A juíza Sayonara Couto Bittencourt, da 4ª Vara da Fazenda Pública Estadual, Municipal, Registros Públicos, Meio Ambiente e Saúde de Vitória, concedeu mandado de segurança que permite ao delegado David de Santana Gomes voltar às suas atividades na Polícia Civil. A sentença da magistrada, assinada no dia 10 deste mês, determina à chefe de Polícia, delegada Gracimeri Soeiro Gaviorno, a localizar David Gomes na função de Delegado Plantonista na 7ª Delegacia Regional de Cachoeiro de Itapemirim ou onde entender a Administração da Polícia.
Com a decisão, a juíza Sayonara Bittencourt declara a ilegalidade da Instrução de Serviço nº 27, publicada em 26 de janeiro deste ano, que afastava o delegado Davi de suas funções depois de sofrer retaliações por parte de Gracimeri Gaviorno e do ex-chefe de Polícia Civil, delegado Joel Lyrio Júnior.
Na ação de número 0003829-93.2015.8.08.0024, protocolada na Justiça no dia Fausto Alonso Ferreira, do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado do Espírito Santo (Sindepes), a juíza Sayonara Bittencourt relata que, na qualidade de delegado titular da Delegacia de Crimes Contra o Patrimônio de Guarapari, em razão de inúmeros registros de Boletins de Ocorrências, relatando diversos furtos/roubos de celulares e outros aparelhos eletrônicos em casas noturnas e ambientes similares no município, David de Souza instaurou o Inquérito Policial nº 010/2015, para apuração dos fatos.
Por se tratar de um tipo de ocorrência em que a ação penal tem que ser de urgência, o delegado adotou a estratégia policial de comparecer pessoalmente ao local do evento – Pedreira Adventure’s, em 8 de janeiro deste ano – com equipe policial.
David Gomes relata ainda que ao se dirigir ao local e, “tentar adentrar aos locais necessários à realização do trabalho policial, teve a entrada obstaculizada pelos seguranças do local do evento, que equivocadamente entenderam que o Impetrante e demais policiais ali estavam com outra finalidade que não a realização do imperioso trabalho policial.”
Na ação, o delegado conta que em razão da interferência pelos seguranças, perdeu-se o trabalho investigatório planejado. Por isso, ele determinou a condução dos seguranças ao Plantão da Regional de Guarapari para procedimentos legais, sendo confeccionado o Termo Circunstanciado.
No entanto, após os acontecimentos, o então chefe de Polícia Civil, delegado Joel Lyrio Júnior, entendeu pela “Suspensão preventiva” de David Gomes, afastando-o de sua função policial e da investigação sobre os fatos noticiados no Inquérito Policial nº 10/2015, colocando-o à disposição da Corregedoria-Geral da Polícia Civil, até ulterior deliberação, através da Instrução de Serviço nº 16.
Após apresentar pedido de reconsideração, a sucessora de Joel Lyrio, delegada Gracimeri Gaviorno, promoveu a substituição da medida cautelar de suspensão preventiva pela alteração de localização, com a transferência de David Gomes para a Regional de Cachoeiro, por meio das Instruções de Serviços de nº 66-D e nº 67-D, ambas publicadas no Diário Oficial do Estado de 23 de janeiro deste ano.
No entanto, posteriormente, através da Instrução de Serviço nº 27, “eivada pelo vício da ilegalidade”, segundo a defesa de David de Souza, revogou a determinação anterior, afastando preventivamente o delegado das suas funções, colocando-o à disposição da Corregedoria Geral da Polícia Civil, “até ulterior deliberação”.
Ao entrar na Justiça, em fevereiro deste ano, David de Souza requereu a concessão de medida liminar, no sentido de determinar à Chefia de Polícia Civil que tornasse sem efeito a segunda Instrução de Serviço que o afastou das funções. E, no mérito, postulou pela confirmação da liminar, sendo concedida em definitivo a segurança
A Justiça, no entanto, indeferiu o pleito liminar postulado, por entender ausentes os requisitos autorizativos para tal. Foi determinado, ainda, a notificação da Chefia de Polícia Civil para prestar as informações necessárias e, após, vistas ao Ministério Público para parecer. Tanto a Polícia quanto o Ministério Público pugnaram pela não concessão da segurança.
Na análise do mérito, a juíza Sayonara Bittencourt informa na sentença que a Chefia de Polícia Civil relata que o afastamento preventivo do delegado Davi de Souza não teve relação com os fatos narrados na peça de ingresso, referente à investigação empreendida na Pedreira Adventure’s Park, em Guarapari, “mas sim, a Investigação Sumária nº 154/2014, que originou o PAD nº 002/205, instaurada após denúncia para apurar a conduta incompatível do Impetrante para com o cargo que ocupa, qual seja, perturbação do sossego dos moradores do condomínio onde residia.” Porém, na época da investigação policial na casa de shows, a Chefia de Polícia informou à imprensa que o delegado estava sendo afastado por causa da ação dentro da Pedreira.
“Nesse passo, em que pese os argumentos apresentados pela Autoridade Coatora, referente a divergência entre os fatos narrados na inicial e os motivos da investigação sumária que culminou com o afastamento do Impetrante, constata-se que tal fato não prejudica a apreciação pelo Poder Judiciário de suposta violação do direito líquido e certo, vez que o mérito desta ação diz respeito a suposta ilegalidade da publicação da Instrução de Serviço nº 27, que revogou o ato que colocava o Impetrante na função de Delegado Plantonista da 7ª Delegacia Regional de Cachoeiro de Itapemirim/ES”, ressalta a magistrada.
Analisando os documentos atrelados aos autos, em especial a cópia integral do procedimento administrativo apresentado pela Chefia de Polícia Civil, “observa-se que, após denúncia, deu início a Investigação Sumária nº 154/2014, para apurar suposta conduta incompatível do Impetrante para com o cargo que ocupa (perturbação do sossego dos moradores do condomínio onde residia)”, frisa a juíza Sayonara Bittencourt.
Findada a Investigação Sumária, foi apresentado relatório e, via reflexa, instaurado Processo Administrativo Disciplinar (PAD) nº 002/2015 contra David de Souza. Em razão do PAD, em 27 de janeiro deste ano foi publicada a Instrução de Serviço nº 27, determinando o afastamento preventivo do delegado.
“Em que pese ter o Impetrante (delegado David de Souza) sido alvo de denúncia dos moradores do condomínio onde residia por perturbação do sossego, tais como, som alto, palavrões, reunião de amigos, consumo de bebidas alcoólicas, analisando os documentos apresentados pela Autoridade Coatora, em nenhum momento o Impetrante expôs a Instituição da Polícia Civil, utilizando-se do cargo de delegado para intimidar ou impor qualquer tipo de pressão aos demais moradores, para efetivamente caracterizar desvio de conduta funcional”, diz a juíza Sayonara Bittencourt na sentença.
“Nos dias em que supostamente ocorreram os fatos, o Impetrante (Davi de Souza) não estava a trabalho, revestido no cargo público de Delegado de Polícia, pelo contrário, eram momentos em que se encontrava de folga, como cidadão comum. Destaca-se ainda, o depoimento das testemunhas que foram ouvidas durante o trâmite do procedimento administrativo, que relatam não terem presenciado nenhuma conduta desabonadora do Impetrante no condomínio, como também, nenhum ruído ou barulho relacionado a festas, músicas vindo do seu apartamento” prossegue a magistrada.
Diz ainda a sentença que a Portaria que instaurou a investigação sumária (datada de 6 de novembro de 2014), como também a Portaria que determinou a instauração de Procedimento Administrativo Disciplinar em desfavor de David de Souza (datada de 13 de janeiro de 2015), mesmo já tendo ultrapassado o prazo legal previsto no artigo 220, da Lei nº 3.400/81, “ainda não se findaram, sendo que o afastamento do policial até a presente data, além de configurar constrangimento ilegal, violando o direito líquido e certo, caracteriza punição antecipada, violando também o princípio da inocência.”
Por fim, ressalta a magistrada, o afastamento do delegado Davi de Souza de suas funções, “tolhindo o mesmo de exercer suas atividades, com base nas razões expendidas no PAD nº 002/2015, é por demais descabida, além de ilegal, pois as provas até então apresentadas são frágeis para demonstrar que a permanência no exercício das funções atrapalhará sobremaneira o andamento do procedimento administrativo.”
Desta forma, acrescenta Sayonara Bittencourt, “há de se reconhecer a ilegalidade da Instrução de Serviço nº 27, mantendo-se as Instruções de Serviço nsº 66-D e 67-D, possibilitando o Impetrante de exercer suas funções de Delegado Plantonista na 7ª Delegacia Regional de Cachoeiro de Itapemirim/ES.”
E a juíza finaliza: “Isto Posto, diante do acima exposto, bem como ante a existência do direito líquido e certo, revogo na decisão proferida às fls. 67/69 e, via reflexa, CONCEDO A SEGURANÇA para declarar a ilegalidade da Instrução de Serviço nº 27, publicada em 26/01/2015, possibilitando que o Impetrante exerça suas funções de Delegado de Polícia, podendo ser como Plantonista na 7ª Delegacia Regional de Cachoeiro de Itapemirim/ES, conforme determinado nas Instruções de Serviço nsº 66-D e 67-S, ambas publicadas em 22/01/2015 ou, onde melhor entender a Corregedoria Geral da Polícia Civil deste Estado, com fulcro no artigo 269, inciso I do Código de Processo Civil.”