal mais eficientes. Foi assim que João teve sua pena de mais de 22 anos reduzida para pouco mais de 13 anos, além de receber livramento condicional. A audiência ocorreu dentro de um ônibus especialmente adaptado para o Cidadania nos Presídios, que levará o programa a diversos pontos do estado de forma itinerante.
Calceteiro de profissão, João é um dos 3,6 mil presos do Estado que tiveram a oportunidade de voltar a estudar dentro do cárcere. Ele conseguiu avançar da quarta até a sétima série, além de descobrir um dom inusitado – seu caderno de desenhos tornou-se companheiro inseparável e foi o primeiro pedido que fez antes de obter o alvará de livramento condicional. Para o futuro, João planeja lançar uma marca de roupas aplicando as formas multicoloridas que desenvolveu dentro do presídio.
O ministro Ricardo Lewandowski ainda conheceu as instalações do Presídio de Segurança Máxima 2 do Complexo Penitenciário de Viana, considerado modelo no Estado, onde teve a oportunidade de conversar com outros detentos e emitir alvarás para progressão de regime. Um dos detentos contou ao presidente do Supremo que a situação nos presídios do estado vem mudando nos últimos anos, com o enfraquecimento de facções criminosas e a retomada de maior controle estatal, além da redução dos casos de violência policial.
Durante entrevista coletiva concedida a jornalistas no final da visita, o ministro Ricardo Lewandowski destacou a necessidade de respeitar os direitos dos presos como forma de combater os problemas de segurança pública.
“O cidadão que está preso continua sendo um cidadão, com todos os direitos que a Constituição garante, sobretudo, integridade física e moral. O preso precisa ser tratado com dignidade, como qualquer pessoa. Hoje no Brasil, prestigiando esse princípio, nós reintroduzimos o egresso na sociedade, contribuindo para mitigar a criminalidade. Estamos dando esperança aos que estão isolados”, pontuou o presidente do Supremo que, ao final da cerimônia, foi presenteado com um quadro pintado por um interno do Complexo de Segurança Máxima de Viana, momento em que voltou a afirmar que, a exemplo do jovem que o presenteou, todos têm o direito de recomeçar.
Na tarde de segunda-feira, aconteceu Sessão Solene de lançamento do Projeto Cidadania nos Presídios. A cerimônia foi no Salão Pleno do Palácio da Justiça, com a presença do ministro Ricardo Lewandowski.
Segundo o presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Annibal de Rezende Lima, “é preciso que a sociedade brasileira, reconhecidamente tão generosa, aceite e adote mecanismos que permitam a reintegração plena do apenado à comunidade, oferecendo-lhe uma nova chance de coexistência social, de tal modo tenha ele um futuro melhor, seja no recesso da família, seja no ambiente de trabalho, independentemente das circunstâncias que o levaram anteriormente ao crime e à prisão”.
E esse é o objetivo do Projeto “Cidadania nos Presídios”, do CNJ, que é voltado, primordialmente, para o exame dos processos de execução penal dos sentenciados em condições de serem contemplados com benefícios, como indulto, comutação de pena, concessão de liberdade condicional ou progressão de pena. O programa também visa implementar ações integradas para oferecer capacitação profissional e apoio psicossocial aos egressos para que eles possam ser reintegrados à sociedade.
Segundo o ministro Ricardo Lewandowski, “este projeto consiste exatamente em dar apoio aos egressos do Sistema Prisional, não só isso, agilizarmos os benefícios a que tem direito os presos pela lei de execução penal, e pelo próprio Código Penal, o direito a progressão de regime, do regime fechado para o semiaberto, do semiaberto para o aberto, os indultos, as liberdades condicionais, isso precisa ser feito a tempo, tempestivamente”, destacou o presidente do STF e do CNJ, que, enquanto esteve em Vitória, foi escoltado por agentes do Núcleo de Segurança da Justiça Federal do Espírito Santo.
O desembargador Annibal de Rezende Lima garantiu ao ministro Ricardo Lewandowski que “a magistratura capixaba, formada por juízes e juízas da melhor sensibilidade social e da melhor qualificação profissional, envolver-se-á, decididamente, no projeto ‘Cidadania nos Presídios’ para assegurar seu pleno êxito no Espírito Santo e, assim, servir de exemplo e de estímulo aos demais Estados da Federação”.
(Com informações e fotos dos Portais do CNJ e TJES)