O 7 de agosto marca mais um aniversário da Lei Maria da Penha. É o nono ano que a lei está em vigor. Discussões pelo País afora vão marcar a data. Em Cachoeiro de Itapemirim, no Sul do Espírito Santo, por sua vez, o Centro de Defesa da Mulher Anna Carolina estará completando mais um ano de vida.
Criada em 2012 pelo policial militar Elias Medeiros dos Santos, que é cabo da PMES, o Centro de Defesa da Mulher Anna Carolina é uma organização não-governamental que atua em três frentes: palestras, atendimento e reflexão para os agressores.
A primeira frente faz a divulgação de forma didática de todo o teor da Lei Maria da Penha. São distribuídas cartilhas com os 46 artigos da lei, sancionada em 7 de agosto de 2006 pela Presidência da República como forma de tentar inibir a violência doméstica e até certo ponto aumentar a pena para os agressores.
“Fazemos em média 18 palestras por ano. Observamos que a maioria das pessoas, infelizmente, desconhece a Lei Maria da Penha”, resigna o cabo Elias.
A segunda frente atua com o atendimento às mulheres vítimas de agressão física e psicológica e qualquer tipo de ameaças e constrangimento. “Procuramos ajudar a acelerar os procedimentos jurídicos. Como a demanda em Cachoeiro é muito grande, às vezes a vítima demora mais de dois meses para ser ouvida formalmente pela Delegacia Especializada da Mulher, após dar a queixa inicial”, diz o cabo Elias.
“Aqui na ONG recebemos a queixa e vamos direto ao Juízo. Temos um advogado, o doutor Márcio Leite Pinheiro, que trabalha conosco e, imediatamente, ele pede medida protetiva em favor da mulher vítima de algum tipo de agressão. Em dois dias, no máximo, a Justiça se manifesta”.
A terceira frente adotada pelo ‘Centro de Defesa da Mulher Anna Carolina’ é mais extensa e se chama Reflexão de Homens Envolvidos em Violência (Rhevir), que foi criada como forma de aliviar o trabalho do Judiciário.
A Comarca de Cachoeiro de Itapemirim conta com apenas quatro Varas Criminais. A 1ª cuida de processos relativos a tráfico de drogas e homicídios (Tribunal do Júri); a 2ª, Execuções Penais, fiscaliza o cumprimento das penas de pessoas condenadas pela Justiça; e as 3ª e 4ª Varas cuidam dos chamados ‘processos residuais’. São nessas duas últimas unidades que tramitam os procedimentos relativos à violência doméstica.
Os juízes das 3ª e 4ª Varas Criminais encaminham para o Rhevir os autores de violência doméstica. De acordo com o cabo Elias, os agressores passam 16 semanas participando de ciclos de palestras promovidos pelo Centro de Defesa da Mulher Anna Carolina, em que são motivados a pensar e a reavaliar sobre seus atos agressivos.
A ONG foi instalada em abril de 2012 e, em julho do ano seguinte, o projeto Rhevir começou a funcionar. “Neste período, já atendemos 62 homens. Posso garantir que pelo menos 90% deles se recuperaram”, diz o cabo Elias, que é o coordenador-geral do Centro de Defesa da Mulher Anna Carolina.
Segundo ele, o número de homicídios relacionados à violência doméstica em Cachoeiro é até pequeno em relação à Grande Vitória. No entanto, há outros tipos graves de violência, como a agressão física, psicológica, sexual, patrimonial e social:
“Quando o homem chega em casa e obriga a mulher a manter com ele relação sexual, é uma forma muito grave e séria de violência sexual. Quando o homem quebra um objeto pessoal da mulher, ele está causando um dano patrimonial. Por isso, é fundamental que a sociedade, em geral conheça todos os detalhes da Lei Maria da Penha”, explica Elias.
Anna Carolina Ribeiro Taliuli, 23 anos, que dá nome ao Centro de Defesa da Mulher, foi mais uma vítima de crime passional e da intolerância machista no Espírito Santo. Só porque não queria reatar o namoro com o agente socioeducativo Leonardo Santos de Jesus, 30, ela foi assassinada com cinco tiros de pistola 380. Era a arma que Leonardo adquiriu e conseguiu legalizar o porte junto à Polícia Federal por conta de sua atividade profissional. Deveria usar a pistola somente no trajeto de casa para o trabalho e vice-versa. No dia em que matou a ex-namorada, ele estava fora do trajeto profissional.
Ele trabalhava em uma unidade do Instituto de Atendimento Sócio-Educativo do Espírito Santo (Iases), em Cachoeiro, de onde foi afastado depois do crime. Leonardo matou a jovem, que trabalhava como arquivista também do Iases, no bairro Santo Antônio, em Cachoeiro. Leonardo deve ir a júri popular até setembro deste ano. O homicídio ocorreu em 7 de setembro de 2011.
Leonardo chegou a ficar preso por dois anos e sete meses. Foi solto no dia 15 de abril de 2014, por decisão do juiz Roney Guerra Duque, da 1ª Vara Criminal de Cachoeiro, no momento em que o magistrado pronunciou o acusado – sentença que mandou Leonardo a ser submetido ao Conselho do Júri Popular. O juiz Roney Duque, no entanto, estabeleceu uma série de normas como medida protetiva a testemunhas do crime e familiares de Anna Carolina.
“Fomos à família da Anna Carolina pedir e ela nos autorizou a usar o nome da jovem no Centro de Defesa da Mulher. A partir daí, a ONG foi criada e possui uma Diretoria Executiva, Conselho Fiscal e o Corpo de Voluntários”, disse o cabo Elias. A ONG, segundo ele, sobrevive mais da participação de voluntários do que de dinheiro.
Para reduzir os entraves burocráticos na busca de parcerias, o Centro de Defesa da Mulher Anna Carolina aguarda os títulos de Utilidade Pública Estadual e Municipal e este ano deve conseguir entrar no sistema de convênio federal.
“A experiência de 22 anos como policial militar me ensinou que a violência doméstica é praticada, em 90% dos casos, por cidadãos comuns. A criação dessa ONG é a forma que encontramos para ajudar a reduzir esse tipo de violência. Penso que estamos conseguindo”, disse o cabo Elias, que é casado, tem dois filhos e é membro da Igreja Assembleia de Deus da rua Samuel Levi, no bairro Aquidaban, em Cachoeiro.
Linhas de Ação do Centro de Defesa da Mulher Anna Carolina:
Desenvolve ações educativas e informativas de campanhas públicas de valorização do gênero feminino e palestras em empresas despertando diferentes gerações sobre violência contra mulheres e a Lei Maria da Penha.
Para subsidiar as campanhas e palestras quanto ao projeto, a instituição iniciou dentro de sua área geográfica de atuação pesquisa de casos de violência contra mulheres, para geração de estatísticas e estudos, para análise interna e também divulgação nas mídias do Sul do Estado como forma de situar à população nos níveis em que estão as ações violentas contra mulheres.
Área de Atuação:
O Sul do Estado, mais precisamente no Polo Cachoeiro, conforme o Pacto Estadual pelo Enfrentamento à Violência Contra Mulheres, lançado em Agosto de 2011 pelo Governo do Estado do Espírito Santo. Na página nº 28 do Pacto figuram como cidades participantes do referido polo a própria sede, Cachoeiro de Itapemirim, juntamente com os municípios de Apiacá, Atílio Vivacqua, Bom Jesus do Norte, Castelo, Jerônimo Monteiro, Mimoso do Sul, Muqui, Presidente Kennedy, Rio Novo do Sul e Vargem Alta.